domingo, 21 de julho de 2013

Com creme e não só

Quando eu era miúda, os meus pais arrendavam uma casa de férias em Albufeira, pertinho da FNAT (hoje INATEL) e com uma varanda corrida sobre a praia. Da varanda, preso por uma corda, a minha mãe lançava um cesto com comida que nos  entretinha na praia o dia todo. Nós, miúdos, ocupavamos os dias entre mergulhos e construções nas areias. Os adultos conversavam, jogavam connosco e, por vezes, os homens iam à pesca. Lembro-me do sossego da praia, dos desafios de futebol do meu irmão à beira-mar, do prazer que eu experimentava quando, talvez uma vez por semana, iamos todos comer um gelado à FNAT, ou malaquecos a Albufeira, ali mesmo junto à praia dos Pescadores. O mês de Agosto era o tempo da praia, do descanso, dos pais por perto. Eu passava os fins de tarde a ler, no cantinho da varanda, sem que ninguém desse por mim, mas observando toda a gente. Lembro-me de jantares só de miúdos, entregues à empregada enquanto os adultos saíam para o Restaurante, com muitas tropelias à mistura. No mar, à noite, nasciam mil luzinhas e eu imaginava sereias, baleias curiosas, Melosinas ainda então desconhecidas para mim.
Na praia do Cabrita, assim lhe chamavamos por ser o nome do senhorio, passava diariamente a senhora das bolas de berlim.  Eram bolas macias, com muito creme que eu lambia gulosamente e enchia de nódoas os fatos de banho. Então, não havia ASAE, mas nunca ninguém morreu por causa das deliciosas bolas! A senhora a anunciar as bolas, vestida de branco e com um cesto de verga no braço, era o único grito da praia. Um grito gostoso!
Hoje, na praia que escolho para descansar, os gritos inoportunos são outros.
Há quem venda bolas de berlim - sem creme. Mas há, também, quem venda pulseiras, túnicas, elefantes de madeira, chinelos, gelados, pasteis de nata e até bilhetes para o circo. Além dos vendedores, há ginástica, música alta, gente que salta e se exercita  ao som de uma voz estridente acompanhada de música em altíssimo volume. Há, também, as motos de água alugadas, as bananas, as boias gigantes. Hoje, a praia já não é, pelo menos no Verão, um lugar de sossego e calma. É, sim, um lugar de ruído e nervosismo! As bolas de berlim já não têm creme mas,  acho eu, as agressões que fazem a quem tenta descansar de tempos duros e difíceis, é muito mais letal...

2 comentários:

  1. Completamente de acordo! Também me incomoda a "imposição" de actividades na praia. Como diz muitas vezes "Esta mania da saúde faz um mal terrível". Boas férias!
    Fernando

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  2. Gosto tanto, tanto destes textos de coisas suas, setôra!

    João

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