terça-feira, 24 de junho de 2014

A Tia Maria Luísa

A tia Maria Luísa fazia anos a 23 de Junho, ou seria a 24?, e o seu aniversário era sempre pretexto para fazermos a fogueira e cantarmos ao São João. O meu pai, que adorava festas e casa cheia, pedia ao senhor Joaquim que trouxesse rosmaninho. Vinham carradas, (na velha carroça puxada pelo macho manso onde muitas vezes montei em pelo), que ficavam a secar no quintal, e tudo se preparava com tempo. A senhora dona Zélia era especialista nas bonecas que queimávamos no cimo do mastro, e a casa virava alegria e barulho! Os mais miúdos, e alguns adultos mais afoitos também, saltavam a fogueira, e eu lembro-me muito bem do cheiro das minhas sobrancelhas queimadas, das pontas do cabelo chamuscadas, das recomendações descuidadas da minha mãe para que tivéssemos cuidado. A tia Maria Luísa era sempre a mais animada! Chegava de tarde, cheia de guloseimas únicas, bolinhos de canela da minha infância!, e ria-se de tudo. Foi ela quem me salvou, então aluna da dona Emília nos aterradores lavores femininos, fazendo-me, ali em cinco minutos, a bainha de um lençol de berço que fora o meu tormento ao longo de todo o ano lectivo. A tia Maria Luísa nunca se zangava, achava sempre que tudo se havia de resolver, e ensinava com paciência como fazer bifinhos de lebre! 
Quando a tia Maria Luísa fazia anos, a casa da Serra era de todos e ela soprava as velas pedindo sempre só mais um ano. A tia Maria Luísa chamava Tiquinho ao marido, falava-lhe com doçura e nunca os ouvi discutir. Quando os meus pais saíam, a tia Maria Luísa e o seu Tiquinho mudavam-se para nossa casa para tomarem conta de nós e era uma festa constante.
Tenho muitas saudades destes meus tios. Hoje, agora na noite fria e sozinha, penso no calor que tinham as noites, até as de trovoada, quando os meus tios estavam por perto. Tive outros tios, muitos, mas nenhum se instalou no meu coração como a tia Maria Luísa e o Tiquinho.
Às vezes, dou por mim a lamentar que na infância dos meus netos não haja figuras como a da Tia Maria Luísa.

7 comentários:

  1. Eu tive uma tia Marcelina. Ainda me lembro das histórias que contava...
    Obrigada pela partilha!
    Fernando

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  2. As minhas memórias de infância estão ligadas à minha avó. Uma terna avó que não nos permitindo tudo, muito ainda nos permitia!
    Nem sei quantas agulhas eu e a minha irmã teríamos partido ao cozer os vestidos das bonecas na sua Singer! Nunca me lembra de se ter zangado...

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    1. São essas memórias que, muitas vezes, nos dão força para continuar. Aqui ainda há uma Singer...

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  3. A tua história da Tia Maria Luísa é linda. Contaste-a muito bem, com amor e sentimento. É verdadeira! E depiis, eu conheci a tua Tia Maria Luísa muito bem e era de facto uma senhora amorosa. E depois essa D. Zélia também é minha conhecida... E sei que eras amiga da minha mãe.
    Um beijo por esta bela história! E outro, simples, para ti...

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  4. Tao bom ler e lembrar a minha querida Avó Luisa!! Grande Mulher e senhora....jamais passará a véspera de S.Joao sem lembrar o saltar à fogueira e comer sardinha assada com a minha querida avó Luisa!! e Sim lembro como se fosse hoje o saltar a fogueira na casa do querido Tio Emilio com lotação sempre esgotada!! Festa grande e muita alegria! Saudades Sim!! Beijinhos grandes a toda a família....Hoje, como a sardinha assada (que adoro) noutra companhia, com alegria sempre (que herdei da minha avó Luisa)......mas c pena de não saltar à fogueira!!

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  5. Querida Sofia,
    Que bom ver-te por aqui! São tantas memórias... Beijinhos

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