quarta-feira, 29 de agosto de 2018

A MINHA LÍNGUA PORTUGUESA

Gosto de Camões. Adoro Pessoa, delicio-me com Sophia, emociono-me com Eugénio de Andrade, choro e rio com Torga, perco-me para me encontrar com os autores do meu país. Gosto da língua portuguesa. Gosto das palavras suaves, das agudas também. Gosto da forma de organizar frases, da possibilidade de tecer magia com a simples alteração da ordem dos elementos da frase, da capacidade que as nossas palavras têm de se transformarem em novos e diferentes sentidos. Gosto de dizer que a noite me abraça, que a manhã surge com pezinhos de lã, que me sabem bem os beijos salgados e os abraços húmidos depois de um mergulho!
Gosto MUITO da língua portuguesa! 
Gosto do falar simples, das frases certeiras, da musicalidade e da presença de muita história, de romanos a árabes, de visigodos a celtas, ainda identificáveis.
Por tudo isto, e porque o sangue que me alimenta o cérebro fala português, tenho imensa pena de estar a assistir à destruição, ao assassinato, da nossa língua. Não percebo se o acordo existe ou não, mas percebo que se escreve de duas formas (muitas mais se considerar escrita os erros ortográficos constantes) e compreendo que a língua perdeu a sua dignidade, a sua estrutura formal fundamentada e segura!
Como se não bastasse o caos do desacordo - que cada um usa, ou não usa, ignorando e/ou desprezando a norma -, há a patologia dos estrangeirimos! Que irritação haver inputs, backgrounds, follow-ups, hands-up, coaching, oks, sightseeings, weekends, outsiders, dates,etc... Que RAIVA não conhecermos o nosso vocabulário e usarmos o que não é nosso com a pretensão de sermos cultos! 
Tenho tanta pena da língua portuguesa! 
Tenho tanta pena de mim, que sofro - juro! - com este linguajar. Mas tenho mais pena ainda dos jovens e crianças a quem se está a roubar o privilégio de usar a língua portuguesa, a quem se impede o deleite da leitura e compreensão de Escritores Nacionais!

segunda-feira, 27 de agosto de 2018

ANIVERSÁRIO

Hoje, o meu Pai faria 93 anos. O 27 de Agosto era, sempre, dia de grande festa, de muitos amigos, de imensa alegria. O meu Pai festejava a Vida! Gostava da casa cheia, de bons petiscos e bons vinhos. O meu Pai amava o campo, a caça, o pôr-do-sol, o primeiro cantar do cuco. 
O meu Pai já partiu há muito tempo, já há 13 anos compridos de saudades. E eu não tenho apenas saudades da casa cheia no dia 27, dos passeios no jipe pela terra que é a nossa, das conversas longas que tinhamos os dois. Não tenho saudades apenas da segurança de saber que ele existia, que estava ali para mim, sempre. 
Do que eu tenho mais saudades, saudades imensas , é do tempo em que o Tempo não se enchia de vazios. 
Tenho medo hoje. Tenho medo de cada acordar, sem o colo certo, sem a amizade que eu julgava eterna.
Ah Pai, faz-me tanta falta!

domingo, 26 de agosto de 2018

A MINHA RELIGIÃO

Tenho aprendido com a vida, e de forma nem sempre suave, que uma pessoa habitua-se tudo. Sem dúvida, o ser humano faz-se de hábitos, de rotinas que, muitas vezes contestadas, se tornam a nossa forma de ser. Eu não fujo à regra. 
Estou habituada à missa na minha cidade, normalmente na Sé, e gosto de ouvir o senhor Cónego Emanuel - embora às vezes ache que fala tempo demais...-, gosto da oração numa comunidade que integro e com a qual me identifico. Sou católica,cheia de falhas e de boas intenções perdidas, mas acredito, mesmo!, que Deus existe e nos dá o dom da consciência, do livre arbítrio e da esperança. 
O meu Deus é um Deus do Bem, que prega o Amor, que já saíu há muito da cruz e gosta de flores, do mar, da ternura, das crianças, da alegria e da paz. O meu Deus conversa comigo, perdoa-me e ouve-me. O meu Deus sabe que o mundo de hoje é difícil demais e, por isso, ralha de mansinho. É assim que eu O sinto sempre, é assim que O encontro na minha Sé.
Ora, fugindo aos meus hábitos e por força da vida, este domingo fui à missa noutro lugar. Catedral enorme, outro senhor Cónego. Esbarrei com missa com expressões em latim e fui confrontada com uma leitura que me chocou: "A mulher deve subjugar-se ao homem. O homem é a cabeça da família!" Não queria crer! Claro que eu sei que era uma leitura, mas, ainda assim, é terrível! É até perigoso...
A Igreja Católica tem de ser capaz de olhar o mundo de hoje e não pode, acho eu, dizer barbaridades destas! Sei que a Igreja é feita de pessoas, mas sei que as pessoas responsáveis têm de ser capazes de dar sentido à Palavra de Deus. Uma missa triste, com frases destas, afasta quem precisa de carinho, de conforto, de confiança em Algo maior!
Mais tarde, ouvi o Papa Francisco pedir perdão, zangar-se com os homens da Igreja que cometeram crimes e pensei que o Papa, de certeza, não está de acordo com estas leituras...

sexta-feira, 24 de agosto de 2018

36 ANOS

Faz hoje 36 anos que a minha vida mudou para sempre. De um dia para o outro, deixei de ser só eu e surgiu-me uma vida, minúscula, nos braços. A minha primeira filha, com o seu quilo e cem gramas, veio ensinar-me o sentido da minha existência. Olhava-a entre extasiada e apavorada: - seria eu capaz de tomar conta dela? Mamando, bem segura a mim, ela parecia dizer-me que confiava que eu haveria de dar conta do recado... 
Acho que ainda não tinha chegado o tempo dos traumas de infância e, por isso, a minha filha sobreviveu, com umas quedas aparatosas de bicicleta e um falso crupe assustador, à minha inexperiência.
Já jovem, foi sempre a minha primeira confidente. Conversávamos, ouviamos as nossas vidas ditas - e como as vidas ditas ganham diferentes sentidos -, e o tempo passava.
Hoje, a minha filha está longe. Faz-me falta dolorosa. 
Faltam-me as palavras amigas, o pragmatismo dela, a ternura às vezes rabugenta desta mulher que é a minha filha. Hoje, ela já tem os filhos dela e está lá,  num país diferente, assinalando o aniversário. Sei que os filhos não nos pertencem, mas fazem parte de nós! 
Eu choro sem razão. Choro porque ela me faz falta; choro de alegria por a saber feliz, choro, também, pela mulher que já fui e que queria muito voltar a ser.
Tenho IMENSAS saudades da minha filha maior!

domingo, 19 de agosto de 2018

MUDANÇAS

Nas minhas muitas leituras encontro, muitas vezes, provas de algo que é óbvio: - Desde sempre que as mudanças, as alterações aos hábitos, criam conflitos e dificuldades. 
No entanto, só porque há transformação, mudança, é que o mundo avança e a vida vai evoluindo É natural, então, que surjam resistências quando uma ideia nova é defendida. Temos receio de perder o pé, de sair daquilo a que se chama a nossa zona de conforto. 
Mas, acho eu, se não ousarmos, se não formos capazes de nos questionarmos e nos reinventarmos, a rotina vai acabar por nos destruir. Penso que, como dizia Einstein, " não podemos esperar resultados diferentes se fizermos as coisas sempre da mesma maneira" e nós queremos, nós sociedade desenvolvida e humanizada, queremos (ou dizemos querer) que o mundo mude!

E esta minha reflexão, hoje, dirige-se a mim mesma. Preciso escrever para me ler, preciso escrever para ser. Preciso ler-me a assumir  de, uma vez mais, recomeçar tudo de novo: - Trabalho novo, solidão reinstalada!
Para começar, mais 500kms de viagem de mim comigo com o meu peugeot. Depois, o tempo dirá...

domingo, 12 de agosto de 2018

TERRAÇO

A noite chegou aveludada ao terraço grande. Ele olhava-a, com o páreo enrolado na cintura, deixando as coxas a descoberto, anunciando algum frio mas presa na preguiça do fim de tarde. 
Conheciam-se bem, muito bem, mas sempre o surpreendia o muro de silêncio que, sem aviso, às vezes ela erguia em seu redor. Era só dela. O olhar escuro ficava intenso e partia para longe, para um lugar de onde, talvez inconscientemente, o excluia. Olhava-a. Sentia no corpo o desejo dela, daquela maneira, tão única, de se enrolar nele fazendo-se um só. Fez o gelo dançar no copo trazendo-a de volta ao terraço. 
Ela sorriu. Está a ficar frio, e levantou-se enfim para voltar, descontraída, com a camisola dele sobre o biquini e o páreo. Sentou-se no muro, olhando-o e pegou no copo dele. Bom este branco alenteajno, disse lambendo os lábios e provocando o desejo imenso que ele tinha dela. Vamos sair?  Não. ela contrapunha com a preguiça de se vestir. Tão bom estar em casa, assim, sem pressas nem outros alguéns.
Ele cedeu sorrindo. Era dela mesmo aquele vício de isolamento, aquela quase necessidade de se esconder do mundo deixando que só as emoções dos dois os envolvessem. Levantou-se e ela abraçou-o pela cintura. Com carinho, reparou que os cabelos castanhos estavam a ficar cinzentos, que o tempo passava mesmo naquela mulher exclusiva, estranha, avó já, que amava cada vez mais.
Quero-te. E ela sorriu um está frio, antecipando o amor que ali mesmo, no terraço, os levaria para o terreno que tão bem conheciam.

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

DE NOITE

Não adianta fechar a janela, a angústia não conhece a resistência dos estores, a opacidade do vidro. Por isso ela fica olhando a noite, ouvindo a sonora sucessão de segundos, deixando que os olhos se habituem à escuridão como o coração se adapta à tristeza. 
Podia ser tudo diferente. Claro! Pode sempre ser diferente porque, quando fazemos uma escolha, rejeitamos uma montanha de oportunidades. 
Mas não tinha sido diferente, era igual. Era uma noite de tristeza angustiada, um receio do amanhã que sempre chega. O relógio insistia, somando segundos, numa corrida louca. Ela não queria olhar para trás. De que serve o passado "roubado na algibeira" se não podes transformá-lo? Não queria o futuro sequer. O presente bastava, magoando, feito de silêncio e escuridão. 
Podia partir, claro. É sempre possível partir. Mas cada partida acontece prenhe de um retorno e era do retorno que também fugia. Se tivesse sido de outro modo. Mas tinha baús cheios de ses e nada poderia jamais fazer com eles.
Deu mais uma volta. Colchão com cova, já velho e a pedir reforma. Ficou no meio olhando o tecto, virando costas à janela aberta. Sentia a alma, ou a energia, a querer ir-se, devagarinho. Respirou fundo. Tanta tristeza por dizer...