domingo, 30 de junho de 2019

O POEMA

Pensei fazer um poema. Com calor, ouvindo as rãs, olhando os cães, pensei que a poesia era só isso mas, ainda assim, pensei escrever o poema. Um, não o. Não me tenho na conta de poetisa, não sei encontrar palavras bonitas, mas apetecia-me um poema. Decidi escrevê-lo. Malgré tout. 
E comecei a sonhá-lo, porque tudo sonho antes que o seja.
Meti-te no meu poema, inteiro, sem sequer te despir das maldades humanas. Depois, meti-me lá a mim também, cheia de paradoxos, de antíteses e anástrofes. Cruzei o meu eu com o teu tu em versos de pé quebrado, mistura de verso branco. Os cães, nas suas corridas loucas, íam fazendo a métrica, cadência original. 
No final da primeira estrofe, uma quintilha esquisita, pensei no refrão. Dois versos chegavam, mas desisti. Há tantas repetições chatas na vida que o refrão pareceu-me agressor e abusivo. 
Segui na minha escrita. Saíu a segunda estrofe, despidos os dois, enlaçados nas palavras que ficaram por dizer. Havia, no meu poema, elipses estranhas. Já tinha mais uma quadra, esta certa e de rima emparelhada, obviamente irreal. Terminei o poema com um terceto cruzado. Assim, a provocar o soneto certinho que nunca serei capaz de escrever. 
Como na vida, na minha, a perfeição falhou. 
Ah, mas o poema surgiu!

sexta-feira, 28 de junho de 2019

Assim

Há dias assim. Assim apenas, sem nada que os justifique, com pouco que lhes dê sentido. Há dias que parecem ser, apenas, um quadrado escuro no calendário, sem espaço sequer para aí construir sentidos. Hoje, para mim, é um desses dias. É um dia oco, e estranhamente cheio de afazeres e de urgências que bem podiam ser eternamente adiadas. 
Nestes dias, os meus sentires, tecidos de memórias e cheios de espuma de sonhos, insistem em molhar-me os olhos. Não há um motivo particular. mas também o não há para sorrir e acreditar na vida. Hoje, é um dia assim.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

SALA DE AULA

Para quem é professor, o final do ano é em Junho/Julho e nunca em Dezembro. Nesta altura, acontecem as despedidas dos alunos que partem, o até Setembro áqueles que vão a banhos, as saudades já antecipadas, a ideia (pura ilusão) de descanso e férias. 
Ilusão mesmo! porque começa a loucura dos exames. As vigilâncias, com professores aborrecidos e tornados agentes da polícia, alunos ansiosos e inseguros, as resmas de provas para corrigir, as matrículas. Vêm, ainda, as mil reuniões, algumas para coisa nenhuma, muitas a exigir uma concentração e esforço que o cansaço de um ano não permite.
Este ano, porque não tive turmas, tenho muitas saudades das despedidas. Saudades nenhumas do que, para mim, é o absurdo dos exames!
Tenho saudades dos alunos que partem, daqueles com os quais, ao longo de um ano, e às vezes mais, partilhava momentos, desentendimentos também, ternuras sempre. 
Tenho muitas saudades da sala de aula! Tenho, até, saudades dos cheiros que enchiam a sala nesta época!!

sexta-feira, 21 de junho de 2019

LISBOA

Lá em baixo, Lisboa. Cidade com água, muito clara, que faz a senhora inglesa, que se senta no banco ao lado do meu, exclamar- GREAT! SO BRILLIANT! - Experimento algum orgulho. 
De facto, Lisboa é uma cidade luminosa e, vista do céu, sem gente, fica mais bonita ainda. Eu, que tanto gosto de sair, o meu Pai costumava dizer que eu adorava conjugar o verbo ir..., experimento sempre uma boa sensação, uma vivência de pertença, quando aterro em Lisboa. 
É verdade que Portugal é um país com problemas, com corrupção a mais, com lixo nas ruas, com muita pobreza, impostos incrivelmente altos e serviços públicos deficientes. É verdade que a gasolina é caríssima, que o custo de vida tem subido assustadoramente. É verdade, também, que é um país de profundas assimetrias, onde o interior sofre um abandono gritante. É tudo verdade!
Mas é verdade, também, que este chão é o meu e sabe-me muito bem voltar a pisá-lo!

terça-feira, 18 de junho de 2019

Quartos

Os quartos de hotel são, para mim, lugares estranhos. São passageiros, surpreendem por vezes, acentuam a solidão.  E porque o sono tarda nestes lugares estranhos, penso nos muitos desconhecidos que já dormiram na cama onde estou agora, assustando-me com a intimidade desconhecida. Imagino gente em trabalho, homens apressados, mulheres que, como eu, amam o longe e choram ausências.
E eu gosto de hotéis! Gosto, exactamente, da impessoalidade, da indiferença,do colchão mole e da limpeza. Estranha a minha relação com os hotéis. Estranha eu, talvez.

sexta-feira, 14 de junho de 2019

PARTIR

"Viajar, perder países, ser outro constantemente!" - E com que prazer faço a mala! Como anseio pelo abraço dos netos, pela companhia privilegiada da minha filha, pelos cheiros e cores da Inglaterra que adoro.
Partir! Com que prazer o faço.

terça-feira, 11 de junho de 2019

AINDA O 10 DE JUNHO

Já hoje é 11 de junho, já passou o Dia de Portugal, e eu continuo com os olhos húmidos, a alma surpreendida, após ouvir o discurso de João Miguel Tavares. 
O João Miguel, tão lagóia como eu embora há menos tempo, teve a coragem de dizer o que muitos sentimos neste momento. Com frontalidade, o João Miguel falou da amnésia colectiva em que vivemos, de corrupção gritante e continuada, da incapacidade de fazer funcionar a justiça de oportunidades. De forma clara, denunciou o vício das "famílias influentes", das cunhas, das eternas preferências por conhecimentos pessoais e/ou partidários. 
Lembrou a sua história, cada um de nós tem uma para contar..., e mostrou que, embora o 25 de Abril tenha, sem dúvida, trazido muitas melhorias sociais, não estão assumidas todas as necessárias. O João Miguel questionou o futuro, sem dramatismos mas com verdade. Ouvi, com a alma encolhida e os olhos cheios de água. Como fazer diferente? É tão urgente...
Olho a minha cidade, constato o peso - imenso e insuportável - da interioridade. Também as minhas filhas partiram, e os meus irmãos também. Fiquei eu. Feita de um telurismo que me encanta e limita. Fiquei eu. Num lugar onde os espertos se safam sempre, onde a inteligência tem medo, onde o silêncio cresce no medo continuado...

domingo, 9 de junho de 2019

14 ANOS

Mais um ano. 14. E as saudades crescem, doem. Sabia que o meu Pai me ía fazer falta, muita!, mas nunca imaginei que fosse TANTA... os anos somam-se e a dor é cada vez mais viva. Garantiam-me que viria a aceitação, a dor calma, a saudade limpa. Mentira! A dor continua viva, dilacerante e a tirar-me o sono. O meu Pai foi o único amigo real que tive. 
O meu Pai aceitava-me como sou, ensinava-me a tentar ser melhor, sorria para mim sempre. O meu Pai ensinou-me a amar o Alentejo, a distinguir a corrida do coelho da da lebre, a identificar o vôo da perdiz. O meu Pai ensinou-me os vinhos bons, o prazer das conversas compridas à mesa, os segredos da Fé!
O meu Pai desapareceu num nove de Junho maldito, há 14 anos. Eu tenho muitas saudades do meu Pai!!

sexta-feira, 7 de junho de 2019

Tom Jobim

Tom Jobim canta só para mim. Eu sei que eu vou-te amar. Eu sei também. Eu sei que ainda que respondas com raiva, com ódio, com adeus e acusações, eu sei que eu vou-te amar. Vou amar-te sempre, mesmo quando o adeus acontece, a impossibilidade se faz real e a vida se impõe. Tom Jobim canta só para mim na noite que não traz o sono. Eu sei que eu vou-te amar. Para sempre eu vou-te amar. 

terça-feira, 4 de junho de 2019

Transformar

O mar intenso lá fora. Aqui, Laborinho Lúcio provoca reflexões, desafia sentires e pensares. "Quem não sabe, ensina; quem sabe ajuda a compreender". Como concordo! 
Como gostaria de ser capaz, de verdade, de ajudar a transformar práticas na Escola. 
Esta é a Educação na qual acredito!