Bem cedo, ignorando o nevoeiro húmido das manhãs da Serra, os miúdos chegavam aos grupinhos. Batiam à porta e entre risos envergonhados, estendiam os sacos de pano pedindo "Dê-me os Santinhos"...
Qualquer coisa os encantava, de chocolates a nozes mesmo pão que fosse. Depois, felizes por terem atingido o objectivo, partiam a rir, a correr, para logo pararem no muro mais próximo partilhando os tesouros. Eu nunca pedi Santinhos. Talvez por isso, a vida ofereceu-me diabinhos em abundância...
Hoje, com netos já, ninguém me pediu os Santinhos. Hoje, ouvi dizer "gostosuras ou diabruras", num vício de imitação acrítica que me incomoda e agride. Há abóboras por todo o lado, eu fiz doce delas, e os miúdos pintam a cara com teias de aranha, vestem-se de cadáver e dizem ser fantasmas ou vampiros. Talvez, no fundo, estas alterações culturais não sejam, apenas, o resultado da importação do alheio. Talvez, afinal os santinhos, com o que de bondade e partilha implicavam, já não tenham lugar neste mundo que é, ou parece ser, cada vez mais povoado por teias negras e animais repelentes...
Eu também nunca pedi os "santinhos", os meus filhos também não! No meu tempo para os miúdos pobres era uma maneira de ter goluseimas que de outra maneira não tinham... Hoje é a globalização/imitação que nos traz as "gostosuras ou diabruras"!
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