quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

CARTA de AMOR

A editora Chiado desafiou-me para colaborar numa publicação de Cartas de Amor. Mandou as regras, não mais de 500 palavras, e eu fiquei a pensar. 
Primeiro, pensei no Amor. O que é isso? Existe mesmo sem ser pelos filhos e netos? Existe com compreensão e aceitação? Existe em ousadias sem regras nem modelos? Duvido. 
Depois, pensei nas cartas. Existem ainda? Não é tudo por e-mail, sms, instagram, facebook ou twitter? São ainda ridículas, ou nunca foram, de facto, ridículas? 
Finalmente, pensei nas 500 palavras. Porque tudo tem, hoje, de caber em normas, de ser contado e enquadrado, de ser modelado e controlado? 
Apaguei o convite.
Mas escrevi a carta de amor. Ridícula, pirosa talvez, mas chorada e sentida mesmo.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Forte do Cão

 Forte do Cão. "O fortim do Cão foi erguido entre 1699 e 1702, com a função de defesa daquele trecho da costa, na foz do rio Âncora, coadjuvando a defesa proporcionada pela Praça-forte de Caminha."  É assim que a wikipedia explica a existência deste lugar. Para mim, e para os meus netos, o forte do cão é um lugar de bem-estar e boa brincadeira. 
Tendo sido construído na fase das guerras da Restauração da Independência, para nós é o lugar de proteção dos nossos segredos e histórias mágicas. Ali, com eles, lembro também a Praia, de Sophia. Lembro muitas narrativas, muitas linhas salgadas de sonhos e essências, desejos e desilusões.
No Forte do Cão não vi cães. Mas, ainda assim, imaginei rosnadelas agressivas a quem se aproximasse, pelo mar, deste cantinho que queria ser de novo Portugal.
A história faz-se assim, de transformações e mudanças, de passado purificado, de futuro nunca cumprido. Como a vida, afinal. 
Pelo meio, há momentos de luz e energia positiva. Como os que  passo, com as minhas crianças, junto ao Forte do Cão!

A gente muda...

Nas últimas semanas, por motivos profissionais, tenho ido a Elvas muitas vezes. Elvas e eu temos uma relação estranha... Cresci a ouvir dizer que Elvas não era lugar relevante e, paradoxalmente, ia lá muitas vezes porque os meus Pais tinham lá amigos de quem guardo muio boas memórias. Era lá que estava o Dr. Mário Monteiro, a Dona Gracinda, amigos que ficarão, sempre, ligados a momentos felizes da minha infância. Depois fui crescendo e Elvas tinha boas festas, era um lugar onde ia para me divertir. Em Portalegre, talvez por hábito, continuava a criticar Elvas... Tive um enorme acidente de automóvel, aos treze anos, conduzida por um jovem elvense e fiquei, para sempre, a gostar muito dele, do meu amigo do desastre, como digo ainda.
Por ironia do destino, esse que insiste em trocar-me as voltas, três sobrinhos que eu adoro viveram em Elvas e lá fui eu, muitas e muitas vezes, a caminho da cidade do Aqueduto.
Agora, com mais calo nos sentires, olho Elvas e gosto da cidade. Gosto da Escola de janelas grandes viradas para o Aqueduto, gosto do português cantado e da alegria que, creio, é contágio dos espanhóis.
A gente muda mesmo! Muda tanto que estou a olhar o calendário para encontrar um dia para ir passear a Elvas. Só passear!


segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Segunda-Feira

Segunda-feira. As exigências a dizerem presente, o horizonte a mostrar que sim, que há limites, que é tempo de empacotar os sonhos e responder à realidade. Mas tempo, também, de questionar alguns sentidos, ou falta deles, na existência da humanidade. 
Que sentido faz desistirmos de tanto, cedermos à norma, às imposições de outros, espezinhando a nossa vontade, a nossa existência sempre individual? Às vezes, muitas vezes, penso nisto. Como professora, tento sempre ajudar os meus alunos a compreender que há normas, regras, exigências que, vindas de fora,  limitando as nossas opções, nos ajudam a determinar-nos por dentro. Mas tenho dúvidas. No momento em que  mundo vive transformações profundas da sua essência, no Tempo em que a relatividade do momento questiona tudo, deveríamos ser capazes de encontrar, de construir, uma nova organização quotidiana, uma existência pautada pelo respeito pelo outro, sem minimizar cada EU. Difícil? Com certeza. Possível? Quero crer que sim!

domingo, 27 de janeiro de 2019

LUGAR CERTO

Estar próximo do mar, no Inverno, faz-me sentir mais ainda a insignificância humana. É um cenário que atrai e repele, encanta e assusta. O mar do Norte, mais agreste, mais forte, nesta época do ano é absolutamente fantástico! Ali, nas rochas, de casaco bem fechado, com os netos por companhia e um café bem quente acabado de tomar, o azul do céu parece aplainar os picos e as lombas difíceis de muitos acordares. 
Foi ali, olhando o infinito com mãos lambuzadas de ovos Kinder no meu casaco, que ouvi a notícia da vinda do Papa a Portugal em 2022. Penso que estava no lugar certo, para uma novidade importante. Importante porque o Papa faz bem onde chega mas, mais importante ainda, porque me conforta saber que milhares de jovens se juntam por um ideal de paz, por uma vontade de ser melhores. A fé que eu professo, e que hesitante pratico, precisa de gente com sonhos, de juventude capaz de se unir por algo de BOM!
Sei, claro, que não vai ser a vinda de Francisco a Portugal que vai resolver os problemas do país, menos ainda do mundo, mas sei, tenho a certeza, que vai ser mais um Tempo de pensar coisas de ser BOM.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Coisas Boas

Às vezes, parece que está tudo errado, que tudo corre mal, que a vida se faz de complicações. É verdade. 
Mas é verdade, também, que tendemos s valorizar o mais o que é negativo e a esquecer, quero crer que involuntariamente, oq eu nos faz bem, o que tem cor e sentido, o que é positivo.
Há muitos momentos fantásticos na vida. Fantástico é o mimo dos netos, o sorriso das crianças, a cumplicidade entre amigos, a leitura de um bom livro. Quando a insónia abusa e insiste em incomodar, basta orientar os pensamentos para as coisas boas da existência. Eu tenho algumas e, ultimamente, tenho aprendido a valorizá-las. É bom estar acordada, tarde na noite, à braseira, pensando coisas de ser feliz, antecipando a viagem de daqui a bocadinho, reconstituindo momentos com amigos em conversa franca e descontraída, lembrando os sobrinhos-netos que riem e me dizem, num abraço forte, eu gosto tanto muito da tia!

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

VIAJAR

Não há melhor terapia do que viajar. Circular pelo mundo, atravessar lugares diferentes, olhar a realidade outra, iludir a vida com novos cenários é a minha terapia preferida. Sempre que posso, e infelizmente não posso tanto como gostaria..., saio por aí. 
Quando tarda o momento de partir, iludo a realidade com o planear de saídas, com a marcação de férias. É uma forma de viajar por dentro, nas asas do sonho. Na noite procuro lugares, o mar, as cidades europeias, os lugares que nunca pisei. Um dia, breve, parto.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

VOZES DE BURRO

Nos últimos dias, desde sempre talvez, muito se tem falado sobre Educação. De Educação, estranha e curiosamente, toda a gente sabe e, sobre o tema, toda a gente opina. 
Manuela Moura Guedes foi à televisão, em horário nobre, dizer mentiras, fazer acusações falsas e muito graves, divulgar a sua total ignorância sobre o ensino profissional e, o que para mim é mais grave, logo uma multidão de portugueses concordaram com a senhora e repetiram, à exaustão, as enormidades que tinham ouvido. No meio destas pessoas, e isto revolta-me mesmo!, alguns professores encheram as redes sociais e os cafés, temo que as salas de professores também, de concordância idiota. Que se vivem tempos de facilitismo, que a autonomia e flexibilidade não pode funcionar, que metodologias participativas são utopias, que os meninos só têm maus resultados porque não estudam, etc. Dizem-no, repetem-no, como se não fossem eles quem trabalha com os mesmos meninos!!
Eu tinha decidido não me pronunciar, ignorar tanta ignorância, mas a coisa não pára.
A autonomia e flexibilidade  curricular é a oportunidade de transformação que a Escola Portuguesa há muito necessita. O que está em causa é, de forma resumida, olhar cada aluno como único e singular e encontrar formas de que cada um, ao seu ritmo e com as suas características, aprenda e desenvolva competências. É a oportunidade da Escola ser, de facto, um lugar de formação de Pessoas na sua complexidade (leia-se o Perfil do Aluno). Dizer que se pretende, apenas, que todos passem sempre sem aprender, é ofender os professores que o são de facto! 
A Educação é uma ciência, complexa, mas valiosa. Dizia o Padre António Vieira que "A Educação vale ouro, porque em qualquer lugar tem valor", e estava completamente certo.
Se queremos um mundo diferente, melhor, mais humano, temos MESMO de ter consciência de que a Escola, e sobretudo a sala de aula, tem de mudar! 
Se há Manuelas Moura Guedes por aí, que falem sozinhas. E, sobretudo, que os professores se indignem e defendam a sua prática (aqueles que são mesmo professores)... O meu post já vai longo, e eu ainda teria tanto para dizer.
Enfim, espero, sinceramente, que vozes destas não impeçam a transformação da Escola Portuguesa. Afinal, vozes de burra não chegam ao céu!


segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Ricardo Araújo Pereira

Sou admiradora confessa de Ricardo Araújo Pereira. Aliás, eu admiro quem tem sentido de humor, quem é capaz de identificar o segundo que provoca o riso, quem é capaz de se rir da vida e de si mesmo. Nunca gostei daquelas pessoas que aparentam imensa seriedade, que trazem a razão e a verdade no bolso, que se julgam guardiãs de uma razão que só às próprias serve. 
O Ricardo Araújo Pereira, de fato, gravata e bom aspecto, coloca à gargalhada comum as aberrações de um mundo que é de todos (ou quase). Na escrita, usa com mestria a ironia e, sem pretender impor teorias, permite-nos, a todos, olhar o nosso eu no espelho do ridículo.
Ontem, o Ricardo deu início a uma nova rubrica "Gente que não sabe estar" e eu deliciei-me com o humor fino, acutilante, oportuno. 
Saber que, neste Portugal cinzento e a entristecer, há gente que pensa e faz humor de qualidade, que há equipas que olham o quotidiano com olhar cirúrgico e crítico, dá-me esperança no amanhã. 

domingo, 20 de janeiro de 2019

SER DE CÁ

Andar na minha cidade é, para mim, uma forma de lazer. Sei, como podia não saber?, que a cidade está triste, abandonada, vazia, esquecida, mas, ainda assim, é a minha cidade, é o meu chão. Não sei de quem é a responsabilidade pelo estado a que chegaram as coisas. Talvez venha de muito longe, de um tempo que já se diluiu na história, talvez os mais recentes dirigentes não tenham sabido, e continuem sem saber, valorizar o espaço fantástico que é Portalegre. 
Portalegre é uma cidade especial. Faz-se de ferro forjado, de ladeiras sobe-e-desce, de muralhas, de palácios e brasões, sempre emoldurada pela Serra, pelo verde-esperança. 
Hoje, fui à missa, como sempre, à Sé, e, mais uma vez, emocionei-me com o meu chão. Estava muito frio, como eu gosto, sentia as bochechas geladas e o passo acelerado não chegava para aquecer o corpo inteiro. Mas soube-me tão bem! Senti-me de tal forma no meu espaço, no meu pequeno mundo, que cantei e dancei na rua vazia.
Ah! É tão bom viver em Portalegre! É tão bom ter este lugar para onde voltar sempre, ainda que de alma estilhaçada e inteligência amargurada...

CANSAÇO

Chega. Às vezes, apetece mesmo ter força, e coragem, para bater com a porta e ficar do lado de lá, do lado da paz e da distância do politicamente correcto, da compreensão do mau humor alheio. Cansa lutar sempre, tentar, investir esforço e, no fim, esbarrar com a desilusão. Cansa sentir que o afecto esbarra no outro e volta amarfanhado e feito coisa nenhuma.
Chega. Devia haver comprimidos de força para desistir. Assim como há comprimidos para sorrir, para dormir, para acordar com boa disposição, para emagrecer, para engordar, para evitar a queda de cabelo, para os calos, para fazer crescer as unhas, etc, devia haver comprimidos para desistir. Fariam efeito imediato e duplo, fazendo desistir e não sofrer com a mesma desistência. Porque cansa lutar e sempre ser criticada, insultada e ignorada.
Às vezes, a vida é fantástica. Às vezes, também cansa!

sábado, 19 de janeiro de 2019

FEITIOS

Já sabemos que, na Natureza, tudo se transforma. Dizem que nada se perde, mas disso eu duvido porque tenho perdido muito tempo...
Nós, humanos, (uns mais do que outros), transformamos-nos todos os segundos, morrendo um pouco, renovando células, reinventando essências e aparências. No entanto, vá lá perceber-se porquê, há quem goste de insistir na impossibilidade de mudança, sinal de pouca inteligência, digo eu, muitas vezes em silêncio, quando me garantem sempre fui assim, não vou mudar. 
Não percebo, ou seja, não quero ter de perceber, o argumento dos feitios. É o meu feitio, dizem-me, e apetece-me gritar que o facto de sermos inteligentes permite, ou deve permitir, a adaptação a novas circunstâncias, a transformação do que, nos nossos eus, é pouco correcto.
Os tempos de hoje, esta modernidade alucinante, caracterizam-se, entre outros factos, pela veloz transformação de tudo e de todos, e quem se agarrar ao feitio empedernido corre o risco de se tornar num muro de cimento. 
Os muros de cimento não se movem senão com violência. O muros de cimento não deixam passar luz!

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

MORTE

Há algo de belo na morte. A atracção do abismo, o desconhecimento do escuro, a paz tranquila adivinhada. Há algo de belo no fim. O poder da última palavra, a certeza de não ter de encontrar continuação. Há algo de bom no adeus que se não tem de dizer. Outros o dirão, talvez.
Há algo de belo na certeza absoluta de que, um dia, não existirão insónias, nem receios, nem solidão, nem medos, nem acordares antecipados e escuros. Há algo de misterioso nos rituais que são de outros sempre, no esquecimento que virá, no amarelecer das fotografias nas molduras de casa, no desaparecimento das tonalidades da voz conhecida.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

FALSOS PROBLEMAS OU HIPOCRISIA?

Tenho andado um pouco alheada, por excesso de trabalho, da actualidade, dos media. Mesmo do Programa da Cristina só tive notícias tardias...Por isso, por distracção involuntária, só hoje li, com atenção, a polémica em torno das supressões de excertos do Poema Ode Triunfal nos manuais de português de 12º ano. Acusam-se as editoras, o ME, de censura. Ora bem, como professora, como leitora, e como idosa que vou sendo, acho isto uma perfeita idiotice. Desde que me conheço, como aluna e como professora, que encontro nos manuais excertos de obras. A leitura integral pode sempre ser feita de forma autónoma, ou pode ser objecto de uma escuta, ou pode ser um desafio à realização de outros trabalhos. Ninguém espera hoje (quero eu acreditar!) que um professor se limite a seguir o que vem no manual! 
Descobrir a imensidão de Álvaro de Campos é um desafio individual e não creio que seja crime que os professores, de acordo com o grupo com o qual trabalham, respondendo às características de cada aluno, possam fazer as leituras e os trabalhos que entenderem melhor contribuir para  este real conhecimento de um génio.
Se eu mandasse, na Escola da minha utopia, seriam mesmo os alunos a escolher os poetas, e as leituras, dentro da vastíssima oferta de cada período literário para, assim, se formarem leitores críticos e activos. 
Há muita coisa errada na Educação deste país mas a questão de supressões em alguns poemas, ou textos em prosa, não me parece que seja uma delas. Aliás, com tantos recursos à disposição, um professor pode sempre chegar facilmente ao original.
Mais grave do que o que os manuais oferecem, é a forma, às vezes triste e paupérrima, como os professores desenvolvem (ou não) aprendizagens. Sim, ainda há professores que, contra tudo o que se espera,  seguem o manual, linha a linha, página a página, fazendo todas as propostas de trabalho, corrigindo e continuando sempre numa rotina confrangedora. Isto sim, é caso para alarmismo social!

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

AVENTURAS

Nunca fui mulher de campo. Ou melhor, eu adoro o campo, as paisagens, as montanhas, as cores, a constante alteração de cenários. Gosto de animais, embora alguns me aterrorizem... No entanto, nunca fui lavradora e, confesso, tratar da horta ou cuidar de galinhas nunca me atraiu. 
Só que a vida tem mistérios incompreensíveis e, aos 58 anos, vejo-me com quatro cães de personalidade vincada. O Zorba, que normalmente vive comigo, é  quase um ditador. Exige que eu acenda a lareira quando quer, obriga-me a sentar-me no chão para lhe dar mimo se chego mais tarde a casa, destrói móveis e sofás e não gosta que eu veja televisão. A juntar-se ao patrão Zorba, que os meus netos adoram, vieram dois Serra d'Aires, o Figo e o Boss, cachorros lindos mas muito-muito disparatados. E os meus netos logo se apaixonaram!
Ontem, quando eu estava cheia de trabalho, recebi um telefonema avisando-me que os meus cães andavam nos terrenos dos vizinhos. Larguei tudo, porque eles são prioridade, peguei no Zorba e fomos procurar o Figo e o Boss. A cadela mais velha, uma mastim de 17 anos, muito loira e cansada, olhava-me com espanto. 
Eu e o Zorba corremos mais de uma hora. Sempre que tentava deitar mão ao Figo ele saltava e... fugia de novo! as minhas botas estavam cheias de lama, eu suava, o Zorba ladrava e os dois cachorros gozavam connosco. Ao fim de uma hora, consegui deitar mão ao Boss e fechá-lo no canil. Faltava o Figo. 
A noite começou a instalar-se, e o Figo a troçar da minha aflição. Tentei o engodo do biscoito, mas a esperteza dele é bem maior do que a gula. Já no escuro, exausta, lá consegui deitar mão e metê-lo no canil. O Zorba entrou também... Insisti para que o Zorba saísse, voltasse para casa comigo, mas não tive sorte. Ficaram os três no canil, perfeitamente indiferentes à minha irritação. Ao chegar ao carro, reparei na Ginja. Ela, mais velha e cansada, parecia ter mesmo pena de mim...
Hoje, bem cedo, lá estavam os três, felizes, a brincar. Zangada, deixei-os fechados! Com tantas chatices na vida, estas aventuras, apesar de tudo, depois de terminadas..., sabem-me bem!

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

ARTE?

Quando Picasso pintou Guernica, tinha um propósito. Ou muitos. Mas um, era claro: - Servir-se da Arte para agitar consciências, para alertar a humanidade para o horror da guerra. Hoje, toda a gente, ou quase, reconhece em Guernica um grito de dor contra a guerra. Destroços. Restos de gente, animais símbolos desfeitos, mães sem filhos. Olhamos com dor e perguntamos como foi possível.
No entanto, ao nosso lado, nesse mediterrânio sujo e próximo, continuam a morrer milhares de pessoas. Cruzam-se os desesperados, afogados adiados, com os cruzeiros de luxo dos grandes paquetes de cruzeiros milionários, e nada fazemos. Pior, fingimos nada podermos fazer, criticamos os que tentam escapar a outras guerras, à fome, ao medo, à violência, à falta de liberdade. Estranho o mundo de hoje. O mundo dos contrastes e das palavras sem sentido. Porque de nada serve falar, dizer que a guerra é terrível, quando nada ou pouco fazemos por aqueles que procuram a paz.
Não é só o muro assassino a construir na fronteira do México que envergonha o mundo moderno. Não é só a ditadura da Venezuela. É aqui ao lado, na velha Europa de raiz nos pensadores gregos, que se morre numa luta que se está a tornar rotina.
Tenho medo. Tenho vergonha. Medo do crescer do ódio, vergonha da minha aceitação tácita  do sofrimento alheio. Devia ser diferente! Guernica não pode mesmo ser apenas um quadro valioso num Museu lindo!

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

BICA E MARGUERITA

Ela chegou primeiro. Incorrigível vício da pontualidade, sempre antes da hora, escolheu a mesa junto à janela e fez o pedido. Ele chegou quando a Marguerita já ia a meio, maracujá, o meu fruto preferido, lembras-te? Sim, lembrava sempre o maracujá no Brasil, o maracujá experimentado pela primeira vez nessa cidade da Baía tão distante, nesse lugar onde se venera Pessoa e a língua portuguesa. Ele pediu um café. Inócuo, indiferente. Olharam em direções opostas, culpa dos lugares escolhidos, e ela reparou que há muito tempo já os horizontes eram distintos. Ele abriu o jornal, ela o Facebook, e o silêncio escorreu. Não íamos conversar, tentou ela. Sim, diz, já viste o que fez o Montenegro? Não é preciso dizer não para impedir conversas difíceis. Ela acabou a Marguerita, ele deixou o café esfriar. Não me querias dizer qualquer coisa? Ela olhou ao longe a linha bem definida do horizonte. Há tanto mundo para viver... 
Às vezes, há palavras que não merecem ser ditas. E a Margarita sabia bem.
Então vamos? Sim, até qualquer dia. Gostei de te ver. Também.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

IMPROVISO

Tenho pensado de mim para comigo, naquelas conversas longas das minhas noites de insónia, que o improviso devia ser reconhecido como prática de mérito. De facto, nunca sei o que vem aí, nunca, por mais que estude e leia, por mais que oiça e tente aprender, me sinto absoluta e completamente preparada para enfrentar cada hoje. Não sei as regras para viver feliz, não conheço os segredos do sucesso e vivo improvisando. Como dizia Chaplin, a vida não permite ensaios e, assim sendo, a capacidade de improviso devia ser valorizada.
Como, na minha cabeça, tudo (ou quase) se cruza com a Escola, penso que é determinante que se desenvolva nos alunos a capacidade para o improviso, a competência de agir (e reagir) perante o inesperado, em vez de se lhes servir menus prontos  a usar. 
Improvisar não é o mesmo que desenrascar, prática tão portuguesa. O desenrascanço tem, para mim, algo de clandestino, de batota implícita, e o improviso tem uma carga positiva de  resposta ao desafio.
Afinal, acho eu, a vida é pouco mais do que uma sucessão de improvisos.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

GRILOS

Sem dúvida, embora ainda existam cegos voluntários, o mundo está a sofrer alterações profundas a todos os níveis. São as tecnologias, a alimentação, a organização social, as famílias, a saúde, os hábitos  sociais, as relações amorosas, a educação, os automóveis, TUDO! TUDO está a transformar-se a uma velocidade vertiginosa por vezes. 
Há uns anos, por exemplo, uma pessoa fazia um curso que era uma garantia de emprego, era algo que se colava à pele como fazendo parte da própria identidade. Era-se professor, ou engenheiro, ou o que fosse, para sempre... Hoje, as formações de base são, apenas (e é MUITO!) uma forma de tentar abrir portas no mundo do emprego, e a requalificação, a mudança de actividade profissional, acontecem sem espanto. Viaja-se pelo mundo do trabalho como pelas estradas do mundo, sem fronteiras e vencendo obstáculos.
Dantes, num dantes de vinte anos, os grilos eram insectos que cantavam nas gaiolas, apanhavam-se com uma palhinha nos buracos do campos e comiam alface. Hoje, comem-se grilos garantindo que são saborosos (sabem a avelã) e nutritivos...
Com tanta mudança e transformação, cada pessoa tem duas possibilidades: - Ou continua parado no tempo, observando e negando o óbvio; ou dá corda à coragem e transforma a sua maneira de viver, pensar e sentir! Este Tempo é o meu, o nosso, o daqueles que já passaram o meio século mas continuam vivos. E eu não quero ficar presa no passado! Gosto de desafios e, apesar de assumidamente ter muitos receios, acho aliciante esta convocatória que a vida faz para a transformação de cada EU com cada NÓS!

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

FRIO

O dia acordou gelado e brilhante. Eu, que assumidamente tenho o Inverno como estação de eleição, faço render o percurso a pé até ao trabalho, olhando o brilho da cidade, o céu intensamente azul, alguns farrapos de nuvens enganando dos riscos dos muitos aviões distantes. Penso a vida, olhando o chão. Tanta aberração, num cenário perfeito... 
E lembro o telefonema do Professor Marcelo para a Cristina Ferreira, o absurdo de uma jovem mulher que se torna o centro das preocupações e atenções de um país eternamente atrasado. Oiço na minha caminhada os gritos estridentes da bela senhora, recordo os comentários a crimes, explorando a dor e o sofrimento humano, a euforia de ouvir o Presidente da República a acompanhar os crimes, como se tudo fosse assim, igualmente inócuo e vazio. E penso a Escola, a dificuldade de efectivar as transformações necessárias, os obstáculos à urgente transformação de práticas.
As preocupações maiores, as essenciais, parecem perfeitamente acessórias num pais de absurdos. Será mais importante o programa da bela senhora do que a transformação nas escolas? 
Tenho medo. Medo do amanhã que já começou hoje... Medo de um mundo, de um país, que valoriza o insignificante, que "destrói as árvores para não fazerem sombra aos arbustos!"

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

ADD

Avaliação de Desempenho Docente. Como professora, e com consciência de que tem de haver avaliação de desempenho para valorizar a carreira e os professores, sou clara e absolutamente contra o sistema vigente. Nem percebo, sinceramente, por que razão os sindicatos ainda não discutiram o assunto e exigiram respeito e dignidade. Sim, respeito e dignidade não tem a ver, apenas, com a contagem do tempo de serviço ou com os vencimentos. 
A avaliação de desempenho, nos moldes em que se faz em Portugal, para mim, é um verdadeiro ultraje. 
Colocam-se professores contra professores, fomenta-se o mau clima de escola e praticam-se enormidades, e arbitrariedades, por causa, apenas, da progressão na carreira. O absurdo é-o ainda mais quando se avalia por comparação profissionais com desempenhos necessariamente distintos, para que se ache o que há-de caber nas quotas. O que de facto acontece, é que alguns professores, ou porque são mais velhos, ou porque são coordenadores de departamento, são obrigados a opinar e a classificar o trabalho dos colegas. Mesmo que nunca tenham observado uma aula dada pelas vítimas, mesmo que eles próprios não sejam docentes de mérito reconhecido, mesmo que não se sintam preparados para o fazer. Avaliam-se simpatias, amizades, opina-se com base em aparências e assim se determina se este ou aquele professor é Bom, ou Satisfaz.
O que está a acontecer é, para mim, uma humilhação. Passei por este mesmo processo há uns anos, pedi aulas observadas e senti-me de facto humilhada. Agora, a prática continua e agrava-se porque, com o descongelamento da carreira, muitos professores precisam da avaliação para progredir.
É tão injusta esta avaliação!
Reafirmo a minha convicção da necessidade de avaliação real do desempenho docente. Há muito bons professores que merecem ser distinguidos, há maus professores que devem ser afastados, mas deveria ser um processo de valorização, realizado com rigor e seriedade e não assim!
Muitas escolas, suspeito, estão agora a avaliar docentes. Imagino os constrangimentos, as discussões, o mal-estar reinante... Podia ser tudo tão diferente!

domingo, 6 de janeiro de 2019

PRIVILÉGIO

Sou uma privilegiada e adoro sê-lo! Fico mesmo feliz quando me sinto especial para a vida, quando experimento a ilusão de que os astros se alinharam para me oferecer coisas boas. No último mês, recebi três livros de novos autores, de gente amiga que escreve. São três obras diferentes, todas da autoria de professores, e todas tecidas de magia própria. Sendo absolutamente diferentes, todas e cada uma me têm oferecido horas de paz, evasão e sonho. Alguma inquietude, também. Primeiro, chegou-me às mãos o título "Os joelhos do meu Pai e outros Contos", do meu colega António Pascoal. Fiz-me à viagem de leitora com apreensiva curiosidade. E se fosse um livro pomposo, cheio de emaranhados e léxico indizível? E se viesse cheio de coisas de esquerdosos, das que eu abomino? E se, de repente, a leitura me desgostasse? - Tudo receios infundados. Contos fantásticos, originais, surpreendentes e de uma linguagem real, correcta e fazedora de comunicação. Devorei os contos e foi com pena que cheguei ao fim. De todos os contos, sem dúvida Três Tabletes de Chocolate Branco é o meu preferido. E eu não gosto de chocolate branco! 
Depois, há muito anunciado, chegou A Mulher do Sargento Espanhol, do Rui Aragonês Marques, meu colega de liceu. Antecipava uma história de ilhas, de crocodilos e miséria. Mais uma vez, estava completamente enganada. Encontrei a aparente simplicidade tão complexa das histórias de amor, chorei, angustiei-me e ri, "A Madre Superiora parecia um cacho de uvas quase em passas" , e eu vi mesmo a Madre bem amarfanhada... O Rui deu-me um pouquinho dos tais esquerdosos, mas em doses suaves e facilmente digeríveis. Deu-me, ainda, boa companhia para as minhas frequentes insónias.
Ontem, foi a Maria João Falcão que me ofereceu a ternura de Os Figos de Setembro e outras histórias. Aqui, a narrativa é de memória, com todo o poder que a memória tem de purificar e reconstruir o tempo. Aqui está Portalegre, a gente que eu conheço, os espaços que me determinam. Correndo o risco de ser agredida pelo politicamente correcto, não resisto a afirmar que a escrita feminina é muito mais almofadada do que a masculina. E eu não sou capaz de dizer de qual dos três livros gostei mais! 
Por isso eu sou uma privilegiada! porque posso ter três narrativas sem ter de excluir nenhuma, porque tenho amigos que escrevem, porque sei ler, porque posso sentar-me no muro, sob o sol de Inverno, ouvindo as brincadeiras dos cães e  saboreando o poder da escrita!

sábado, 5 de janeiro de 2019

O MAR

Tenho saudades absurdas do mar. Saudades do cheiro, da força das ondas, do movimento, do frio que, nesta época, salga o olhar junto à praia. E penso que falta pouco, que dentro de horas estarei em Cascais a olhar o infinito ondulado.
Sempre que vou a Cascais, ao Guincho também, carrego a minha essência de adubo de sonho. Lembro os navegadores ousados, recordo Camões e compreendo a tentação da partida, o desejo de ir para além de. 
Há pouca coisa melhor do que almoçar a ver o mar...

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

ARANHAS

Já está escuro, mas dizem que chovem estrelas. Na minha alma cinzenta as estrelas não caem, e está escuro. O silêncio envolve-me, puxo a manta que cheira aos netos distantes e olho o computador. Queres sair daí? Apetecia-me a presença, a conversa simples e fácil, o mimo do colo que desejo. Tenho mimo a mais, dizias tu. Mas o mimo, tu não sabes, nunca é de mais. Tenho falta de carinho, de colo, de beijos fortes e abraços totais. Será que chovem estrelas de facto? Subo as persianas mas só há escuro. E os desejos de mimo não brilham. Aliás, acho que o vazio nunca brilha... Dizem que o homem é, no Universo, o mesmo que uma aranha no canto de uma sala. Sabes que, agora, não me importava que alguém varresse os cantos da sala?

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

O SEGUNDO PERÍODO

Já recomeçaram as aulas. Os alunos voltam a carregar mochilas, as ruas enchem-se de movimento e os engarrafamentos fazem notícia. É a vida a impor a rotina.
Eu olho com o espanto da idade a velocidade do tempo. Tudo tão diferente e, ainda assim, tudo tão igual...
Gosto de ver os miúdos cheios de mochilas, gosto das conversas cortadas que cruzo a caminho da escola, gosto da alegria ruidosa a entrar no pátio. Gostava, também, de acreditar que de facto a alegria entra na sala de aula.
Este 2019, espero eu, vem concretizar e dar mais consistência à Autonomia e à Flexibilidade e deve fazê-lo numa perspectiva de promover aprendizagens realmente significativas. 
O segundo período deve ser um passo mais da construção de uma sociedade inclusiva, para todos, na especificidade de cada um. O segundo período devia fazer avançar a aprendizagem real, devia de facto promover, agora que na teoria foi trabalhado e esclarecido, o trabalho colaborativo. O segundo período devia promover uma real transformação do paradigma da avaliação.
O segundo período devia, por se iniciar com um Novo Ano, ser mesmo NOVO!! Acho eu. Ou, melhor, desejo eu.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

JÁ ESTÁ!

Já está. Passou mais um Natal, começou um novo ano, e a vida segue, indiferente a festas e comemorações, fazendo-se cumprir em rotinas, desgostos e sonhos. Ah, os sonhos... São espuma, são fogo fátuo mas, paradoxalmente, são o que nos permite seguir sorrindo e acreditando que um dia. Esse dia é o esperado e há-de acontecer, dizemos para nós, antes do ponto final na existência de cada um.
Eu tenho sonhos. Como todos os ditos, impossíveis de cumprir, mas que me aquecem a alma. Agora, quando todos partiram e o silêncio ocupa as esquinas da casa, quando a saudade se agiganta no meu sofá, eu sonho com presenças. Sonho com a essência cúmplice, constante e verdadeira, capaz do abraço que me aquece, do beijo que me apazigua com a vida. Agora, todos partiram. E o sonho é o que me traz a ilusão de, ainda assim, valer a pena respirar.
Não doeu muito a Passagem de Ano, fez chorar pouco o Natal, mas a vida fere fundo. Há muito sempre...