Senhor Primeiro Ministro de Portugal, Dr. Pedro Passos Coelho
Começo por lhe desejar um óptimo ano de 2012. Desejo, sinceramente, um ano para si tão bom como para mim e como para todos os portugueses. Que todos possamos ter um ano pelo menos igual ao seu.
Imagino que receba muitas cartas, emails, sms, telefonemas até e, por isso, optei por este formato de carta semi-aberta. Temo que o senhor não tenha tempo para a blogosfera mas, confesso, tenho alguma esperança que um dos seus muitos assessores a encontre e a leia. Ao mesmo tempo, sinto que se ninguém a ler pelo menos eu desabafei. E como é necessário, senhor primeiro ministro, desabafar quando tudo parece sufocar-nos...
Sou professora numa Escola Secundária há 30 anos. Pelas minhas mãos passaram já muitas centenas de jovens e nunca, como agora, me impressionou tanto o vazio dos olhares que encaro.
Os meus jovens, o futuro do nosso país, têm medo. Carregam nas mochilas desilusões que pesam, um futuro que temem, uma desesperança que confrange. Falo-lhes de poesia, de Camões e de Pessoa, e respondem-me com desemprego anunciado, com fome em casa, com pais desesperados. Conto-lhes as aventuras de Blimunda e Baltasar,e respondem-me com o sorriso desencantado de quem aprendeu, já, o valor de um pouco de pão em jejum. Quando saio da escola, diariamente, tento encontrar respostas. Uma luz para seguir. Hoje, lembro a epifania recente e lamento não ver a estrela condutora.
Sei que a culpa da depressão que vivo, que vivemos em Portugal, não é exclusivamente sua. Sei que herdou pelo menos três décadas de incompetência e erros mas, no entanto, sei que tem obrigação de fazer diferente. De fazer melhor.
Sou uma das portuguesas, entre milhares, que acreditou no seu governo. Confiei na sua palavra, entusiasmei-me com a sua juventude, partilhei o seu sonho (?) de um país mais justo, mais humano, mais real. Hoje, já não confio em si. O senhor traíu a minha esperança porque, estupidamente, submeteu as pessoas aos números, sufocou a sociedade para cumprir défices. No programa do seu governo não há lugar para a cultura, para a saúde, para os idosos, para a educação, para a família, para os portugueses que sonham. Para o seu governo, tudo se resume ao controlo do défice esquecendo, quero crer que por ignorância e não por maldade, que a economia deve servir os cidadãos e não o contrário!
Escrevo-lhe ouvindo, na televisão, criticar as nomeações que fez para a EDP. Não me surpreende. O senhor tem seguido exactamente as passadas daqueles que condenou!
Esta carta já vai longa, e eu ainda queria dizer-lhe tanta coisa! Queria, por exemplo, de forma veemente, dizer-lhe que não posso compreender as razões que o levam a não anular o acordo ortográfico. O senhor está a vender tudo, está a matar as pessoas, está a roubar-nos o poder de sonhar! POR FAVOR poupe a nossa língua. A nossa língua é o nosso património mais rico e nem o senhor tem o direito de o destruir.
Senhor primeiro ministro, sei que acha que os professores devem emigrar. Creia, sinceramente, que tentarei fazê-lo com a maior brevidade possível. Só tenho pena que o senhor mande embora quem pensa, quem trabalha, quem tem valor, quem tem boa classificação, para ficar a governar um país de incapazes.
Doutor Pedro Passos Coelho, termino esta carta com uma profunda mágoa. Experimento revolta também. Ouso pedir-lhe, com a autoridade que me assiste por ter votado no seu parceiro de governação, que páre e pense. Converse com a sua mulher, as mulheres são boas conselheiras, e olhe as pessoas que moram no povo que maltrata. Ouse a diferença, governe para as pessoas e não para as muitas troikas que por aí andam.
Até um dia. Ou até nunca, se, seguindo o seu conselho, conseguir esquecer o meu Portugal.