segunda-feira, 29 de junho de 2020

OS RANKINGS

Talvez astenia, depressão, desilusão, cansaço, sejam as causas, juntas ou singulares, para  esta minha vontade de nada fazer, nada dizer, entristecer-me apenas. Vi os rankings, mais um ano..., e a minha desilusão cresceu mais. Por que razão continua o governo a permitir a realização destes rankings que nada reflectem? Por que razão a comunicação social insiste nestas listas de graduação de escolas que nada trazem de bom, nem ao ensino, nem à sociedade?
Uma Escola deve ser um espaço onde a democracia funciona de facto, onde as aprendizagens acontecem de acordo com as possibilidades de cada um, num constante crescer como Pessoa. Uma Escola que, como alguns pais, só se preocupa com os resultados dos exames, que procura ter os alunos que - como oiço dizer - "dão garantias de sucesso", não é uma Escola real. 
Hoje, neste louco século de pandemias, virtualidade, digital, solidão e injustiça, a Escola, sobretudo a Pública, tem de ser capaz de funcionar como elevador social. Tem de olhar para as diferenças e fazer delas processos de sucesso. Os rankings vêm, apenas, acentuar as diferenças sociais, encher de orgulho alguns explicadores e  iludir os alunos. Se eu mandasse, não haveria rankings. 
Se eu mandasse, as Escolas teriam abertas as portas principais para deixar entrar a magia, o sonho, e o êxito de todos.

terça-feira, 23 de junho de 2020

RETROSPECTIVA

Quando me vou abaixo, quando me parece que existo sob os escombros da vida, costumam dizer-me que há quem esteja pior. Acredito. 
Sei que, infelizmente, há muitas pessoas que vivem miseravelmente, que sofrem violências várias e inimagináveis. Mas a vida tem, como uma das principais características, o facto de ser vivida individualmente. No singular. A tristeza alheia, por mais solidária que eu seja com quem a vive, não serve de panaceia à minha própria mágoa, dor. 
Aos 60 anos, olho mais para trás do que para a frente, porque, de certeza, tenho mais passado do que futuro. Vejo uma longa sucessão de falhanços, de perdas violentas, algumas por minha exclusiva responsabilidade outras que vieram esbarrar comigo, e penso que já não consigo mais. Que atingi o meu limite. Que não tenho mais energia para acordar a cada amanhecer e cumprir a minha existência. Sobretudo, sei, não tenho mais onde ir buscar coragem, e  resistência, para enfrentar mais perdas, mais doenças, mais dificuldades.
Hoje, penso e sinto que chegar ao fim, ter a coragem de colocar na existência o último ponto final, é a única forma de ter paz.

sexta-feira, 19 de junho de 2020

MIGUEL

O Miguel tinha 66 anos e, como muitos outros, foi vítima da doença horrível que ninguém controla. Morreu em período de pandemia, depois de um intenso sofrimento e de uma impressionante aceitação do mesmo. O Miguel dizia que tudo tem um momento certo mas que, infelizmente, nem sempre esse tempo é o que nós desejamos.
Ontem, numa tarde morna, na Basílica da Estrela muitos amigos juntaram-se para lembrar o Miguel. A mãe, minha prima com 92 anos, médica, que já viu morrer dois filhos, tinha no colo a caixa das cinzas que foram benzidas. Fui a Lisboa por isso. Lembrei o Miguel, e sobretudo o irmão Fernando (poeta genial) de quem era mais próxima. Fiz a viagem pensando, chorando, e perguntando mil coisas para as quais não há resposta.
O Miguel e o Fernando Tavares Rodrigues não mereciam o que lhes aconteceu. Eu acho que, às vezes, também não mereço algumas cosas que me acontecem. Esta noite, tenho pensado muito, no escuro e de olhos abertos, que uma das maiores aprendizagens que tenho de fazer é da aceitação consciente e, consequentemente, a da celebração de cada momento de vida!
Miguel, penso em ti! Que tu e o Fernando continuem a celebrar a Poesia, lá onde estão agora. 

quinta-feira, 18 de junho de 2020

quarta-feira, 17 de junho de 2020

ESPANTO

Às vezes, sobretudo em trabalho, comento que a sociedade perdeu o direito ao espanto. Quero eu dizer que, hoje, tudo parece ser repetição, adaptação, uma sucessão de déjà vu que faz com que tudo se aceite, tudo pareça natural, tudo elimine o direito à surpresa, à indignação, ao espanto. 
Eu acho que o direito ao espanto é fundamental. É porque nos espantamos que nos apetece agir, intervir, sentir até. Se nos acomodamos a tudo, se tudo parece já conhecido, qual a motivação para viver, para seguir acordando a cada amanhecer?

Hoje, eu espantei-me, surpreendi-me, emocionei-me. Porque olhei a Serra, a mistura de cores, as nuvens brancas, as folhas verdes, as lagartixas amareladas e achei que a harmonia perfeita existe. 
Fez-me bem ter-me espantado. Com o olhar húmido e a alma quase líquida, agradeci o momento. O instantâneo, talvez.


segunda-feira, 15 de junho de 2020

REINVENÇÃO

Valter Hugo Mãe, in As mais belas coisas do mundo  refere: «Eu sei que ele queria chamar a atenção para a importância de aprender. Explicava que aprender é mudar de conduta, fazer melhor. Quem sabe melhor e continua a cometer o mesmo erro, não aprendeu nada, apenas acedeu à informação.» 

É isto, em poucas palavras. 
Não podemos acomodar-nos, é impossível parar o mundo, existir não é viver e, para vivermos, temos de nos reinventar a cada passo, de tentarmos, mesmo sem conseguirmos, fazer cada hoje melhor que cada ontem. Penso isto para mim. E tento cumprir. 
Olho o meu mundo, as flores que a cada manhã gritam energia, o céu onde as nuvens se movimentam tomando, elas também, novas formas. Tento adaptar-me. Calar a raiva, desilusão e fúria, que me causa o quotidiano. Calar a minha vontade de insultar, usando as palavras mais feias que o dicionário me oferece, aqueles que destroem estátuas, grafitam monumentos, tornam pública a violenta estupidez de que padecem.
Não gosto do mundo que integro. Mas, não conhecendo outro, resta-me tornar cada amanhecer mais significativo e pacífico. Tenho de ser capaz de me reinventar. É a alternativa a desistir.

sexta-feira, 12 de junho de 2020

SOU IMIGRANTE DIGITAL

Lembro Marc Prensky para assumir que eu não sou uma nativa digital.
Nasci em 1960, sem computador nem telemóvel, com a televisão a encerrar à meia-noite. Como não tinha apps, li muito. De Enid Blyton a Dostoievsky, sem deixar de lado os nossos, de Júlio Dinis a Aquilino, sorrindo com Eça, espantando-me com Camilo, pensando com Vergílio, chorando com Sophia.
Não mandava sms, nem tinha wastapp, quando comecei a trabalhar como professora. O quadro da minha primeira escola era negro, e o giz fazia-me alergia.
Não era melhor, nem pior, do que hoje. Era diferente.
No entanto, os meus alunos, em 1982, tinham sonhos, desilusões, características muito singulares e preguiça às vezes. Como hoje.
Hoje, eu sou uma imigrante digital. Aceito. Mas, mesmo aceitando e concordando, não me sinto menos professora por isso. A aprendizagem, esse processo fantástico, tem de, para além do digital, considerar a presença de Pessoas. Tem de ser individual, sendo colectivo, tem de permitir que se aprenda a pensar, mesmo que a teclar. Afinal, como desenvolver o meu documento de eleição, o PASEO (Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória) sem olhares presentes?
Eu sou professora. Sou imigrante digital e quero muito que deixemos as Fadas voltar à escola, entrando pela porta principal

quinta-feira, 11 de junho de 2020

O DISCURSO

Ouvi, de olhar humedecido, o discurso do Cardeal Tolentino de Mendonça, ontem, naquele espaço fantástico que é o Mosteiro dos Jerónimos. Foi ontem. Era dia de Portugal, eu estava desiludida, triste mesmo, e as palavras sábias, sentidas e cheias de Humanismo, fizeram-me bem. 
Hoje, consegui o texto e li-o, de fio a pavio, com muita atenção. Não é só uma peça literária. É um abanar de consciências, sem demagogias, sem ódio, e com muita Verdade. O cardeal Tolentino lembra a história, para exigir que o presente se cumpra com sentido; cita Camões, par falar de humanidade, de tempestades que todos sofremos, das intempéries que sempre enfrentamos. Ao longo do texto, mostra o que é o Cristianismo, sem acusar, sempre compreendendo e sentindo.
Para o ano, eu vou voltar a ter alunos. Para o ano, eu vou voltar a poder fazer pensar (e como é difícil pensar e aprender a pensar) e vou, de certeza, trabalhar este texto com os meus alunos. Porque eu acredito, mas convictamente,  que só através da Educação e da Escola, só aprendendo a pensar, será possível construir, um dia, um mundo melhor. Mais humano, sobretudo!

INDIGNAÇÃO

Tenho acompanhado a violência crescente nos Estados Unidos. Impressiona-me. Faz-me muita confusão pensar, e ver, que em pleno século XXI muitas pessoas parecem nada ter aprendido. Negros e brancos. Pessoas. Uma raça única, no absurdo de considerar que na humanidade há raças. Olho, indigno-me, e não resisto a temer que a razão da absurda violência não seja a cor da pela mas a miséria, a exclusão, a vida medíocre que muitas pessoas vivem. Nos Estados Unidos como em qualquer país, salvaguardando as óbvias dimensões, a injustiça continua a vingar, o medo a liderar. Às vezes, penso que, neste momento particular da história, há loucos a mais no poder, em simultâneo. Não há um Hitler e um Mussolini, mas vários. 
Ou talvez, não sei, a responsabilidade seja de todos os que os elegeram, dos que se deixam levar por populismos e mentiras. E o círculo volta a fechar-se. É um círculo vicioso, este em que vivemos. Haverá salvação para a humanidade? Quero acreditar que sim. Através da Educação! De sistemas educativos com Valores e para todos e para cada um. E, agora, a utópica sou eu. 
Ah, hoje desfio  sonhos desfeitos. 

quarta-feira, 10 de junho de 2020

DIA DE PORTUGAL


Nô mais, Musa, nô mais, que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Düa austera, apagada e vil tristeza.
in, Os Lusíadas, Canto X

No Dia de Portugal, no dia em que, em 1580, Camões morreu e , no mesmo ano, Portugal perdeu a independência, não tenho coragem para mais do que para lembrar a actualidade, a Razão, da desilusão do poeta! Seremos sempre surdos aos Valores da Humanidade?

segunda-feira, 8 de junho de 2020

PREOCUPAÇÃO

Seguem as semanas e esgotam-se os tempos. Olho o mundo, as máscaras, novo adereço de moda, e já não me indigno. Terei, talvez, perdido o direito à indignação. Acho só curiosa, ridícula talvez, a preocupação de procurar máscaras "giras", a combinar com a roupa do dia. Incrível como, num instante, muitas pessoas tornaram um incómodo numa mostra de vaidade. 
Este é o mundo de hoje. O Tempo da imagem, da aparência, da preocupação com o olhar alheio, da preocupação de ficar bem na passerelle da vida. Com tanta preocupação com o exterior e com os outros, esquece-se cada eu, ignora-se e despreza-se o essencial. Há máscaras pelo chão, mas o importante é ter máscaras com florzinhas; há crianças  maltratadas e torturadas (não consigo esquecer a Síria) mas o importante é postar fotografias de meninos e meninas com máscaras de bonequinhos; há crianças sozinhas frente a um ecrã longas horas por dia, mas o importante é financiar a compra de mais computadores, etc. 
Tenho medo deste mundo. 
Não penso no passado, nem sequer sou "retrópica", mas penso no presente e no futuro. Penso, com a alma encolhida, nos meus netos, nos meus sobrinhos pequenos, e tremo com o quotidiano deles. Obviamente, eles são nativos digitais, fazem parte natural desta realidade cada vez mais virtual, mas são também, felizmente, PESSOAS. Onde fica a essência da humanidade, nesta loucura virtual, quando o outro é algo à distância??
Tenho medo. E tristeza funda

sábado, 6 de junho de 2020

CANSAÇO

Cansaço extremo. Trabalho constante, pouco ou nenhum tempo para existir como pessoa. Talvez, afinal, a vida seja só isto, esta sucessão de fazeres, tecida com urgências e desilusões, aqui e ali ornamentada com marcas de esperança.
Hoje, sábado, obriguei-me a parar. Fugindo ao confinamento, procurei Marvão, a Serra, os lugares que, para mim, estão cheios de presenças ausentes, de histórias nunca contadas. Resistir, aguentar, continuar, são palavras chave para mim, nestes tempos cada vez mais duros.