quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

JÁ PASSOU

O Natal já passou e doeu um bocadinho. Dói sempre! São as saudades mais vivas, as memórias de outros cheiros, de inexistentes presenças, de histórias com pessoas já só personagens. É verdade, por isso, que dói. Mas é bom ser Natal! É bom poder recordar, ver a contagiante alegria das crianças, comer exageradamente a abrir os melhores vinhos. É tempo de ter os netos perto, de brincar na rua, de encher o sofá de pelos de cão e de coelhinhos.
Mas Natal é, também, para mim, tempo de culpas. Porque sei que faço pouco pela humanidade, porque as injustiças me ferem profundamente. O Natal devia ajudar-nos a ser mais Pessoas e menos gente. Mas, infelizmente, nem no Natal há milagres.
Sei, claro, que Natal também é hipocrisia... Mas prefiro a bondade hipócrita que reconheço, à maldade constante e sempre disfarçada. Se há alguma coisa que não gosto no Natal, e há, são as mensagens iguais para toda a gente, despersonalizadas, feitas em computador com renas aos saltos e pais natais ridiculamente balofos. Não gosto de receber dez vezes a mesma mensagem e não acho graça quando, no início, leio "especialmente para ti" pela centésima vez. Sim, eu não gosto de mensagens prontas a consumir, porque eu penso que a vida, a de verdade, exige individualidade. Enfim, eu sei que tenho a mania de pensar.




quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

ÁGUEDA SENA

Morreu a bailarina e coreógrafa Águeda Sena. Mais uma perda no meu mundo de afectos. Conheci bem a Águeda, trouxe-a a Portalegre, de boina, fumando toda a viagem, amparada por uma bengala que lhe dava um estilo único. 
Nas duas viagens que fizemos falou-me de muitos amores, da vida, da perda da primeira paixão num acidente numa avioneta perto de Cascais. Contou-me da dificuldade de caber nas normas de outros, do enorme desgosto por não poder viver um amor intenso e eternamente adiado. Dizia, fazendo-me rir, que vivíamos na época do sem fio. Que falávamos sem nos ligarmos, nem os telefones já tinham nada que os prendessem a lado algum...
A Águeda Sena foi, para mim, a personificação da Arte. 
Gostava de conversar com ela. Das transgressões, do desprezo assumido pelas hipócritas normas sociais, da força e vontade de não deixar nada por fazer, nada por viver.
A Águeda tinha 92 anos e morreu. Em mim, ficará viva nas boas memórias. 

CONVERSAS COM DOCE DE ABÓBORA

Pomos a mesa com cuidado, escolhemos o bule antigo, fazemos scones e ficamos a conversar. Vamos bebericando o chá, a tisana-corriges-, e trazemos os ausentes, a velha Praceta, as escadas do Liceu, a fila J do Crisfal, as boleimas partilhadas, os cafés no Alentejano. Nunca mais tomei café no Alentejano, confesso. Ris-te, porque os tempos são irrepetíveis, os momentos são sempre inaugurais. Iniciáticos? Talvez. E falamos de desilusões, de erros que nunca o seriam se a vida tivesse livro de instruções. Erros são experiências, vivências também. E há erros que, antes o serem, foram momentos perfeitos, digo. 
Chove lá fora, há carreirinhos de água nos vidros das janelas e a manteiga derrete nos scones quentes. O meu doce de abóbora sabe bem, dou-te a receita. Aqueço as mãos no bule antigo, vício herdado da minha mãe, e deixamos o silêncio temperar o momento.
É bom conversar com amigas de sempre. É bom desfiar memórias temperadas com doce de abóbora.

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

SOPHIA

Li, recentemente, a biografia de Sophia escrita por Isabel Nery. Se eu já era uma admiradora da poeta, e era e sou, mais cativada fiquei depois da leitura desta obra. 
Em primeiro lugar, deliciei-me com a escrita coloquial da Isabel Nery, com  a forma como confidencia ao leitor impressões e realidades. É um olhar atento, curioso, culto e respeitador o que Isabel Nery lança sobre a vida de Sophia. Segue-lhe os passos, tenta olhar o que a encantou, narra segredos e medos, assusta-nos e desafia-nos. 
Sophia de Mello Breyner AndresenDepois, há uma poeta viva dentro do texto. Sentimos a Sophia de olhos claros a descobrir Lagos, o mar - tanto mar! -, a fascinar-se na Grécia, a visitar o marido preso pela PIDE, a inventar histórias para entreter os filhos pequenos. É uma mulher  inteira, plena e intensa, que nos exige (a mim exige) uma verdade maior a cada facto, cada amanhecer. Depois de Sophia, o quotidiano fica dolorosamente insignificante.
Com o livro arrumado na desarrumação da minha estante, dá-me paz pensar que posso  revisitar as páginas de Isabel sobre a poeta
 que sempre me encanta!

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

LAST CHRISTMAS - NOT AGAIN

Last Christmas, I gave you my heart

But the very next day you gave it away
This year, to save me from tears
I'll give it to someone special



https://www.youtube.com/watch?v=E8gmARGvPlI


Nesta época do ano, oiço, nas diferentes Rádios, o Last Christmas. Gosto da melodia, como gosto de quase todas as músicas de Natal, e presto atenção à letra. Podia ter sido escrita para muitas mulheres, para mim também. 
Apesar dos anos passarem, da experiência aumentar, ainda caímos (caio) no erro de dar o nosso coração, de nos apaixonarmos de facto, porque quem nos faz desfiar lágrimas. 
Este ano, vou tentar cumprir a proposta da música. Porque, a cada dia, há nova oportunidade de ser feliz. Ou não?

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

CONTRA-SENSO

A época de Natal é das minhas preferidas. Gosto de tudo! Da casa engalanada, das azevias e filhós, dos bolos rei e rainha, do peru e do bacalhau, da excitação das crianças e do lume a arder forte. Gosto de fazer compras na minha cidade, reclamando porque há pouca oferta, iludindo o frio com café na Pastelaria pequenina que tem óptimos chocolates.  Gosto de oferecer presentes, de sentir o nariz vermelho de frio, de sorrir boas festas na calçada.
No entanto, este ano, ainda não fiz o Presépio, ainda não montei a árvore de Natal! É um contra-senso, penso. 
Devia já ter a casa a lembrar-me a época festiva mas, sei lá porquê, tenho adiado a coisa. Não é porque as saudades apertam, nem é porque faltam muitas pessoas à mesa. Sei que é natural que isso aconteça, um dia eu serei também um lugar vazio. Também não é por falta de tempo, as noites são longas, mas tenho sentido pouca vontade de ir ao musgo, de calçar botas de borracha e ir procurar o pinheiro. É mesmo um contra-senso, porque eu adoro andar à chuva e caminhar na Serra.
Talvez a minha vida seja um contra-senso no essencial. 
Hoje, vou fazer o Presépio!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

FOTOGRAFIAS

Resolvi arrumar a caixa enorme de fotografias antigas. Tantas. De avós, primos, amigos, rostos que não reconheço, heranças de avós e pais. No meio, nós. Pequenos, adolescentes, adultos mesmo.
O tempo amareleceu a fotografia. Quanto tempo? Não sei, não quero saber. Porque o Tempo fica sem Tempo quando deixa de marcar tempos. Ali estávamos juntos, sorriamos, e olhávamos na mesma direcção. Ainda não nos tínhamos perdido nas encruzilhadas dos caminhos, ainda não precisávamos de recorrer ao GPS. 
Ali conheci o teu toque, o teu cheiro, a força do teu abraço. Era ali o momento prenhe de mil momentos que fomos abortando descuidados.



segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

REVOLTA


Em Portugal foi identificado um crescente número de mortes ao volante causadas por indivíduos com drogas no sangue. A acrescentar ao elevadíssimo número de condutores com taxas de alcoolémia absurdas, o consumo de drogas está a tornar-se uma arma mortífera. Como de costume, um triste costume, o governo vai pensar numa forma de combater este flagelo… Vai pensar… Como  vai pensar na forma de combater eficazmente a violência contra a mulher, como vai pensar como evitar o péssimo serviço da maioria dos Hospitais públicos do país, como vai pensar como combater a crescente corrupção, como vai pensar como actualizar os vencimentos de forma a acompanharem o real aumento do custo de vida, como vai pensar como acelerar, com qualidade e rigor, os processos de adopção, como vai pensar nas muitas coisas que tem para fazer e que, eternamente, continuam adiadas.
Temos um governo de pensadores em redondo! Pensam, discutem, largam umas propostas cheias de vazio e coisa nenhuma e nós, portugueses, continuamos esperando por melhores dias. Tenho sentido que somos governados por gente que, pensando muito, age pouco ou nada… E lamento que assim seja. Porque a vida é demasiadamente rápida para que possamos viver de eternos adiamentos.
Portugal tem problemas estruturantes profundos e graves. Problemas que se prendem com a vida das pessoas e, na minha modestíssima opinião, as pessoas devem ser a primeira prioridade de qualquer governo. Temos os portugueses a serem vítimas de maus serviços de saúde, famílias a sufocar sob o peso dos impostos e os combustíveis mais caros do que a maioria dos países europeus. Temos a corrupção a aumentar e o Governo a falar da visita da jovem Greta, do nível da água do mar que há-de, um dia, inundar o aeroporto por construir, da gaguez de uma deputada, das parvoíces do CHEGA. Às vezes, tenho vontade de ter coragem para emigrar e mandar este país que tanto amo às urtigas.
Continuo a pensar que, com outros governantes, o país podia melhorar. Continuo a acreditar que a Assembleia da República não é um lugar de mérito, não é um espaço do qual nos orgulhemos. Os cargos políticos parecem ter-se tornado numa forma de ganhar um lugar ao sol, de encher os bolsos e não de servir o país. Não percebo, a sério, o alarido que se faz em torno do CHEGA, dizendo, entre outras coisas, que vive apenas de frases sonantes e demagogia porque, sinceramente, isso também faz o Governo!
Aliás, eu acredito que o CHEGA, tal como o Bloco de Esquerda, o LIVRE e o PAN, nem teriam assento na Assembleia se o governo, os sucessivos governos, funcionassem.  Os partidos de extremos, seja à direita ou à esquerda, e para mim tanto uns como outros valem zero de consideração ou respeito, surgem para dar voz ao desespero indignado. Apenas. Desaparecerão, ou desapareceriam, se os Partidos que se fundamentam na real construção da Democracia, aqueles que se sustentam em filosofias  sérias, cumprissem a sua função. Afinal, se o PCP, o PS, o PSD e o CDS ganhassem sentido e cumprissem o seu desígnio, não teríamos de aturar os extremismos.
Acho eu. Que não gosto da esquerda mas detesto extremos!!

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

NÃO ME APETECE

Não sei se é o Natal, se o frio honesto, se a idade, se a passagem do tempo. Sei que, cada vez mais, experimento um enorme desejo de paz e uma pouca vontade de alimentar ódios. Cada vez mais acho que é um desperdício de energia alimentar zangas e desentendimentos. Apetece-me  a paz tranquila da compreensão, da relação calma, dos conhecimentos feitos de respeito e direito à diferença.

Na semana passada, numa das curvas da vida, esbarrei, uma vez mais, com a maldadezinha que se faz de insinuações, de mesquinhez, de sacanice reles. E não me apetece sofrer por isso. 
De maldade, agressão, juízos de valor e insultos já tive a minha conta...

domingo, 1 de dezembro de 2019

PESSOAS

São sempre as pessoas quem me marca. Esta semana, ou melhor, na semana que ontem terminou, tive muitas realidades com pessoas e, pior para mim, com pessoas diferentes! Tive o privilégio, sou mesmo sortuda, se conhecer, ao vivo e a cores - muitas cores! - a Professora Ivete Azevedo. É uma mulher fantástica! Bem disposta, conhecedora, atenta, envolvida de facto na construção da tal Escola que eu tanto ambiciono. Veio falar de criatividade, veio ajudar-nos a aprender a melhor forma de facilitar o desenvolvimento de competências criativas no quotidiano. Podia tê-lo feito de cátedra, afinal é doutorada e pós-doutorada, mas fê-lo com a simplicidade dos que, porque são Bons, não precisam de se colocar em bicos de pés. Trabalhou, desafiou-nos, corrigiu-nos, ouviu-nos e deixou-nos (a mim e a outros colegas) com vontade de saber mais, de treinar mais tempo. A Professora Ivete naturalmente perguntou-me para que queria José Régio tanta tralha, e riu-se das minhas histórias contadas junto ao túmulo de D. Jorge de Mello. Quando se foi embora, fiquei mais sozinha, mais vazia também.
Na mesma semana, e pouco antes da Ivete chegar, vivi momentos de terror com outra pessoa. Calúnias, insinuações, provocações, formas de agir que sempre revelam personalidades insignificantes, mentes vazias e corações azedos. 
Hoje, domingo, fazendo o balanço da minha semana, voltei a agradecer a Deus a presença  destas duas pessoas na minha vida: - Uma, porque me ajuda a ser melhor; outra porque me permite saber como não ser e, simultaneamente, expiar os meus pecados!