quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

JÁ PASSOU

O Natal já passou e doeu um bocadinho. Dói sempre! São as saudades mais vivas, as memórias de outros cheiros, de inexistentes presenças, de histórias com pessoas já só personagens. É verdade, por isso, que dói. Mas é bom ser Natal! É bom poder recordar, ver a contagiante alegria das crianças, comer exageradamente a abrir os melhores vinhos. É tempo de ter os netos perto, de brincar na rua, de encher o sofá de pelos de cão e de coelhinhos.
Mas Natal é, também, para mim, tempo de culpas. Porque sei que faço pouco pela humanidade, porque as injustiças me ferem profundamente. O Natal devia ajudar-nos a ser mais Pessoas e menos gente. Mas, infelizmente, nem no Natal há milagres.
Sei, claro, que Natal também é hipocrisia... Mas prefiro a bondade hipócrita que reconheço, à maldade constante e sempre disfarçada. Se há alguma coisa que não gosto no Natal, e há, são as mensagens iguais para toda a gente, despersonalizadas, feitas em computador com renas aos saltos e pais natais ridiculamente balofos. Não gosto de receber dez vezes a mesma mensagem e não acho graça quando, no início, leio "especialmente para ti" pela centésima vez. Sim, eu não gosto de mensagens prontas a consumir, porque eu penso que a vida, a de verdade, exige individualidade. Enfim, eu sei que tenho a mania de pensar.




quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

ÁGUEDA SENA

Morreu a bailarina e coreógrafa Águeda Sena. Mais uma perda no meu mundo de afectos. Conheci bem a Águeda, trouxe-a a Portalegre, de boina, fumando toda a viagem, amparada por uma bengala que lhe dava um estilo único. 
Nas duas viagens que fizemos falou-me de muitos amores, da vida, da perda da primeira paixão num acidente numa avioneta perto de Cascais. Contou-me da dificuldade de caber nas normas de outros, do enorme desgosto por não poder viver um amor intenso e eternamente adiado. Dizia, fazendo-me rir, que vivíamos na época do sem fio. Que falávamos sem nos ligarmos, nem os telefones já tinham nada que os prendessem a lado algum...
A Águeda Sena foi, para mim, a personificação da Arte. 
Gostava de conversar com ela. Das transgressões, do desprezo assumido pelas hipócritas normas sociais, da força e vontade de não deixar nada por fazer, nada por viver.
A Águeda tinha 92 anos e morreu. Em mim, ficará viva nas boas memórias. 

CONVERSAS COM DOCE DE ABÓBORA

Pomos a mesa com cuidado, escolhemos o bule antigo, fazemos scones e ficamos a conversar. Vamos bebericando o chá, a tisana-corriges-, e trazemos os ausentes, a velha Praceta, as escadas do Liceu, a fila J do Crisfal, as boleimas partilhadas, os cafés no Alentejano. Nunca mais tomei café no Alentejano, confesso. Ris-te, porque os tempos são irrepetíveis, os momentos são sempre inaugurais. Iniciáticos? Talvez. E falamos de desilusões, de erros que nunca o seriam se a vida tivesse livro de instruções. Erros são experiências, vivências também. E há erros que, antes o serem, foram momentos perfeitos, digo. 
Chove lá fora, há carreirinhos de água nos vidros das janelas e a manteiga derrete nos scones quentes. O meu doce de abóbora sabe bem, dou-te a receita. Aqueço as mãos no bule antigo, vício herdado da minha mãe, e deixamos o silêncio temperar o momento.
É bom conversar com amigas de sempre. É bom desfiar memórias temperadas com doce de abóbora.

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

SOPHIA

Li, recentemente, a biografia de Sophia escrita por Isabel Nery. Se eu já era uma admiradora da poeta, e era e sou, mais cativada fiquei depois da leitura desta obra. 
Em primeiro lugar, deliciei-me com a escrita coloquial da Isabel Nery, com  a forma como confidencia ao leitor impressões e realidades. É um olhar atento, curioso, culto e respeitador o que Isabel Nery lança sobre a vida de Sophia. Segue-lhe os passos, tenta olhar o que a encantou, narra segredos e medos, assusta-nos e desafia-nos. 
Sophia de Mello Breyner AndresenDepois, há uma poeta viva dentro do texto. Sentimos a Sophia de olhos claros a descobrir Lagos, o mar - tanto mar! -, a fascinar-se na Grécia, a visitar o marido preso pela PIDE, a inventar histórias para entreter os filhos pequenos. É uma mulher  inteira, plena e intensa, que nos exige (a mim exige) uma verdade maior a cada facto, cada amanhecer. Depois de Sophia, o quotidiano fica dolorosamente insignificante.
Com o livro arrumado na desarrumação da minha estante, dá-me paz pensar que posso  revisitar as páginas de Isabel sobre a poeta
 que sempre me encanta!

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

LAST CHRISTMAS - NOT AGAIN

Last Christmas, I gave you my heart

But the very next day you gave it away
This year, to save me from tears
I'll give it to someone special



https://www.youtube.com/watch?v=E8gmARGvPlI


Nesta época do ano, oiço, nas diferentes Rádios, o Last Christmas. Gosto da melodia, como gosto de quase todas as músicas de Natal, e presto atenção à letra. Podia ter sido escrita para muitas mulheres, para mim também. 
Apesar dos anos passarem, da experiência aumentar, ainda caímos (caio) no erro de dar o nosso coração, de nos apaixonarmos de facto, porque quem nos faz desfiar lágrimas. 
Este ano, vou tentar cumprir a proposta da música. Porque, a cada dia, há nova oportunidade de ser feliz. Ou não?

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

CONTRA-SENSO

A época de Natal é das minhas preferidas. Gosto de tudo! Da casa engalanada, das azevias e filhós, dos bolos rei e rainha, do peru e do bacalhau, da excitação das crianças e do lume a arder forte. Gosto de fazer compras na minha cidade, reclamando porque há pouca oferta, iludindo o frio com café na Pastelaria pequenina que tem óptimos chocolates.  Gosto de oferecer presentes, de sentir o nariz vermelho de frio, de sorrir boas festas na calçada.
No entanto, este ano, ainda não fiz o Presépio, ainda não montei a árvore de Natal! É um contra-senso, penso. 
Devia já ter a casa a lembrar-me a época festiva mas, sei lá porquê, tenho adiado a coisa. Não é porque as saudades apertam, nem é porque faltam muitas pessoas à mesa. Sei que é natural que isso aconteça, um dia eu serei também um lugar vazio. Também não é por falta de tempo, as noites são longas, mas tenho sentido pouca vontade de ir ao musgo, de calçar botas de borracha e ir procurar o pinheiro. É mesmo um contra-senso, porque eu adoro andar à chuva e caminhar na Serra.
Talvez a minha vida seja um contra-senso no essencial. 
Hoje, vou fazer o Presépio!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

FOTOGRAFIAS

Resolvi arrumar a caixa enorme de fotografias antigas. Tantas. De avós, primos, amigos, rostos que não reconheço, heranças de avós e pais. No meio, nós. Pequenos, adolescentes, adultos mesmo.
O tempo amareleceu a fotografia. Quanto tempo? Não sei, não quero saber. Porque o Tempo fica sem Tempo quando deixa de marcar tempos. Ali estávamos juntos, sorriamos, e olhávamos na mesma direcção. Ainda não nos tínhamos perdido nas encruzilhadas dos caminhos, ainda não precisávamos de recorrer ao GPS. 
Ali conheci o teu toque, o teu cheiro, a força do teu abraço. Era ali o momento prenhe de mil momentos que fomos abortando descuidados.



segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

REVOLTA


Em Portugal foi identificado um crescente número de mortes ao volante causadas por indivíduos com drogas no sangue. A acrescentar ao elevadíssimo número de condutores com taxas de alcoolémia absurdas, o consumo de drogas está a tornar-se uma arma mortífera. Como de costume, um triste costume, o governo vai pensar numa forma de combater este flagelo… Vai pensar… Como  vai pensar na forma de combater eficazmente a violência contra a mulher, como vai pensar como evitar o péssimo serviço da maioria dos Hospitais públicos do país, como vai pensar como combater a crescente corrupção, como vai pensar como actualizar os vencimentos de forma a acompanharem o real aumento do custo de vida, como vai pensar como acelerar, com qualidade e rigor, os processos de adopção, como vai pensar nas muitas coisas que tem para fazer e que, eternamente, continuam adiadas.
Temos um governo de pensadores em redondo! Pensam, discutem, largam umas propostas cheias de vazio e coisa nenhuma e nós, portugueses, continuamos esperando por melhores dias. Tenho sentido que somos governados por gente que, pensando muito, age pouco ou nada… E lamento que assim seja. Porque a vida é demasiadamente rápida para que possamos viver de eternos adiamentos.
Portugal tem problemas estruturantes profundos e graves. Problemas que se prendem com a vida das pessoas e, na minha modestíssima opinião, as pessoas devem ser a primeira prioridade de qualquer governo. Temos os portugueses a serem vítimas de maus serviços de saúde, famílias a sufocar sob o peso dos impostos e os combustíveis mais caros do que a maioria dos países europeus. Temos a corrupção a aumentar e o Governo a falar da visita da jovem Greta, do nível da água do mar que há-de, um dia, inundar o aeroporto por construir, da gaguez de uma deputada, das parvoíces do CHEGA. Às vezes, tenho vontade de ter coragem para emigrar e mandar este país que tanto amo às urtigas.
Continuo a pensar que, com outros governantes, o país podia melhorar. Continuo a acreditar que a Assembleia da República não é um lugar de mérito, não é um espaço do qual nos orgulhemos. Os cargos políticos parecem ter-se tornado numa forma de ganhar um lugar ao sol, de encher os bolsos e não de servir o país. Não percebo, a sério, o alarido que se faz em torno do CHEGA, dizendo, entre outras coisas, que vive apenas de frases sonantes e demagogia porque, sinceramente, isso também faz o Governo!
Aliás, eu acredito que o CHEGA, tal como o Bloco de Esquerda, o LIVRE e o PAN, nem teriam assento na Assembleia se o governo, os sucessivos governos, funcionassem.  Os partidos de extremos, seja à direita ou à esquerda, e para mim tanto uns como outros valem zero de consideração ou respeito, surgem para dar voz ao desespero indignado. Apenas. Desaparecerão, ou desapareceriam, se os Partidos que se fundamentam na real construção da Democracia, aqueles que se sustentam em filosofias  sérias, cumprissem a sua função. Afinal, se o PCP, o PS, o PSD e o CDS ganhassem sentido e cumprissem o seu desígnio, não teríamos de aturar os extremismos.
Acho eu. Que não gosto da esquerda mas detesto extremos!!

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

NÃO ME APETECE

Não sei se é o Natal, se o frio honesto, se a idade, se a passagem do tempo. Sei que, cada vez mais, experimento um enorme desejo de paz e uma pouca vontade de alimentar ódios. Cada vez mais acho que é um desperdício de energia alimentar zangas e desentendimentos. Apetece-me  a paz tranquila da compreensão, da relação calma, dos conhecimentos feitos de respeito e direito à diferença.

Na semana passada, numa das curvas da vida, esbarrei, uma vez mais, com a maldadezinha que se faz de insinuações, de mesquinhez, de sacanice reles. E não me apetece sofrer por isso. 
De maldade, agressão, juízos de valor e insultos já tive a minha conta...

domingo, 1 de dezembro de 2019

PESSOAS

São sempre as pessoas quem me marca. Esta semana, ou melhor, na semana que ontem terminou, tive muitas realidades com pessoas e, pior para mim, com pessoas diferentes! Tive o privilégio, sou mesmo sortuda, se conhecer, ao vivo e a cores - muitas cores! - a Professora Ivete Azevedo. É uma mulher fantástica! Bem disposta, conhecedora, atenta, envolvida de facto na construção da tal Escola que eu tanto ambiciono. Veio falar de criatividade, veio ajudar-nos a aprender a melhor forma de facilitar o desenvolvimento de competências criativas no quotidiano. Podia tê-lo feito de cátedra, afinal é doutorada e pós-doutorada, mas fê-lo com a simplicidade dos que, porque são Bons, não precisam de se colocar em bicos de pés. Trabalhou, desafiou-nos, corrigiu-nos, ouviu-nos e deixou-nos (a mim e a outros colegas) com vontade de saber mais, de treinar mais tempo. A Professora Ivete naturalmente perguntou-me para que queria José Régio tanta tralha, e riu-se das minhas histórias contadas junto ao túmulo de D. Jorge de Mello. Quando se foi embora, fiquei mais sozinha, mais vazia também.
Na mesma semana, e pouco antes da Ivete chegar, vivi momentos de terror com outra pessoa. Calúnias, insinuações, provocações, formas de agir que sempre revelam personalidades insignificantes, mentes vazias e corações azedos. 
Hoje, domingo, fazendo o balanço da minha semana, voltei a agradecer a Deus a presença  destas duas pessoas na minha vida: - Uma, porque me ajuda a ser melhor; outra porque me permite saber como não ser e, simultaneamente, expiar os meus pecados!

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

ESQUEÇAM-ME


Esqueçam-se de mim. Isso mesmo. que ninguém me telefone, que ninguém me mande sms ou modernos watsapp, que o meu telemóvel não bipp de e-mails. Quero, hoje, a paz da solidão, o silêncio do alheamento, a tranquilidade de ser  sozinha. Quero desfrutar da queda das folhas amarelecidas, do vermelho que borda o limite negro do alcatrão, quero caminhar sobre a macieza da alcatifa de folhas. 


Esta é a Fall lagóia. Sem a enormidade das Américas, com a simplicidade pura de Portalegre. Por isso, esqueçam-me. Deixem-me, hoje, ser feliz sozinha. É bom não ser animal de companhia. Às vezes.

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

AS CRIANÇAS PORTUGUESAS

"As crianças portuguesas são as que passam mais tempo na escola, jardins de infância e creche. Em média, cada criança cumpre um horário de doze horas" - Fiquei assustada. Claro que eu já sabia que as crianças passam tempo demais nas Escolas mas, dito assim, com números e força de estudo científico, parece ser ainda pior.
Sem dúvida, as sociedades desenvolvidas, na sua maioria, deixam para trás muito do essencial da vida em nome do trabalho. Em Portugal, infelizmente, exagera-se mais ainda. Os portugueses gastam muito tempo nos empregos e, paradoxalmente, produzem menos do que outros povos que estão menos horas nos seus empregos. Parecia, assim de repente, que seria possível, até fácil, reorganizar as coisas: - Horários mais flexíveis, trabalho por objectivos, mais tempo para se ser pessoa. Mas não é fácil. O que vemos, cada vez mais, são pessoas fechadas oito horas por dia, muitas vezes fazendo cera, outras consumindo bicas. 
Li, há pouco tempo, uma reportagem que dizia que numa qualquer província do Japão tinham feito uma experiência e, durante seis meses, tinham reduzido a semana de trabalho a quatro dias. No final, verificaram que a produtividade aumentara 72% e os índices de felicidade 92%. Claro que o Japão não é Portugal mas, neste caso, até eu fiquei com os olhos em bico...
As crianças que passam sete horas na creche, nas amas, nos infantários e nas Escolas, são geralmente

crianças com baixos níveis de felicidade. São crianças às quais falta tempo de qualidade na construção de teias de afecto e emoções capazes de sustentar os embates da vida adulta.
Gostava muito que Portugal olhasse as suas crianças com outro olhar. Com mais respeito, com mais seriedade. Mas, neste meu país eternamente por cumprir, as Pessoas nunca são prioridade...

domingo, 24 de novembro de 2019

ANIVERSÁRIO

A Vida cumpre-se num fazer de pequenas coisas" é um lema que tento seguir. São os acordares com chuva, uma caipirinha junto ao mar, um abraço bem forte, os beijos dos netos, um café com amigos, uma caminhada na serra, e mais mil vivências, rotineiras e insignificantes, que dão sentido à vida.
Mas, talvez por oposição, há factos grandes, acontecimentos esporádicos, que também me fazem ser quem sou, que me marcam fundo. 
O nascimento do meu primeiro neto, faz hoje dez anos, em Cambridge, nessa Inglaterra de que tanto gosto, foi um marco na minha existência. Não imaginava que se pudesse amar assim, com tanta entrega e plenitude, um ser que não vinha de dentro de nós. Tinha experimentado essa avalanche de amor com as minhas filhas e, de repente, o meu neto voltava a despertar  em mim a força do AMOR total. Ao mesmo tempo, voltas da vida, nesta data voltei a acreditar que seria possível ser feliz a dois. Pura ilusão. Mas nem a dor, o sofrimento, a maldade alheia, a humilhação da frustração, conseguiram manchar o amor pelo meu primeiro neto.
Hoje, o meu Manuel Bernardo faz dez anos. Está longe, mas eu sinto-o bem pertinho de mim. 
Quero escrever hoje, porque acredito que a palavra fica quando a vida é nada, que o meu neto mais velho revolucionou a minha emoção. A minha vida também! 

terça-feira, 19 de novembro de 2019

SONHOS

Tenho um sonho. Melhor, tenho muitos sonhos, utopias, lugares que  ainda o não são, vontades e desejos que um dia, acredito, serão. São sonhos com vontades essenciais, virados para fora. O que fiz aos sonhos meus, aos de dentro? Desfizeram-se . Esboroaram-se contra a espuma dos dias, diluiram-se no sal acre das mil lágrimas. Ficaram os de fora. Os que envolvem um mundo novo, cheio de possíveis, sem solidão e vazios.
Martin Luther King também teve um sonho. E desapareceu sem o cumprir. Herdei, creio, sonhos de outros. E, ainda assim, tenho os meus! 

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

HÁ CANALHAS A MAIS

Tenho dificuldade, muita, em lidar com o desinteresse profissional. Eu sei, claro!, que ninguém vai mudar o mundo, que é impossível que todos estejamos em sintonia mas, ainda assim, não compreendo, não consigo aceitar, que haja profissionais que não cumprem, que não fazem, que não se empenham na construção de uma nova realidade, de um novo mundo. 
Kennedy disse, um dia, que "Uma pessoa sozinha não vai mudar o mundo mas, se agir bem, sempre será um canalha a menos". É isto! Há canalhas a mais...

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

TRISTEZA

Sophia dizia que "a saudade é a tristeza que fica quando alguém de quem gostamos vai embora". Eu sinto exactamente assim. Tristeza funda, magoada, feita de incompreensão e revolta. A ausência voluntária, o afastamento violento daqueles de quem gosto, fere-me fundo. Claro, eu sei, as pessoas têm o direito de se afastar e, muitas vezes, a saudade é só de quem fica no cais vendo as amarras desfazerem-se.
Há dias, muitos, em que a saudade, a tal tristeza que não faz parte apenas da Poesia, me embrulha numa dolorosa sensação de vazio dorido. Sei todas as razões, conheço todas as verdades e justificações, mas, ainda assim, a tristeza instala-se!

terça-feira, 12 de novembro de 2019

FORA DE TEMPO

Oiço, cada vez mais, falar em inteligência emocional. Sempre que surge uma formação com este tema, chovem inscrições , e eu, que tenho os sentires à flor da pele, que acredito mesmo na força das emoções, já não me surpreendo. Não tenho dúvidas que sentir, viver, experimentar, levar ao rubro emoções, é das melhores formas de viver e de ser. Eu, que não sou existencialista e que, por isso, acredito que há essência para lá da existência, reconheço a força e a influência que os espaços, físicos e psicológicos, exercem sobre mim. Em Inglaterra sou sempre mais EU, mais completa e realizada, do que em Portugal. Claro que o facto de ter lá a minha filha, e dois netos que adoro, tem influência mas, penso, há mais do que isso. Ou, se calhar, esse facto despoleta outros pensares, sem dúvida outros sentires.
Em Inglaterra as cores, o frio, os sabores, tão diferentes!, sempre me transportam para vivências de real entrega e paz. 
Às vezes, tenho pena de já não ter força, ou coragem, para emigrar e ir construir sentidos nesse país que foi dos meus antepassados e, hoje, é dos meus descendentes! Falhei a vida. Talvez, como Carlos da Maia e João da Ega. Talvez, como quem sonha sempre. 





segunda-feira, 11 de novembro de 2019

FACILITISMO

Quando aterrei em Portugal, e me dispus a ouvir e ler notícias, esbarrei com a indignação de muitos professores por o Ministério da Educação defender a não existência de reprovações, de chumbos, até ao nono ano. Os docentes mais inflamados, lamentando a sua sina de docentes, diziam mesmo tratar-se de uma política de facilitismo.
Não posso discordar  mais destas afirmações!
E explico!
A escola Pública, que nos últimos anos tem feito um percurso muito positivo, é, ainda, das que, na Europa, mais reprova alunos. E fá-lo, penso eu, porque há alunos que não aprendem ao ritmo da maioria, porque há alunos desinteressados e preguiçosos, dizem. Conheço, muito bem!, todas as justificações. O que discuto, o que contesto, é em que medida as reprovações têm contribuído para as aprendizagens dos alunos. Ou seja, um aluno que repete um ano, no ano seguinte torna-se bom aluno? Sabemos que não. Um aluno que repete um ano tem tendência a repetir muitos outros. Fica, por assim dizer, pré-destinado à exclusão social. Ora, se queremos, e eu quero!, uma Escola que possa ajudar a construir uma sociedade mais democrática e equitativa, os professores, que são os especialistas em Educação, têm de ser capazes de encontrar soluções para que a aprendizagem aconteça, muito mais do que limitar-se a constatar o insucesso. A Autonomia e Flexibilidade Escolar, que desde 2017 está em vigor, permite às Escolas, e obviamente aos professores, encontrarem as estratégias, e os processos, que permitem promover o sucesso de todos! A ciência prova-nos que todas as pessoas aprendem. E que não aprendem ao mesmo tempo, nem do mesmo modo. 
Assim, o sucesso das aprendizagens pode SIM ser alcançado por todos. E, SIM também, facilitismo é chumbar alunos. Não implica trabalhar de outro modo, não implica procurar soluções, basta atribuir um número!
O mundo mudou muito. Evoluiu em muitos aspectos, regrediu noutros. Não vai, com certeza, deixar de se modificar e, penso eu, quem é professor e lida, diariamente, com crianças e jovens, tem de reconhecer estas transformações e de lhes dar resposta.
Analisar cada aluno, procurar estratégias e soluções, olhar a pessoa que mora em cada aluno, é parte integrante da acção docente! Chumbar alunos é  facilitismo, sim! 

sábado, 9 de novembro de 2019

INTERVALO

Inglaterra nunca para de me surpreender.  Gosto das cores, dos prados, da música nas conversas. Desta vez, Jane Austen abriu-me as portas de sua casa. Lugar da magia da escrita! O Romantismo puro, a vida real também. A minha grande costela inglesa delicia-se com estas vivências! São, digo sempre, intervalos na minha existência.



 Sr

terça-feira, 5 de novembro de 2019

LUGARES

Sem dúvida, o melhor lugar num aeroporto, e num avião, é dentro de um livro!!

NECESSIDADE

Finalmente, chove decentemente. Chuva escorrida, constante, a lavar a existência e a refrescar a essência. Faço de novo a mala. E com que entusiasmo o faço! Ir ver os meus netos, ter a possibilidade de, durante oito dias, encontrar verdadeiro sentido na minha vida, faz-me muito bem. 
Preciso de coisas, vivências, factos, práticas, que me façam bem. Preciso de reconhecer afectos, de encompridar ternuras, de renovar a minha fé numa existência que, vezes demais, me parece absurdamente cheia de insignificantes aparências. 
Preciso de sentir que faz sentido, ainda, acordar a cada manhã. 

domingo, 3 de novembro de 2019

MAIS UM DOMINGO


Como eu gosto de um Domingo assim, com chuva, vento e Outono! Gosto de caminhar no campo, de ter os cães por companhia, de troçar do catavento que, desnorteado, não cata vento nenhum. E gosto de colher dióspiros, de me enfiar por debaixo das árvores para chegar aos mais maduros, de identificar o perfume das ervas misturado. 

Hoje, já sem netos e com a solidão a esticar-se para lá do absurdo, desfrutei deste domingo como Caeiro, estando de acordo com a Natureza sem porquês nem razões. 
Agora, quando a noite se aproxima, acendo o lume, cozo castanhas acabadas de apanhar e penso que a vida podia só ser isto: - Aceitar cada dia com perfume de autenticidade e sabor de castanhas cozidas. Com erva doce, claro!!

sábado, 2 de novembro de 2019

NOVEMBRO

O mês de Novembro começa com a tradição de pedir os santinhos. Quando era miúda, lá na Serra, íam miúdos pedir e sempre levavam muito para casa. Este ano, comecei os santinhos com o Dia das Bruxas. Sim, o Halloween não é uma tradição portuguesa mas, sem dúvida, o mundo mudou e, hoje, o mundo existe no global e as tradições também. Gosto imenso do Halloween! 
Desde logo, sempre tive uma paixão por bruxas e, se eu pudesse, bem que gostava de ter uma vassoura voadora e um chapéu bicudo... 
Este ano, porque os meus netos vieram ter comigo, esmerei-me nos enfeites: - Pendurei bruxas e morcegos, comprei abóboras e até arranjei um bolo  com doces morcegos! 
No dia 1, quando as bruxas já tinham partido, fui, de longe, acompanhar os meus netos pedindo santinhos. Trouxeram dois sacos de guloseimas mas, muito mais do que comer os doces, a euforia foi bater às portas e dizer "gostosuras ou travessuras"... é que eles, pequenos, baralharam as tradições!!

terça-feira, 29 de outubro de 2019

ESQUISITICES

Aproxima-se o dia das Bruxas, o very british Halloween, e as crianças andam entusiasmadas. As lojas oferecem tentações, até roupa de bruxas, abóboras decoradas, etc. É o mundo vivo! É a globalização que, gostemos ou não, não podemos ignorar.
Não percebo por que há Escolas, e jardins de infância, que se orgulham de não festejar o Halloween por não ser uma tradição portuguesa.
Vivemos numa cultura global e, sinceramente, parece-me absurdo que se queira ignorar o óbvio e fechar os olhos às transformações do mundo que integramos. Na minha modestíssima opinião, deveríamos ser capazes de incluir tradições o que, penso, não obriga a ignorar as tradições portuguesas
Assinalar o Dia das Bruxas não impede que se peçam os Santinhos, ou que se façam papas de milho!
Eu vou decorar abóboras e pendurar morcegos e vassouras lá por casa. Se vier uma bruxa, hei-de pedir-lhe que me deixe dar uma voltinha de vassoura, e que me ensine a fazer a poção da felicidade!

PROVOCAÇÃO

Já perdi a conta às vezes  que eu decido uma coisa, e faço outra. Desta vez, tinha pensado nem me pronunciar sobre a entrada na Assembleia da República do assessor de Joacine Katar, aquela senhora do Livre que parece que sofre de gaguez intermitente. Achei ridículo, (mas acho tanta coisa ridícula), e decidi ignorar. 
Mas os comentários que tenho ouvido, e lido, obrigaram-me a mudar de opinião. Forçaram-me a ter opinião!
E não, não é indiferente a forma como cada um se apresenta em lugares públicos. Porquê? porque, para se ser sociedade, há regras, há normas, há costumes que nos unem. Lembro-me das minhas filhas perguntarem por que razão não podiam levantar-se da mesa sem pedir licença, ou por que razão tinham de esperar para começar a comer, ou porque não podiam sentar-se com os pés em cima da mesa. A resposta é óbvia: - Porque há regras na sociedade em que vivemos!
Este assessor, com a saia que nem escocesa era, é, para mim, uma figura ridícula e provocatória. Dir-me-ão que cada um é como é. Certo. Relativamente... Pensemos que o homem era acrobata, seria aceitável que entrasse no Parlamento às cambalhotas, ou fazendo o pino? Ou vestido de maillot cintilante??
Penso que há alguma confusão, que começa a ser preocupante, sobre o que é ser livre e o que é ser provocatoriamente absurdo. 
Ser livre obriga a ser responsável! Afinal, já quase há 100 anos Sartre dizia que "liberdade não é fazer o que se quer, mas querer fazer o que se faz!"
Pessoalmente, e tentando não cair nos achismos que fazem o quotidiano, não gosto deste assessor e lamento que possa circular, e opinar, na Casa da Democracia Portuguesa. 

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

NÃO

Não há meio de aprender a dizer NÃO a desafios! Sou velhota, não tarda faço 60 anos, e ainda não aprendi a mais elementar das lições: - Não devemos mostrar disponibilidade sempre!
Desta vez, o desafio foi aliciante: - Falar, na Casa Museu José Régio, de Agustina Bessa-Luís e José Régio. Dois autores que leio regularmente mas que, confesso, nunca tinha associado. Na base do desafio, entreli eu, o meu fascínio pela leitura. E na minha razão, ou desrazão, a ecoar António Vieira "Melhor do que falar dos Santos, é falar como os Santos". 
Poderei, alguma vez, chegar aos calcanhares de Agustina ou Régio? Nem que renascesse mil vezes...
Pois é, devia ter dito que não!

sexta-feira, 25 de outubro de 2019

AGORA(S)


Recebi, há pouco, um vídeo, daqueles não personalizados que se reencaminham, de forma acrítica, para os contactos, sobre a urgência de se viver o agora. O orador é brasileiro, já entradote nos anos, e enumera, com convicção, uma imensidão de realidades que, habitualmente, deixamos para depois e que, infelizmente, acabamos por não viver. Fala da velocidade a que crescem os filhos, das vezes que o beijo sai a correr porque o trabalho nos chama, de muitos adiamentos das pequenas coisas que, de facto, são significativas.

Habitualmente, quando recebo estes vídeos, elimino-os. Hoje, porque, curiosamente, não tenho urgências, vi até ao fim. É verdade que tudo são banalidades, Lapalissadas... Mas é verdade também que abusamos do adiar de pequenos-grandes momentos da vida. Como é verdade que o Tempo é cruel e se esgota num instante.
Pensando no vídeo, abracei com força a minha solidão, sacudi da alma os pós de poeira negra instalada, preparei um belo Gin e vim consumir, com a saborosa consciência da transgressão, um romance inocente!

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

AGRESSÃO

Os últimos dias têm sido marcados pela divulgação de agressões de alunos a professores, de professores a alunos também. A opinião pública, que está a tornar-se mais pública do que opinião, toma partido e lê-se de tudo. Há quem se indigne considerando que a Escola portuguesa é um campo de batalha, há quem culpe os pais dos alunos, há quem afirme que falta preparação aos professores, há quem diga que a responsabilidade é do Ministério da Educação, etc. Há, até, professores que escrevem nos jornais, e nos diferentes blogs, testemunhos de partir o coração. Dizem-se violentados, velhos, eternamente traumatizados, frustrados, etc. 
Não pretendo desvalorizar o sofrimento de ninguém! 
Compreendo que os professores, como eu, ganham pouco e trabalham imenso. Compreendo que não dá paz a ninguém andar, ano após ano, com a mochila às costas, deixando longe a família, sem estabilidade ou segurança no trabalho. É tudo verdade!
No entanto, creio que há algum exagero e alarmismo no que, nos últimos dias, tem vindo a público.
A sociedade actual é violenta. Diariamente somos confrontados com imagens de guerra, de ataques a mulheres e crianças, de injustiças várias. Sendo a Escola parte da sociedade, compreende-se que a violência também aí se sinta crescer. Como agir? Com firmeza e bom senso. Os agressores têm de ser punidos, mas, também, educados. 
Não acredito que a Escola Portuguesa seja, no seu todo, um espaço de violência e agressão. Acredito, sim, que há em algumas escolas, e com maior incidência em zonas socialmente frágeis, situações de violência que, em conjunto, professores e comunidade, precisam resolver. 
Eu sou professora e não estou de nervos esfrangalhados ou alma destruída! Desculpem. 

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

NÃO CAMINHES SOBRE OS MEUS SONHOS, POR FAVOR!

Às vezes, sem causa aparente, ou sem causa imediata, ou fruto de muitas causas que vou chamando de desrazões, a poesia apetece-me. E volto a poemas que me tocam... 
Hoje, talvez porque penso que há quem insista em caminhar, de botas ferradas, sobre os meus sonhos, lembrei-me de Yeats:



Fossem meus os tecidos bordados dos céus,
Ornamentados com luz dourada e prateada,
Os azuis e negros e pálidos tecidos
Da noite, da luz e da meia-luz,
Os estenderia sob os teus pés.
Mas eu, sendo pobre, tenho apenas os meus sonhos.
Eu estendi meus sonhos sob os teus pés
Caminha suavemente, pois caminhas sobre meus sonhos.

William Butler Yeats

BAJA

A agitação sonora, e motorizada, chegou a Portalegre. Mais uma edição da BAJA, mais uma vez a cidade cheia de movimento, de gente jovem e de muita alegria. O trânsito já está condicionado, e eu, que cada vez estou mais comodista, até gosto destes condicionamentos. É bom ver a cidade viva, dinâmica e cheia de energia. 
Vai ser um fim-de-semana diferente, como lama e terra, com a impossibilidade de chegar ao Rossio em dois minutos. Mas, sobretudo, vão ser três dias fantásticos de vida e alegria na minha cidade!
Só falta chover muito, chuva de verdade, em cordas grossas, para que a BAJA seja ainda mais emocionante!

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Demais

O governo de Portugal cresceu para os lados, engordou! 
Passamos a ter 19 ministros, dois novos ministérios e a módica quantia de 50 - CINQUENTA- secretários de estado. Assim, à primeira vista, a quem, como eu, não percebe nada de governos de Portugal, parece gente em excesso. Mais em excesso parece se pensarmos no tamanho de Portugal e no número de habitantes... 
Olhando o mundo, sabemos que na Suécia há 11 ministérios, na Finlândia 14, no Brasil 16,  e, em Angola, 32. Considerando que por Portugal a tendência é para engordar o governo, não resisto a perguntar se teremos como meta uma democracia como a de Angola.

CASAMENTOS

Este 2019, quase moribundo, tem sido pródigo em casamentos. Dia 19, uma vez mais, lá fui eu, privilegiada decerto, assistir ao casamento da Ana. A Ana foi minha companheira de muitas viagens, de muitas aprendizagens também, quando, na Escola e com turmas, desenvolvia o Clube Europeu. Vi a Ana crescer. Vi-a, orgulhosa, sentada no Parlamento, em Estrasburgo, vi-a a desembaraçar-se, em Stavenger, quando ficou alojada numa ilha. A Ana tinha sempre opinião vincada, gostava de aprender e escrevia bem. Fez o curso de economia e, hoje, é já uma profissional de sucesso.
No sábado, em Mafra, debaixo de chuva torrencial, a Ana casou com o João. Saí de Portalegre cedo, olhei o Convento, pensei em D. João V e na importância do amor de Baltasar e Blimunda. Recordei a passarola e voltei a acreditar que o sonho pode fazer a diferença.
A Ana e o João estavam felizes. Eu desejo que sempre sejam felizes! A minha incurável alma romântica continua a acreditar no amor e na possibilidade de se ser feliz a dois. Aliás, continuo a acreditar que viver a dois é bem mais fácil do que existir na solidão!

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

60

É um número redondo. Um número com força psicológica: 60! Eu, que não gosto de números e tenho com eles uma relação difícil, olho com suspeição e temor os 60 anos... 
Hoje, chegaram para a minha amiga-irmã. 
Somos amigas desde o tempo em que não há memória, quando as urgências são a dias, e os amores eternos na sua reduzida temporalidade. Juntas, subimos e descemos mil vezes a rua do Comércio, ora cantando os verbos irregulares em inglês, o Dr. Renato o exigia, ora comentando as paixões adolescentes, ora rindo de coisas tão importantes como escorregar na calçada. Andávamos sempre juntas e, quando nos separávamos, corríamos para o telefone para continuar conversando. Era o tempo das telefonistas a perguntar "número??" e a interromper a ligação para anunciar que havia chamadas urgentes para o meu Pai e, por isso, tínhamos de desligar. Era, também, o tempo do Crisfal nos sábados, a fila J, as ousadias iniciais e a partilha sobre as sensações recém descobertas. A Praceta ouvia as nossas confissões. Gastávamos o cimento do muro com os nossos rabos, experimentávamos as motas dos amigos e dançávamos na garagem. Era o tempo dos slows (que nós tornávamos ainda mais slow), e de tudo o que os mesmos permitiam.
Depois, o tempo passou. Filhas, problemas, netos, responsabilidades e a amizade verdadeira a ficar sempre. Não podendo ser irmãs, tornámos-nos comadres, trocamos afilhadices. A distância emocional resistiu aos quilómetros físicos, a cumplicidade manteve-se, os segredos continuaram a ser só nossos. 
Hoje, a minha maior amiga chega ao número simbólico e vence mais uma barreira. Experimento um misto de emoções: - Alegria-esperança-receio-saudade!!
Se eu chegar aos 60, faltam 4 meses, hei-de festejar de verdade!!

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

E AS TÁGIDES?


Há muito tempo já que não ía a Lisboa com tempo para apreciar a cidade líquida. O vício do centralismo, que parece estar nos genes dos governantes portugueses, tem feito com que Lisboa seja, sobretudo, um lugar de reuniões e trabalho. Porque, por sorte, o país foi encolhido pelas velozes auto-estradas,  vivendo em Portalegre vou e venho, no mesmo dia, sem dificuldade. Ontem, felizmente, pude apreciar a cidade do Tejo. Sentei-me na esplanada, tomei café e olhei . Talvez por ser dia de semana, não havia excessiva poluição humana e pude tentar descobrir as tágides de Camões. Não as vislumbrei. 
Talvez a modernidade, esta vida de vazios urgentes, tenha afastado do Tejo as ninfas inspiradoras. Talvez, oh meu Deus!, a poesia tenha sido arrancada do coração das gentes...

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

DIFÍCIL CONCORDAR

Quando andei na Universidade, no século passado, Saramago não era Nobel e nem sequer era estudado. Como leitora compulsiva que sou, li, sem nenhuma intenção para além da minha fruição, a obra de Saramago. Gostei de alguns romances, não gostei de outros. Apaixonei-me por alguns textos, passaram a fazer parte de mim, desinteressei-me de outros.
Já como professora de português, tornou-se, e bem, obrigatório dar a conhecer a obra de Saramago aos alunos. Fi-lo com interesse e gosto. Li cartas, crónicas e, no 12º ano, O Memorial do Convento. Tive algum receio do desafio que era trabalhar uma obra desta envergadura...
Fiz formação, fui aprender como trabalhar este romance e, claro, fiz, com os alunos, dezenas de visitas a Mafra. Eram, sempre, visitas muito interessantes e de extrema qualidade. Como inconveniente, só mesmo o custo das mesmas...
Há dois anos, surgiu a obrigatoriedade de substituir O Memorial do Convento pelo Ano da Morte de Ricardo Reis, por dois anos lectivos.   
Achei uma excelente ideia, voltei ao romance que lera já havia uns anos. E voltei a encantar-me. 
Para mim, fazia, e faz, todo o sentido trabalhar este romance, até porque os alunos de 12º ano estudam Pessoa e os heterónimos. A linha de relações possíveis, a palavra ficcionada ao serviço, claro, de um ideal maior, parecia-me (e continua  parecer) , uma excelente oportunidade para desenvolver competências de cidadania.  
Este ano, e esgotados os dois anos anunciados, as escolas podem escolher entre as duas obras. Para grande surpresa minha, há escolas a escolher o Memorial do Convento
Fica difícil, para mim, concordar com esta opção. 
Compreendo que para o concelho de Mafra as visitas ao Palácio-Convento são geradoras de riqueza e actividade, mas penso que, para os alunos, O Ano da Morte de Ricardo Reis é mais capaz de desenvolver e cimentar o sentido crítico e a acção cívica.
Enfim, às vezes, fica difícil concordar com os meus colegas. 

PAR SINGULAR

Finalmente, chove. De noite, a chuva fez música na minha janela e procurar um casaco encheu-me de alegria. Gosto tanto da chuva! Não me traz a angústia que o Augusto Gil imortalizou, não me embrulha em (mais ) tristeza. A chuva faz-me boa companhia, embala a minha insónia e ajuda a lavar alguns pesadelos. Abro a janela para deixar entrar o cheiro da terra molhada, também ela feminina, também ela carente da seiva retemperadora. Este cheiro acre e intenso, que sempre me surge castanho e denso, faz-me acreditar em mil possíveis. 
Ao som da chuva, chamo-te na memória e abraço-te com força. É bom ter-te aqui, comigo, de novo sendo um par de um. 

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

INTELIGÊNCIA

São precisas muitas mulheres para esquecer uma mulher inteligente

É António Lobo Antunes, o escritor por quem estou absolutamente apaixonada, o autor que me prende a cada linha, quem faz esta afirmação. Eu acho que ele tem razão, e creio que, com os homens inteligentes, acontece o mesmo. 
Com a idade, com as vivências, os beijos correm o risco de ficar ocos, os abraços tornam-se lassos e é a inteligência que salva a existência a dois. Hoje, penso assim.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

PARAÍSO

Há uma música moderna, que passa frequentemente nas Rádios, que diz, numa melodia agradável, que o paraíso existe. Se é verdade o que cantam, tu és o meu lugar no paraíso. Em ti descanso a revolta, no teu abraço dispo a camuflagem da existência, nos teus beijos alimento a minha alma. Em ti, pouso a confiança, tantas vezes perdida, e em ti, no silêncio, abro janelas ao sonho.
Tu és o meu paraíso. 
Em ti estendo a toalha inexistente e deixo adormecer a desesperança. 
Tu és o meu paraíso. 
Como o paraíso, és o lugar que nunca alcanço. Como o paraíso, estás sempre longe demais!

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

FICÇÃO

O vidro, ao comprido da porta, revela a sala de aula. Os alunos, em três filas, dois a dois, a olhar, e a professora, de livro na mão, fazendo a leitura do poema (os alunos lêem tão mal...). Ela, a professora, fala (os alunos não estão habituados a linguagem poética).. Ela diz coisas de Pessoa, do que quer dizer o verso primeiro, os seguintes também,  da temática em causa. Os alunos, sempre nos seus lugares, ouvem. 
Ou não. Há quem aproveite para actualizar a informação do Facebook, quem faça exercícios de matemática, quem tente registar o que a professora diz. A seguir, quando do poema já só restam palavras ocas, recursos de estilo vazios e mensagens lineares, a professora passa a responder às perguntas do livro. Ah, a primeira passou, já tinha dito na análise do poema! 
No final da aula, uma aluna pergunta como é  possível ter encontrado tanta coisa naquele poema que, para ela, só fala da natureza. Sorrindo, pedagógica, a professora afirma que é o resultado de muitos anos a fazer o mesmo...E a jovem pensa, mas não diz, que isso nunca acontecerá com ela, porque não se imagina passar muitos anos a escrever coisas sobre poemas.
Este mini-registo é pura ficção. Mas, se por azar acontecesse numa Escola qualquer, que pena eu teria dos jovens que assim perdem tempo de vida...

terça-feira, 8 de outubro de 2019

MENINO JESUS

Menino Jesus,
Sei que o Natal ainda tarda, que este não é, por enquanto, o Tempo de Te pedir presentes, mas estou muito angustiada e preciso de Ti.
Menino Jesus,
Eu sei que Tu me conheces, às vezes ralhas-me de mansinho, nunca me viraste as costas e eu, desculpa, tenho abusado da Tua compreensão.
Menino Jesus,
Obrigada por seres meu amigo, por conversares comigo nas noites que a insónia encomprida, por me permitires espantar-me com a Beleza dos frutos que enchem as árvores da Quinta.
Menino Jesus,
Obrigada por aceitares as minhas orações feitas, tantas vezes, de reclamações, de dúvidas e alterações ao tido como norma.
Menino Jesus,
Preciso ainda  mais de Ti! Preciso do Teu sorriso, do Teu olhar, do Teu carinho doce no ramalhar que me ajuda a acordar.
Menino Jesus,
Quando for Natal, prometo não Te pedir nada. Faço-o por antecipação. Peço-Te maior capacidade para suportar a desilusão, peço-Te que me ajudes a perseverar na construção de possíveis de confiança.
Menino Jesus,
Não me abandones. Mesmo falhando muito, vezes demais, preciso de TI. Não me deixes sozinha, por favor...

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

CONFISSÂO

Hoje, fazes-me falta. Amanhã, não sei; ontem, já não me lembro. Hoje, sim, fazes-me falta. Queria encostar-me no teu peito, deixar que o silêncio dissesse da minha tristeza, que os teus beijos calassem a minha mágoa profunda. Não quero falar-te da vida, que vida?, nem sequer de preocupações, são tantas!, mas quero dizer-te do meu silêncio excessivo. 
Estou cansada.  Ao contrário do poeta, o que tenho em mim não é só um íssimo-íssimo-íssimo cansaço. É, também, um incompreensível desejo de vazio. Sim, desejo o nada. O imenso nada que não se opõe ao tudo, porque o ignora. 
Para além do nada, desejo-te a ti. O abraço, a presença, o sorriso, o ombro (o tal). Fazes-me falta. 
E eu que acho que me devia bastar a mim mesma por que, ensinou--me a vida, os outros, a maior parte das vezes, sobram na construção de sentidos.

RESCALDO

O PS ganhou, ontem, as eleições. Nada de surpreendente, há muito (há tempo demais) que as sondagens o diziam. Surpreendente foi, para mim, que pequenos Partidos elegessem deputados. Mais triste, na minha sentida opinião, foi o PAN  eleger mais do que um deputado quando, achava eu,  um já seria estupidez a mais. Que o CDS tivesse ficado reduzido a uma ínfima expressão, também já esperava. Não vivemos num mundo de Ideias, mas de fogo fátuo...
 Enfim, quero tentar esquecer e, seguindo Ricardo Reis, viver cada hora apenas. Porque, se assim não fizer, vou chorar de desespero face à brutal abstenção.

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

POLÍTICA

Tenho muito respeito pela Política. De verdade, e convictamente, considero que a política é a sustentação da vida em sociedade e que, por isso, não devia ser confundida com partidos, reduzida a conflitos politico-partidários. Muito jovem iniciei actividade política. 
Quis, e quero ainda, um mundo melhor, um país mais justo, mais sério e mais digno. Ao longo dos tempos participei activamente na vida política. Integrei a Assembleia Municipal, fui candidata à CMP, à Assembleia da República, participei em Comícios e diferentes Fóruns. Tenho militância partidária. Consciente e consistente. 
Ao longo do tempo, também, fui sofrendo desilusões. Perseguições individuais, má-língua, afastamento. E fui ficando cada vez mais calada, atenta sempre, escrevendo e dizendo o que penso de forma (relativamente) livre.
Nesta Campanha Eleitoral fiquei à margem. Fiquei olhando, observando. E não gostei NADA do que observei.
Não concordo com o ruído que fez Campanha, com os ataques pessoais, com o vazio de ideologia. A dada altura, a meio da Campanha, já ouvia distribuir cargos, pastas, tachos. Foi para isto que se fez a Revolução de Abril? Para abrir espaço a umbigos e vaidades? Não me parece...
Ontem, morreu o Prof Freitas do Amaral. Desapareceram já os principais construtores da Democracia em Portugal (Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa, Francisco Sá Carneiro, Mário Soares, Álvaro Cunhal), e eu temo que, com eles, tenha morrido a essência da Democracia. No domingo irei votar. Como sempre fiz, na ideologia que defendo, sem voto útil, consciente de que, por enquanto, o voto é a única forma de podermos manifestar uma opinião. Uma desilusão também.

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

REGRESSO AO PASSADO


O passado é um lugar morto. É um momento ao qual não se volta, porque não existe mais. Ou existe? 
De certo modo, existe gravado em nós. Nas sensações, nas emoções, nos registos da memória. e é essa inexistência existente, esse paradoxo, que incomoda e fere. Carrego em mim muito passado. Porque estou a ficar velhota (ternura dos meus netos) , porque já cumpri muitos caminhos e porque deixei lá, nesse tal lugar distante, muito de mim. Há dias em que o passado se faz dolorosamente presente. Há dias, em que carrego na pele  abraços totais que já o não são, o sabor de beijos que não existem, a memória viva de quem já partiu. Há dias nos quais o presente se agita na espuma do passado. E dói. 

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

TRANSFORMAÇÃO DE PRÁTICAS

Dormi agitada, receio, sempre, que o telemóvel falhe e o despertador não toque. Tocou. Saí de casa antes das sete da manhã, envolta em nevoeiro e desejando não ser D. Sebastião . Depois de mais de duzentos quilómetros, obrigada à modernidade do meu GPS, cheguei ao mar. Era o destino para dois dias de trabalho sobre a formação e a avaliação das aprendizagens.
 O mar, forte, está lá fora mas, ainda assim, sinto a sua intensidade dentro de mim. Queria poder beber-lhe a energia. Porque,
 embora eu saiba que "Deus ao mar o perigo e o abismo deu//mas nele é que espelhou o céu", às vezes fraquejo...

sábado, 28 de setembro de 2019

CONTRASTES EM PORTUGAL

Há muitos anos que não ia ao Bussaco. Ao Palace Hotel do Bussaco, a esse lugar onde o rei D. Carlos tanto caçou, onde houve batalhas, invasões e muitos romances. Este fim de semana, a propósito de uma exposição para mim imperdível, na praia da Vagueira, fiz caminho e dormi no Bussaco. Que desilusão! Encontrei um hotel degradado, alcatifas rotas, torneiras sem funcionar, mata cheia de árvores caídas. Que tristeza! Parece ser sina deste povo a que orgulhosamente pertenço:- nunca manter, nunca conservar! Somos povo de grandes ideais e pouca manutenção dos mesmos... Dá dó andar no Bussaco, pesadelos dormir naquele palácio lindíssimo!
Do Bussaco, rumei a Vagos, Costa Nova, Aveiro, Vista Alegre. Que maravilha de lugares! Que bem preservado o ambiente, que encantadora a Igreja de Nossa Senhora da Penha de França, hoje de privados.
Pois é, o estado português não merece o património que tem a cargo. É pena...