sexta-feira, 30 de novembro de 2018

PARADOS NA ESTAÇÃO??

É comum, e creio que pacífico, encontrarmos resistência à mudança. Afinal, sairmos da nossa zona de conforto, sermos confrontados com situações que desconhecemos, desafiados para práticas que não dominamos completamente, provoca alguma ansiedade, angústia mesmo. É cómodo sabermos o que nos espera, reconhecermos os espaços e dominarmos, ainda que ilusoriamente, os contextos. No entanto, se nunca sairmos da nossa zona de conforto, se nunca nos confrontarmos com a necessária transformação de práticas, nunca evoluímos!
Penso, no silêncio da minha insónia, o que seria se, por exemplo, não tivesse aprendido a utilizar o computador e continuasse a escrever, sempre, no meu caderninho pautado... Penso, também, como poderia iludir as saudades terríveis dos meus netos, se não tivesse sido capaz de dominar a apreensão incómoda que viajar de avião sempre me provoca...
Como professora, tenho sido confrontada com mudanças frequentes. Muitas reformas, muitas alterações, muitas propostas pedagógicas e didáticas diferentes que me provocam e me tiram da minha zona de conforto. Sempre quis saber mais e experimentar. Às vezes, discordando completamente; outras vezes, envolvendo-me convicta! 
Nos últimos três anos tenho sido muito provocada e incomodada. O mundo, a esta velocidade alucinante a que vivemos, arrancou-me à minha zona de conforto e, sem aviso, colocou-me perante desafios, provocações e muitas dificuldades. Tenho consciência de estar a viver um momento histórico, o Tempo da transformação profunda do paradigma educativo. Agora, em vez de pensar "o que vou ensinar, hoje?", penso "o que vão os alunos aprender hoje? O que contribuirá para a felicidade deles o trabalho de hoje?" 
E como me preocupa a felicidade deles! 
Eu sei que mudar custa, incomoda. Mas sei, também, que é impossível ficar especado na estação vendo os comboios passar se quisermos entrar nesse amanhã que se iniciou ontem!!

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

PESSOAS TÓXICAS

Ao longo da minha vida, já longa (que ideia assustadora) , tenho-me cruzado com muitas pessoas. Algumas, para sempre ficaram comigo, ou na vida quotidiana, ou na memória, ou no espaço imenso dos meus afectos. Outras, esqueci. Outras, ainda, desejo esquecer. 
É mesmo assim! Há pessoas tóxicas que gostava de conseguir eliminar através da esterilização da minha memória. Neste grupo tóxico, incluo sempre os detentores de pequenos poderes (tão podres), e os críticos militantes, aqueles que, faça sol ou chuva, discordam e criticam. Neste ano lectivo, um ano de muitas experiências novas e imensos desafios, tenho encontrado algumas pessoas tóxicas... Eu achava que estava vacinada, afinal, venho de um ambiente de trabalho onde, com segurança e alegria, me garantiam que eu tinha anti-corpos (??), mas não estava vacinada. Ainda me chateiam as pessoas tóxicas. E quando a toxicidade se tece de ignorância, mais grave a coisa fica! 
Nunca mais é Agosto!!

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

ESCLARECIMENTO

"Escrevo não no momento da emoção, mas no momento da recordação dela" - Fernando Pessoa

A escrita é uma construção intelectual, uma forma de expressar ideias, de construir pontes e, às vezes, limpar a alma. A escrita, a minha que não faço leis, acontece no mundo da ficção, da criação, do fingimento - diria Pessoa.
No entanto, há quem insista, sempre, em ler no que escrevo condenações ou denúncias. Não o faço. Crio! Episódios, narrativas, na liberdade do meu pensar!
Tenho tido algumas (muitas) chatices com o que escrevo. Leituras torcidas, certezas alheias, acusações que considero profundamente injustas, tresleituras dos meus textos.
Talvez devesse calar-me. Mas isso seria ceder a algo que considero profundamente errado: - Viver de acordo com os juízos alheios. 
Aqui, no meu espaço, escrevo como entendo. É o meu mundo de liberdade! Tenho consciência de não ofender ninguém, tenho consciência de que penso. E sinto!
Além de todas as razões, há mais uma: - Só vem ao portugalagoia quem quer. Não entro no email de ninguém.

ESTÃO A ROUBAR-NOS A MAGIA!

Cada ano começa mais cedo o frenesim comercial do Natal. Quando eu era miúda, no dia 8 de Dezembro fazíamos o Presépio, montávamos a árvore de Natal e faziam-se as primeiras azevias. Depois, era o alucinante período de Natal, chocolates, missas, vontade de sermos bonzinhos.
Agora, começa logo em Novembro. E seria até boa, esta antecipação, se nos fizesse ser bons durante mais tempo... Enfim.
O que hoje me tira o sono é uma publicidade recorrente da Rádio. Uma criança diz à mãe que se aproxima o Natal e a senhora, alegremente, sugere escreverem a carta ao Pai Natal. A criança refila. Não! O que ela quer mesmo é ir ao JUMBO, onde há todos os brinquedos que quer.
E assim se mata a magia do Natal. Perde-se o encanto do escrever a carta, assassina-se a ansiedade de verificar quais os pedidos aceites. Os meninos escolhem, os pais compram, e o Natal reduz-se ao comércio. 
Tenho pena destes meninos e meninas a quem roubam a magia do Natal. Tenho pena destas crianças sufocadas por uma sociedade que, cada vez mais, se orienta pelo consumo, sem lugar, sem tempo nem espaço, para a essência do ser.
Só porque esta publicidade me irrita, de certeza não comprarei nada no JUMBO!

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

DAC

O que é isto que tenho no horário, um DAC? A mãe explica, é uma disciplina que ainda não começou. Vês, é nas quartas-feiras de tarde, quando tiverem professor logo começa. 

Escuto sem querer ouvir. 
O que é um DAC, afinal? No âmbito do processo de Autonomia e Flexibilidade Curricular, em letra de lei nos Decretos-Lei nºs 54 e 55, mas, sobretudo, decorrendo do Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória e da Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, propõe-se a cada escola, a cada Agrupamento de Escolas, que se olhe na sua especificidade e que, integrando-se no território em que se insere, conhecendo aqueles que a/o constituem, decidam objetivos e construam percursos. Sugere-se, ainda, que cada unidade orgânica encontre formas de ajudar os alunos a aprender mais, a aprender melhor. 
Fundamentados nas Ciências da Educação, e olhando o mundo que integramos, este mundo do séc XXI de deletes e clics, lembra-se que tudo acontece em relação, que há links entre os diferentes conhecimentos, que não é possível encaixotar conteúdos em diferentes lugares do cérebro de forma estanque e independente. Sabe-se, também, que se aprende mais e melhor quando se participa, por que a aprendizagem é um processo complexo e não linear. 
Sugere-se, então, no decreto-lei nº 55, artigo 3º, a possibilidade de se organizarem DAC (Domínios de Autonomia Curricular), áreas de confluência de trabalho interdisciplinar e ou de articulação curricular ou seja, a possibilidade de relacionar conteúdos e levar os alunos a trabalhar, e a aprender, de forma mais ativa, mais colaborativa e efetiva.
Confúcio (que o meu amigo Miguel diz ter existido só para dizer frases com sentido) , terá dito "Diz-me e eu esquecerei; mostra-me e talvez recorde; envolve-me e aprenderei". O DAC é a possibilidade de envolvimento! O DAC é a possibilidade de desenvolver aprendizagens de forma efetiva e com sentido! 
Como se avalia, perguntam. Obviamente, a avaliação é um processo e as aprendizagens avaliam-se ao longo do tempo, com a verificação do sucesso nas disciplinas que envolvem o DAC. 
O DAC não é uma disciplina. 
O DAC não tem, sequer de realizar-se ao longo de um período, menos ainda de um ano. 
O DAC não é uma coisa moderna que as escolas devem ter. 
O DAC não é uma forma de ocupar os tempos livres. 
O DAC não é um espaço para organizar feiras e exposições.
Afinal, um DAC é uma porta aberta à melhoria das aprendizagens, é a validação de uma autonomia que as escolas há muito solicitam.
Talvez fosse importante que as Associações de Pais fossem esclarecidas, que as Escolas conversassem com os pais, e com os alunos, explicando que, afinal, o que está em causa não é o caos. É, tão somente, um exercício de liberdade que visa mais e melhor aprendizagem, logo, uma sociedade mais equitativa e cidadãos mais felizes!

A MINHA FÉ

Sou, conscientemente, uma católica de trazer por casa. 
Venero o meu Cristo-Homem, a imagem que me ofereceu o Dr. Rodrigues, o senhor padre que me casou, gosto da missa de domingo na minha Sé e tenho imensas angústias. Acredito que há um Deus Pai que olha por mim, que me permite errar, me convida a fazer melhor, ouve as minhas fúrias e brinca  com as minhas alegrias. Creio em Nossa Senhora, mãe, admirando o sofrimento de quem viu morrer O Filho.
Mas, às vezes, esbarro com práticas da minha Igreja que me magoam, que não compreendo e me causam surpresa indignada. Claro que reconheço que a Igreja tem de ter regras, tem de observar normas e não pode acompanhar, sem critério, as barbaridades que alguns designam desenvolvimento social. Mas também acho que é verdade que a Igreja tem de acompanhar a realidade. E é por isso que não compreendo a razão de se exigir tanta burocracia, tanto papel, na realização de um baptismo. Afinal, Jesus Cristo foi baptizado no rio Jordão e não consta que os pais tivessem tido de mostrar a certidão de casamento, ou que os padrinhos tivessem de provar ter o crisma... Dizem-me que, se não houver rigor - papéis -, há pessoas que pedem o baptismo só pela festa. Eu sei que é verdade. E isso é grave? Que culpa tem a criança? Como se pode negar o baptismo, seja lá porque razão for? Afinal, Jesus Cristo disse "Deixai vir a mim as criancinhas!", não disse "deixar vir a mim as criancinhas cujos pais são casados e com padrinhos crismados". Ou disse?
O meu Jesus, o Deus a quem eu rezo e peço tantas vezes perdão, acolhe todos, não pede documentos a ninguém. O  meu Deus tem sempre os braços abertos num abraço muito quentinho e protector. O meu Deus acolhe quem erra, quem faz festa, quem O procura, sem pedir documentação...

terça-feira, 20 de novembro de 2018

VELHAS AMIGAS

Chuva e vento intenso, a alma (seja lá isso o que for) com a camisola cinzenta vestida, a lareira com fogo forte. A sala a cheirar bem, a leite creme queimado, a ganso estufado, a batatinhas no forno. 
E chegaram as amigas. 
Sentamo-nos à mesa e a conversa correu, como corre sempre que a amizade diz presente, feita de insignificâncias cheias de sentido. Voltaram as tardes na praceta, aqueles primeiros namoros tão intensos e promissores, as aulas no velho Liceu, agora memórias polvilhadas com as gracinhas dos netos.  O Tempo a desfiar-se, as filhas que cresceram, as saudades de braço dado com o receio do amanhã.
Ao café, o óbvio: - Estamos a ficar velhas amigas. Melhor, estamos a ficar velhas, mas jovens amigas sempre!

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Outra leitura

A- usência
M - ágoa
A - ngústia
R - estos...

Às vezes, AMAR é só isto...

domingo, 18 de novembro de 2018

CINZA

Com muita calma, ainda de camisa de dormir e com os pés gelados, ela fez o lume. Primeiro, com cautela, limpou os restos de cinza. Ah, se pudesse fazer o mesmo com os seus sentires, varrer os sentires defeitos, as cinzas de muitas desilusões resultantes de grandes fogos, ficaria mais aliviada... Depois, aproveitando as brasas que restavam, colocou a lenha. Primeiro um tronco grande, forte, para suportar o fogo, depois os mais fracos que haviam de arder primeiro. 
Nunca conseguira fazer igual, na vida. O tronco mais forte, transformara-se, excessivamente depressa, em cinza, e os mais frageis, talvez mais insignificantes, tinham também desaparecido no fogo do tempo. 
Com o aspirador sorveu toda a cinza em volta. Estava limpa e pronta,  a lareira. Ela, não. 
Sentia cinza acumulada na alma, no corpo também, e a vontade de se auto-aspirar era muita. 
Que bom seria conseguir eliminar resíduos, pós de coisa nenhuma. Sim, tanta coisa nenhuma  a fingir grande existência na sua via. Fez uma festa  ao cão, esse indiferente a cinzas e a pernas geladas, e enfiou-se na banheira  a transbordar de espuma. Tão pouco ecológico, e tão confortável... 
Lá, na sala, ouvia o lume a crepitar, as brasas tinham pegado. E na vida? Iria ela a tempo de fazer pegar o fogo da vontade de existir?

A MINHA PRIMEIRA PROFESSORA


Era uma escola antiga, daquelas a que, mais tarde, pomposamente se chamaria do Estado Novo, ainda que o estado delas fosse velho, e o Estado também… situava-se na única rua alcatroada, aquela rua /estrada que atravessava a aldeia. De um lado do edifício, gémeo, pintado das mesmas cores e com o pau da bandeira ao meio, nariz austero e ameaçador, estudavam as meninas; do outro lado, os rapazes. As professoras, de bata branca e sapatos rasos, entravam pela porta da frente, de madeira escura, forte, parecendo disposta a, diariamente, engolir a juventude das mestras. As crianças, que então se chamavam gaiatos sem a distinção por sexos que o edifício impunha, chegavam pelas nove, elas penteadas, eles de boné, carregando sacolas e, alguns mais endinheirados, pastas de cabedal que algum sapateiro jeitoso lhes fizera. Não havia toques. As senhoras professoras, que tinham um grande relógio teimoso na parede, chegavam à porta e batiam as palmas. A criançada alinhava e entrava nas salas, respeitando a ordem e procurando a carteira onde os mais pequenos, os do primeiro ano, nem chegavam com os pés ao chão.  Habitualmente, juntavam-se várias classes, até as quatro, se fosse preciso, e a professora lá ia distribuindo tarefas e orientando trabalhos. A minha sala, a sala dos rapazes embora eu fosse rapariga (hei-de explicar porquê) tinha uns enormes mapas rasgados pendurados num gancho. Era o mundo onde eu me perdia, tentando descobrir nomes de países que me pareciam tão impossíveis de alcançar como o País das Maravilhas que eu lia, à noite, num enorme livro ilustrado que uma tia me tinha oferecido.
Mas vou contar porque estava eu, menina, na sala dos rapazes. Vivia eu, então, numa cidade de província com apenas um colégio e, quando fiz seis anos, tendo aprendido a ler sem que ninguém percebesse como nem onde, foi preciso matricular-me. Então, nesse ano, o Colégio estava cheio e eu não tive vaga. Como não tinha ainda sete anos, poderia ter esperado um ano, mas eu já lia! Então, a minha mãe, que sempre foi profícua em ideias estranhas, lembrou-se de me enviar para a aldeia, todos os dias, no velho Anglia da professora Rita.
A Rita era uma professora vermelhinha, cheirando a naftalina e sabão azul, solteirona e que gostava muito de nós – de mim, e dos meus irmãos. Como, nesse ano, a Rita dava aulas no lado dos rapazes, eu lá fiquei, isolada do perigoso género masculino, estando no meio deles…, sentando-me, qual rata sábia, na secretária da professora. Lembro-me de me olharem com estranheza, de abanar os pés que não chegavam ao chão, e do cheiro de feijão com couve que a Rita levava numa marmita e aquecia num fogareiro para comigo partilhar o almoço.
Nesse ano, não tinha amigos de escola. Via-os de longe, a jogar à bola, a correr, mas a Rita nunca deixou que eu alinhasse nas brincadeiras masculinas e, assim, o meu primeiro ano, então primeira classe, foi um tempo triste, numa escola que eu nunca compreendi.
Como se não bastasse, o meu irmão chamava-me camponesa e eu, embora não percebendo o insulto, detestava a palavra que me cheirava a terra por lavrar!
Seria compreensível, creio eu, que tivesse ganhado uma profunda aversão à Escola. Mas, por razões que talvez o diabinho possa explicar, isso não aconteceu e, desde os meus tempos de camponesa, nunca mais abandonei as salas de aula…

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

REVOLTA

A voz denunciava revolta e angústia, incredulidade e tristeza também. Acabada de sair de uma reunião de conselho de turma de 11º ano, na turma da filha onde representa os pais, pedia que a ajudasse a compreender o que ouvira. E contou, cortando a paz relativa ao meu serão:
- Duas turmas de 10º ano, originaram uma turma única no 11º  e os professores continuam a falar do E e do F, como se não fosse só uma?
- Houve muitas negativas a matemática e a física, no "teste", e as senhoras professoras garantem que não sabem como alterar a situação, antecipando muito insucesso;
- Há alunos que jogam às cartas as aulas de filosofia, e a professora constata o facto...
O que acho eu, queria a mãe saber. E a minha revolta profissional a sufocar-me, a necessidade de ser correcta a impor-se. O que acho? Acho, muito sinceramente, que há professores que não o são. Acho que é urgente que as escolas revejam a sua função. Acho incrível que se continue a avaliar com a única aplicação dos testes. Acho estranho que um professor que verifica a existência de insucesso se proponha continuar a trabalhar (ou a não trabalhar?) do mesmo modo. Acho aberrante que se digam algumas coisas (graves!) impunemente e perante os pais e encarregados de educação.
O que eu acho? 
Acho que devia reformar-me já. Porque eu não QUERO fazer parte de um sistema que permite que estes absurdos aconteçam.
À mãe, com a calma possível, sugeri que apresentasse por escrito a situação à direcção da escola.
Mas mal dormi. Ser professor tem de ser bem diferente destas práticas...

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Carpe Diem

A caminho do trabalho, onde chego com a alma cada vez mais encolhida, vou olhando o cenário que integro. As cores de Outono rimam com a minha emoção, com a minha idade também, e sinto o olhar estupidamente húmido. Há, no meu caminho, tapetes fofos de folhas amarelas e vermelhas e eu penso como é estranho, absurdo, o facto de pisar no macio e sentir a dureza dos caminhos.
Este ano de 2018, finalmente a caminhar para o fim, tem-se tecido de profundas desilusões profissionais, de revoltas caladas (mais ou menos), de angústias excessivamente solitárias. Dir-me-ão que é assim a vida, que acontece a todos. Mas eu não aprendi (ainda) a aceitar tranquilamente o absurdo. Carpe diem, só Reis. Exactamente por nunca ter existido...

terça-feira, 13 de novembro de 2018

INTERRUPTOR

Há dias estranhos. 
Às vezes, parece que todas as verdades assumidas, todas as razões da Razão, todas as evidências da realidade, ficam excessivamente absurdas face ao que sentimos. Às vezes, aquelas imagens bonitas, as frases doces, tornam-se gordurosas e ocas. 
Quando isso acontece, pelo menos a mim, vem um manto de desrazão que me gela a alma. Nesses dias, ou momentos, nem sequer me apetece nada, nem ninguém, que me traga luz, que me acene com verdades lógicas, que apregoe evidências. Nesses momentos,  só o que desejo é quem se sente comigo na escuridão. Às vezes, partilhar a escuridão é-me mais necessário do que saber carregar num qualquer interruptor. 

domingo, 11 de novembro de 2018

PARIS

Embora Londres seja, sem dúvida e sem hesitação, a minha cidade preferida, adoro Paris! 
De Paris só tenho boas recordações, boas vivências, muitas leituras determinantes da minha maneira de pensar.
E vejo Paris, hoje em todos os canais, a comemorar os 100 anos da assinatura da paz. A paz numa guerra que matou 11 milhões de pessoas e deixou 6 milhões de mutilados.  
Nos 100 anos que passaram, ainda aconteceu nova guerra. Guerra de ódio, racismo, injustiça, violência. Guerra como todas as guerras: - Injusta e desnecessária. Guerra com câmaras de gás, crianças assassinadas, violência inqualificável.
Penso em tudo o que já passou (ou não), Olho os festejos e tremo. Porque eu acho que o perigo de mais guerra, o horror, a injustiça, a violência, o racismo,  não estão extintos. Continuo, com mágoa e medo, a esbarrar com a violência sobre o outro, a encontrar quem ache que pode julgar e condenar a seu bel-prazer, a conviver com seres (não pessoas, decerto) que  pisam, ferem, destroem, para seu interesse pessoal.
Dir-me-ão que sempre foi assim, desde Abel e Caim... 
Mas não é o passado que me fere. É o presente. É o amanhã que começou ontem! Talvez eu seja ingénua, talvez utópica, mas continuo acreditando que seria possível construir uma sociedade, um mundo melhor. 
Como? Ensinando a nova geração a agir de modo bem diferente! Transmitindo Valores, não feitos de falsa moral, mas tecidos de verdadeira humanidade. Tornando a Escola um espaço de partilha de diferenças, de trabalho efectivamente colaborativo, de aprendizagem real e não de aparente aquisição de conteúdos.
A Escola devia ser, no Mundo Inteiro, o laboratório da transformação social!
Vejo as comemorações em Paris, os senhores importantes de belos sobretudos e óptimos carros, muitos polícias pelas ruas, e duvido da Paz. Que paz vivemos nós se, afinal, precisamos de estar sempre a proteger-nos e a rodear-nos de armas?

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

NAS VEIAS DA EMOÇÃO

É fim-de-semana. Está a chegar o tempo que o Tempo me oferece, as horas que encomprido nos meus sonhos e utopias. No inverno, nos dias de chuva, quando me parece que o mundo acorda embrulhado em algodão, gosto da lareira, do chá na caneca que me traz afectos distantes, da roupa confortável e dos bons livros. Este mês de Novembro traz-me sempre memórias intensas. Em Novembro, há já 38 anos, nasceu o meu primeiro sobrinho,  o miúdo que, já homem e pai de filhos, ainda é o meu menino. Em Novembro, nasceu a minha Mariana. Miúda rebelde, de ternura extrema, a minha afilhada de olhos negros  vive no ninho dos meus afectos. 
E foi em Novembro que nasceu a Pessoa mais importante da minha vida: - O meu neto Manuel Bernardo! O meu primeiro neto, o miúdo inteligente, terno  e meigo, o meu rapaz inglês de curiosidade imparável.
Novembro é mesmo um mês muito especialmente único para mim! E hoje, quando o cinzento predomina e o fim-de-semana se anuncia, eu sinto Novembro a correr nas minhas veias da emoção.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Colaborar

2019 vai ser o ano nacional da colaboração. Assim, tout court, faz sentido. Até eu, que estou longe de gostar de muita gente junta, compreendo que colaborar, trabalhar em equipa, é uma forma de, quase sempre, melhorar resultados e enriquecer processos. Pessoalmente, tenho tido a sorte, quase privilégio, de integrar equipas muito boas. Na minha escola, por um ano, integrei uma equipa una, verdadeira e coesa, que me provou, uma vez mais, que é possível respeitar a individualidade de cada um e construir algo comum. Nunca vou esquecer o ano lectivo de 2017/18! 
Também já há nove anos que integro, num CFAE (Centro de Formação de Associação de Escolas), uma equipa que funciona, que partilha projectos, que se apoia e se completa nas diferentes competências. Somos cinco profissionais diferentes, nem sequer somos amigos íntimos, mas respeitamo-nos e trabalhamos de facto colaborativamente. Não tenho dúvidas em afirmar que o papel do responsável pela equipa é fundamental, porque ele é um leader, não um chefe, mas, para além dele, toda a equipa se entende e constrói sucessos, atravessando, tantas e tantas vezes, processos complexos.
Eu acredito, de facto, no trabalho colaborativo!
E é por isso que, este ano, ando tão infeliz. Porque tenho verificado que, em Portugal, há um gene de chefe que não conseguimos ultrapassar! Há o vício de tornar as equipas em rebanhos, com pastores de qualidade duvidosa. Há uma enorme dificuldade em reconhecer competências no(s) outro(s) e, por isso, vem constantemente ao de cima o vício do autoritarismo, a mania de querer ser chefe e a terrível incapacidade de ouvir e valorizar . Este ano, que precede o ano da colaboração, está a terminar, para mim, com uma experiência do que não é, nem deve ser, o trabalho colaborativo. Tenho pena. Porque podia ser tudo tão diferente, e tão melhor...

terça-feira, 6 de novembro de 2018

GINÁSIO

Quando tinha alunos do ensino básico, aí pelo oitavo ano, havia um livro que eles gostavam de ler: "Diário de um adolescente com a mania da saúde" Por causa dos alunos, fiz tanta coisa por causa deles, também li o dito livro. Tinha algum humor, alguma capacidade de brincar com o excesso e com o exagero da modernidade. Agora, sinto-me eu, às vezes, como uma adulta com a mania da saúde. Igualmente ridícula, igualmente exagerada...
Foi por causa da saúde, ah a partir dos 40 é preciso fazer exercício, a vida sedentária provoca situações terríveis, se não fizeres exercício podes ter um AVC (se te mexeres também) , que resolvi inscrever-me num ginásio.
Eu odeio desporto. Quando era miúda, no liceu, até um dedo consegui partir a tentar jogar volleyball. 
Enfim, nos meus 58 anos desiludidos, lá fui eu para o ginásio.
Já ouviram aquelas afirmações:  Sentimo-nos revigoradas; ficamos com energia para o dia; até já perdi peso; é a minha hora de lazer? Pois bem, nunca senti nada disso. 
Detesto o ginásio! Odeio suar, incomoda-me a dor de pernas e braços, sinto-me ridícula a fazer aqueles levantamentos de pesos sabendo, por antecipação, que nunca serei o Schwarzenegger. Ainda por cima, não tenho um equipamento cinco estrelas, daqueles que permitem ir ao café com ar de saúde colorida...
Mas vou continuar a ir. Porque aprendi que a esperança é a última a morrer e, quem sabe?, lá para os 80 anos, se não tiver o tal AVC antes, poderei ser uma velhota cheia de músculo!

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

A ENVELHECER

Uma constipação idiota, tão idiota que nem chega a gripe, feita de uma tosse que não me deixa sossegar há oito dias, forçou-me a ficar o fim-de-semana inteiro em casa, entre chás de limão, mel, leitura e televisão. 
Confesso que não sou muito adepta de televisão, pouco vejo, mas nestes dias, alternando com bons filmes (a Netflix é fantástica!)  vi os canais nacionais. Vi e espantei-me! 
Como é possível tanta mediocridade, tanta ausência de Valores, tanto lixo e vulgaridade?? Casa-se com quem nunca se viu? Brinca-se aos casamentos e, publicamente, discutem-se intimidades? Divulgam-se os problemas pessoais, explora-se o sofrimento físico e emocional?? Nem queria acreditar. Mas é mesmo verdade! Parece que é um conceito importado, de um caixote de lixo estrangeiro, com certeza...
Envelhecer deve ser isto: - Olhar o mundo com incompreensão e revolta!

domingo, 4 de novembro de 2018

Iémen

Quase me parece ridículo, por ser absolutamente inócuo, manifestar a minha revolta, mágoa, tristeza, medo, desilusão, raiva até, face ao que está a acontecer no Iémen. Sim, é um lugar, entre muitos, onde há guerra. Mas é mais do que isso (se é que há pior do que guerra). É um lugar onde uma criança morre, a cada dez minutos, por fome ou por doenças que facilmente podiam ser evitadas. 
Podiam ser os meus netos. Podiam ser as crianças que enchem de alegria a praceta onde moro, podiam ser os meus sobrinhos que adoro. 
A UNICEF não consegue chegar a tempo, a ONU anda "em negociações" e o sofrimento alastra. Não me saem da retina as imagens de esqueletos vivos, de enormes olhos vazios de esperança, que a televisão mostra. Lembro, também, os migrantes que tentam, com crianças, chegar aos Estados Unidos. E penso se, afinal, este século XXI, com os WebSummits e os milhões de alguns, não deveria ser designado como o século da indiferença. 
Que podemos fazer, dir-me-ão. Talvez pouco, talvez muito pouco, mas, com certeza, alguma coisa. Falar no horror, exigir acção, não aceitar como inevitável e distante esta questão. Ensinar, os que nos rodeiam, desde muito cedo, que o amor é o caminho, que a compreensão é o veículo que permite construir a equidade! 
Nas escolas portuguesas, em algumas,  desenvolvem-se competências cívicas. A revolta e a indignação são exercícios de cidadania. O silêncio e a indiferença são a arma da cobardia!

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

E DEPOIS?

Quando os meus sobrinhos muito queridos ficam comigo, o que acontece normalmente uma vez por semana, tento ir conversando e percebendo o que se passa na escola e na vida destes miúdos que adoro. 
Mais ou menos a brincar, tenho a preocupação de lhes falar de Valores, de elogiar a Beleza e de os alertar para muitas injustiças. Na sua fantástica infância, eles vão conversando. Às vezes, supreendem-se , a sério tia?, outras vezes discordam, isso não me interessa nada!, outras vezes, ainda, tentam escapar ao difícil, a minha mãe é que sabe... Ontem, numa tarde fria, com eles bem quentinhos e a televisão  ligada no canal de crianças, surgiu o anúncio de um boneco, proposta para presente de Natal, que, juro que é verdade!, tem como habilidade dar puns! Exactamente! O dito boneco dá puns sonoros! 
Fiquei entre surpreendida e indignada. Quis ouvi-los. E logo o meu rapazinho garantiu querer um boneco daqueles! Felizmente, as meninas não gostaram...
Não deixo de pensar no boneco nojento. 
Sempre tive, e continuo tendo, muito cuidado com a compra de presentes para crianças. Faço questão de não comprar armas, ou sequer bichos feios e aterradores. Acredito, como mãe, avó e educadora, que desde cedo se aprende a valorizar o Bem e a preferir o Bom. Nunca me passaria pela cabeça comprar aquele boneco mas, ainda assim, não consegui dormir em paz. 
Porque há-de haver muitos miúdos, como o pequeno B, a pedir o boneco porco. E há-de haver pais e avós a comprarem. A minha angústia vem, por isso, do depois. Como será o futuro de uma criança que cresce entre o sujo e nojento, que se diverte com porcaria?
Talvez eu esteja a exagerar e, afinal, seja apenas um brinquedo diferente. Mas, mesmo assim, fico preocupada e desiludida (mais ainda) com a sociedade que integro. Como será depois? Depois, quando os meninos e as meninas e forem homens e mulheres que adoram puns e os acham naturalmente divertidos??