quinta-feira, 22 de julho de 2021

O PRATINHO TRANSPARENTE

 Estou na piscina, mas não sou quem está na piscina. Eu estou em casa dos meus pais, tenho 14 anos, faço scones na cozinha e espero amigos que vão chegar. O meu fato de banho azul, que comprei na Vitória, tem flores amarelas e a minha mãe comprou-mo em Badajoz, porque ainda não sabe que vai haver uma Íntima na rua do Comércio. Eu estou ansiosa, acho que feliz, porque também ainda não sei que vai haver um fato de banho azul quando já não houver a minha mãe. Tenho 14 anos. Estou apaixonada pelo João, paixão eterna porque não adivinho que não vou casar com ele e ser feliz para sempre, que vai acontecer tempo de solidão e lágrimas quando eu tiver o fato de banho azul. Agora não espero ninguém. Este meu eu não me conheceu aos 14 anos, fez-se aos poucos, sem sequer pedir licença. O meu eu de 14 anos sabe que a Mena vai chegar, a Faneca também, todos os amigos vão  vir e vão olhar para o lado, ou dar um mergulho, quando eu partir para um mundo só meu e do João, porque o calor da mão dele me faz voar, porque eu amo-o desconhecendo o amanhã.

Chegam as ovelhas do vizinho, e eu não as oiço porque aqui não há ovelhas, não há vizinhos. A minha mãe não tira os scones do forno, mas eu vejo-a a separá-los, a colocá-los na cesta com o guardanapo branco, a colocar nozes de manteiga no pratinho transparente. 

Ter-se-á partido o pratinho transparente? 

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