Li, não há muito tempo, durante a
preparação para uma sessão de trabalho, mais uma entrevista à Drª Luísa Tavares
Moreira (não, não sou eu, mas tenho pena. Admiro profundamente a minha
homónima) onde ela lembrava que enquanto diretora de uma escola, via os rapazes
e raparigas saírem e entrarem pelos portões e percebia que aquela não era a
Escola de todos. Também eu senti, e pensei, e penso, isso mesmo muitas vezes.
Há escolas que são gaiolas, há escolas que dão asas. Ou, talvez com mais
propriedade, eu possa afirmar que há professores que ensinam a voar e há
outros, felizmente cada vez menos, que trancam gaiolas nem sempre sequer
douradas.
Quando eu era menina,
frequentando o então ciclo preparatório, tive um professor que me aterrorizava.
Sempre fui leitora, leitora quase compulsiva e, à época, aquele professor,
alto, nariz adunco, dedos enormes, lembrava-me sempre o conto do barbeiro
Mestre Finezas, do Manuel da Fonseca, sendo eu o infeliz Carlinhos de saias.
Juro, sem exagero, que tinha pesadelos na véspera das aulas de matemática e
que, mesmo que eu tivesse estudado, o que fazia com a mente presa no pavor, mal
entrava na aula começava a tremer. Sem grande esforço, oiço ainda a voz
nasalada, grave, daquele terrorista de almas que era o meu professor de
matemática.
No mesmo ano, tive uma professora
de francês que devia ser a personificação do sorriso, ou ter sido feita num dia
de sol radioso, pois tinha açúcar na voz e embrulhava em seda as aprendizagens.
Aprendi a cantar as conjugações, a1ª a 2ª e a 3ª, sabia dizer frases inteiras e
lia os textos com prazer. Quando, à noite, por imposição da minha mãe, preparava
os livros para o dia seguinte, era com muita alegre ansiedade que confirmava se
teria francês.
O tempo passou, porque o tempo
passa sempre ignorando ansiedades juvenis, e fui para o Liceu. Aí a matemática
já não era o Mestre Finezas, era mesmo a tesoura do dito. Resolvi arrumar o
assunto de vez e, com muito gosto, sempre que possível trocava a aula de
números e equações por uma hora de namoro nas escadas do corro, ou uma boleima
no Café Alentejano. Obviamente, os meus conhecimentos matemáticos limitam-se à
vaga ideia de que havia umas equações com um X de valor duvidoso, e uns números
de dois andares que se multiplicavam de forma complexa.
Hoje, professora também,
partilhando o desejo de uma Escola efetivamente para todos, e por isso para
cada um, procuro uma forma de ensinar a voar. De eliminar os sucedâneos do
aterrador Mestre Finezas, de fazer proliferar os professores que deixam crescer
os sorrisos.
Sim, recordo muita Escola e
parafraseio a Drª Luísa Tavares Moreira: - Temos de ser capazes de fazer uma
Escola para cada um!
ResponderEliminarBom, muito bom o texto, muito triste que ainda haja, porque ainda há quem não saiba ensinar a voar!