sexta-feira, 16 de outubro de 2020

COISAS DOS HOMENS

"Ninguém falou em troca nem em venda. Ninguém disse palavras chocantes. Mas quando se levantaram os três e se dirigiram para junto dos outros convidados para a sala grande, o espírito do Bispo estava pesado de confusão. Ele era como um homem que, envolvido num negócio que não entende bem e convencido por um hábil advogado, compra o que não quer comprar e vende o que não quer vender.

E Deus no Céu teve dó daquele Bispo porque ele estava só e perdido e não sabia lutar contra os hábeis discursos dos donos do Mundo."
in, O Jantar do Bispo, Sophia de Mello Breyner.

Às vezes, muitas vezes, os meus amigos espantam-se por eu dizer que sou católica, que tenho Fé, que vou à Missa nos domingos e que rezo. Compreendo a surpresa.
Vivemos, cada vez mais, num mundo de visibilidades, de ciência e Razão. Eu preciso de Deus. Preciso de acreditar que a minha essência não se limita à triste existência.
Sim, acredito que Deus me escuta e que me ajuda a discernir, a fazer escolhas. Que me permite errar, e conhece o perdão. O meu Deus é infinitamente BOM, não é cruel nem castigador, não me manipula porque não sou marionete, dá-me o livre arbítrio porque sou humana. O meu Deus não é a prática da Igreja porque, penso eu, a Igreja se faz de homens e, infelizmente, vive mais para eles do que para ELE.
Hoje, estou zangada, desiludida, com a Igreja.
Lembro que, pelo menos desde o séc XVI, na obra de Gil Vicente, o clero era denunciado. Fê-lo também Camões, António Vieira (O sal que não salga) , Garrett (mas frade, Deus me livre que o seja), Eça (ai o Amaro), Saramago, etc.
Recuperei Sophia, a minha poeta de eleição. para acalmar a minha enorme desilusão, revolta, mágoa, com figuras da Igreja na minha cidade. Rezo. Penso no Papa Francisco, em João Paulo II, e quero acreditar que Deus se indigna comigo.
Tenho Fé, sim! E é, talvez por aparente antinomia, Deus que me ajuda a sobreviver à maldade dos homens. Até padres, até bispos.

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