A mãe estava furiosa. Ralhava, lamentava-se, insistia em fazê-lo sentir-se profundamente infeliz. Ele tentava explicar: - A professora não dissera que tinha marcado falta! Ele nem tinha faltado! Se calhar, alegava a medo, fora por ter falado demais. Porque tem a mania de falar, de dar opiniões, de perguntar, de contar o que vê, de intervir. A mãe insistia que não. Que ninguém marca faltas a um aluno por ele falar, de mais a mais se for numa aula de línguas!! E ele insistia. Só podia ter sido por isso, ou por a setôra não gostar dele, o que não percebia, uma vez que, tal como ela, ele também torcia pelos leões, também tinha um cachecol do Sporting! E a mãe a acalmar-se finalmente, agora declarando que iria à escola falar com a directora. Não que fosse grande ideia falar com a directora... saberia da sua fama (e proveito) de tagarela e brincalhão. Mas, por outro lado, era bom que soubesse que ele não faltara e que nem sabia que tinha falta. Com a mãe mais calma, foi para o quarto, ligou o computador e a televisão e ficou em cima da cama, com os dois comandos, jogando e vendo o National Geographic. Ouvia as irmãs lá em baixo, na cozinha, e pensava na conversa que tivera com a mãe. Duas faltas injustificadas, as duas a português, era razão para ela se zangar. Honestamente, nos seus 14 anos, sabia que falava demais. Mas tinha sempre tanto para dizer... E as aulas, às vezes, eram tão chatas com o habitual cumprimento do monótono sumário: - leitura e interpretação do texto! - Seria bem melhor se houvesse mais hipóteses de participar, de falar, de trabalhar mesmo! Ouvir, tantas horas seguidas, era mesmo complicado... Estava tão distraído, que ia deixando o Porto meter um golo na baliza do Sporting! , no seu jogo da consola; se ao menos nas aulas houvesse desafios, se pudesse fazer coisas...´
Lá de baixo, veio o grito da irmã para que fosse jantar. Correu pelas escadas, saltando degraus, com a energia que o fazia ter duas faltas injustificadas por falar.
Sentado à mesa, comentou: - A escola, às vezes, é como esta sopa semanal, sabe sempre ao mesmo!!!
Eu acho que o sabor da Escola tem a ver com a panela onde é feita, com os ingredientes, com os temperos e com o tempo de cozedura. Mas, sobretudo, essencialmente sobretudo, tem a ver com a cozinheira que mexe nesse "caldeirão de sabores".
ResponderEliminarÉ a professora que dá o "sal" à "comida"... e, se a Professora é uma boa cozinheira, a sopa, cada dia, vai variando o sabor, vai sendo pedida para ser comida, vai fazendo a aprendizagem do gostar de sopa, da sopa boa que nos prepara para a vida, não da sopa que só enche a barriga e que, tantas vezes, já vem azeda da panela.