Com o final de período a chegar, cheia de avaliações para fazer e, tantas vezes, hesitando entre o 10 e o 9, entre o 13 e o 14, vêm distrair-me memórias de quando a aluna era eu!
Se havia aulas que, no velho
Liceu Nacional de Portalegre, sempre achei, como aluna, desnecessárias, eram,
sem dúvida, os lavores femininos e o canto coral. Nunca fui prendada, há quem sempre me diga que tenho duas mãos esquerdas, e a minha voz tem tal melodia que,
quando há anos tentava adormecer as minhas filhas, elas pediam-me quase chorando
que me calasse… Ora, na época, ainda não tinha consciência de que cada pessoa
aprende de sua forma, que é preciso, às vezes (quase sempre) descobrir o processo
que fará que a aprendizagem aconteça e, como eu, também os meus professores
desconheciam, creio, essas variantes. Assim, as aulas de lavores e de canto
coral eram, para mim, verdadeiras torturas. As primeiras, leccionadas pela dona Emília,
uma senhora paciente de quem muitas vezes me lembro com saudade, eram momentos em
que, vá lá saber-se porquê, eu sofria de dores violentas em todas as partes do
corpo, variando entre a cabeça e os pés, passando pelas miudezas de que o
professor de ciências ensinava os nomes. Cheguei a ter dores no diafragma o
que, obviamente, muito preocupava a dona Emília… Mas a mim preocupava-me também
a bainha do lençol de berço que deveria fazer ao longo do ano.
Perdi a conta às vezes em que a
dona Emília me enviou ao Senhor Reitor, o meu querido e saudoso Dr. Marcão,
para mostrar o insucesso do meu trabalho. Subia a escadaria de pedra, batia à
porta, e lá vinha o Dr. Marcão, era tão alto!, perguntar-me o que fazia ali.
Não me lembro, nunca, de lhe ter ouvido uma palavra azeda. Sorria e falava-me
ao coração. Mas, naquela altura (e agora também), o meu coração era surdo a
agulhas e dedais. Quando cheguei ao final de ciclo, ainda às voltas com a
bainha do lençol de berço, a dona Emília zangou-se e ameaçou dar-me negativa!
Salvou-me a minha tia Maria Luísa que, enquanto eu comia uma boleima, fez a
bainha na perfeição. Ao entregar o trabalho, a dona Emilia, contente e
vencedora, disse-me: - Vês? E sabia que tu eras capaz… Nunca mais cosi na vida.
O canto coral foi mais fácil de
resolver. No início do ano o professor Raimundo fazia uma avaliação das vozes
e, obviamente, a minha voz de cana rachada foi logo excluída. Assim, levei três
anos a, uma vez por semana, ir dizer presente à sala de aula para, depois, ir
calmamente namorar nas escadinhas da Praça da República. Devo confessar que
aprendi muito. Muito mesmo…
Agora, eu mesma professora,
revisito estas memórias e penso se, muitas vezes, não há da parte dos meus alunos
alguma (muita) razão quando manifestam a sua aversão a algumas das tarefas, que
eu acho brilhantes, que lhes proponho. Ao mesmo tempo, só espero conseguir
deixar neles a saudade terna que estes dois professores deixaram, para sempre,
no meu coração!
Luisa, só o tempo nos faz compreender! O mesmo acontecerá com os seus alunos!
ResponderEliminarÍtaca - Odisseia...
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