Guardava-o com mil cuidados, com chave, e escrevia nele os inconfessáveis, os indizíveis, os vazios, os silêncios, as ousadias e transgressões também. Um dia, perdi a chave. Perco tanta coisa... E resolvi, depois de arrombado, prendê-lo com um elástico. Segurança aparente, mas há tanta coisa aparente...
Não deixava que ninguém lesse o meu diário. Era o meu eu comigo, a minha forma de me encontrar, de, por vezes, afastar os fantasmas corporizando-os nas palavras. Ali, naquelas páginas, havia um mundo-outro, tão meu, e por isso tão do mundo também.
O meu diário vivia no fundo de uma gaveta. Saía sempre que eu precisava esvaziar sentires, procurar sentidos, ou, simplesmente, registar evidências.
O meu diário existe ainda. Em vários volumes, em cadernos que me oferecem os muitos amigos que sabem que eu gosto da escrita. Muitos não têm chave, nem sequer elástico, vivem à solta na minha casa e tornaram-se presenças no espaço que é só meu.
Às vezes, só às vezes, tenho pena que já não haja ninguém com curiosidade para espreitar o meu diário. Arrancando o elástico, ou folheando os cadernos.
Luísa, um dia, as suas netas...
ResponderEliminarAs meninas são mais dadas a diários e por isso escrevi netas!
Dalma