sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
Ímpar
Não era de porcelana, nem de loiça chinesa, nem de cristal sequer. Mas era robusta, jeitosa até, com um corpo bojudo e que se adaptava muito bem a todas as mãos. Talvez por isso, era constantemente utilizada. Pegavam-lhe para beber chá, para saborear canja ou consomé, para o leite quente antes de adormecer e até, embora raramente, como medida para fazer arroz doce. No armário, onde a depositavam bem limpa, não tinha par. Era ímpar, diziam. Não tinha já nem pires, há anos o tinham quebrado. Era uma chávena sozinha, sem meia dúzia sequer, resistente, usada, e nunca com direito a lugar de honra. Hoje mesmo, fora assim. Vira sair as chávenas finas, todas emparelhadas, pires e até açucareiro!, para a mesa da Consoada. Até os copos de pé alto, os peneirosos, tinham tido direito a carícias com pano branco, indo, depois, brilhar junto às velas da mesa natalícia. Ela, pelo contrário, ficara no canto, ignorada, esquecida. Ímpar! Porque assim, sozinha, sem par, destoava na mesa de festa e, claro, ninguém se lembrava de como era fácil de segurar quando cheia de chá gostoso...Era tão aborrecido ser ímpar!!
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Mas o facto de ser ímpar tem a vantagem de ser diferente da vulgaridade dos alinhadinhos na prateleira, a lembrar fileiras de soldados, todos iguais, na parada daquele armário.
ResponderEliminarE, por ser ímpar, não significa solidão, nem esquecimento, mas diferença. E diferença pela melhor.
É que, cheia de chá quente, ajuda a consolar a alma e aquece as mãos frias quando se aconchegam na sua forma bojuda, e os peneirosos de pé alto ou as alinhadinhas nunca a irão substituir.
Talvez, por ser ímpar, teve direito a este post... lindo!
Minha querida!
ResponderEliminarDeixo-te umas imagens do mar
Beijinhos
http://falcaodejade.blogspot.com/2010/12/entre-o-mar-e-charneca.html