De olhos fechados, estirada na cadeira dura, há quanto anos se desfizera o colchão protector?, gozava a tarde de piscina. Era uma tarde quase férias, um domingo sem história, sem data de referência, sem factos a registar. Um vento fresco corria, de vez em quando, afagando-lhe a pele, arrepiando-a um pouco num arrepio gostoso, vivo. Como companhia, o cão, que se abrigava na parca sombra da hera abandonada, e um copo de Pinot Noir, bem gelado, na mesinha baixa. Companhia era, também, o livro que nunca esquecia, hoje Torga revisitado, e o desfiar de memórias, de sonhos, que passavam na tela escura dos olhos fechados. Sempre gostara da piscina, da solidão das tardes quentes, quando podia, sozinha, nadar no esforço, às vezes bem sucedido, de afogar pensares tristes e sentires de doer. Ouvia as pedras de gelo no copo, chocando numa dança sensual, e lembrava os ritmos de que gostava, as salsas mexidas, os tangos ousados, as valsas austeras, os kizombas quentes, as mornas, por antinomia escaldantes. Pensava noutras férias, noutras tardes e outros tempos, com a certeza de que é a mente que nos mata, e não o coração! É o pensar, não o sentir, que nos ilude, que nos faz contestar o óbvio, descrer do evidente, desejar o impossível! É a mente que efabula, que exagera, e é a mente que atraiçoa a segurança dos sentires. Se ela pudesse, daria descanso à mente e deixar-se-ia ficar, na mornice dos afectos, no conforto do coração. Lera, onde?, que é o lado esquerdo do cérebro que dá nome às coisas. E desejava poder desligar esse mesmo lado esquerdo, para não saber identificar a saudade, reconhecer o desejo, ou nomear a ausência.
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