Nos tempos do farwest, dos cowboys
e dos índios, a América era um lugar distante, feito de pradarias a perder de
vista, de desfiladeiros assustadores e de muito cheiro a pólvora. Os
cavaleiros, todos muito machos e cheirando a animália, salvavam as donzelas que,
invariavelmente, amavam depois desesperadamente. Mais tarde, a América
corporizou sonhos de liberdade, construiu-se no imaginário colectivo como o
lugar de todos os possíveis, como a terra da igualdade, como o mundo onde, a
par das estrelas de Hollywood, os comuns mortais conseguiam fazer da vida o que
o desejo lhes pedia.
Na América, um dia, um negro teve
um sonho. Foi morto por esse sonho de igualdade mas, depois de Martin Luther
King, o mundo, mesmo fora da América, não voltou a ser o mesmo.
O mundo, essa
bola amachucada, elíptica e absurdamente
perigosa, continuou rodando e, de repente, a América surgiu poderosa e
dominadora. Podia tudo, ou quase. Veio à Europa para ajudar a terminar a II
Grande Guerra, foi morrer para o Vietname e, mais recentemente, invadiu países
fazendo guerra. Para alguns, a América é o perigo, o materialismo no que ele
tem de pior, a ganância e a violência. Para outros, como para mim, a América é
a possibilidade de sonhar, é a diferença, é a oportunidade de uma vida
diferente.
A vitória de Obama, uma vez mais, veio materializar a diferença
americana. É jovem, é negro, não pertence a um clã dominador. Mas tem um sonho,
tem vontade, tem convicções e não desiste da mudança. Este homem não faz
milagres e, por isso, é também fortemente condenado. Mas é também por isso que
o admiro. Gosto da alegria deste americano poderoso, da forma ágil como sobe as
escadas dos aviões, do sorriso pronto, do andar elástico, do olhar profundo.
No estado em que se encontra o
meu país, quando não há uma ideia com sentido, a tristeza domina, a depressão é
colectiva, as vozes são dolorosamente monocórdicas e os governantes se apresentam envelhecidos,
curvados e cinzentos, fico com alguma inveja dos americanos. Porque Obama não
vai resolver todos os problemas, não vai fazer felizes todas as pessoas, mas
vai, tenho a certeza, dar confiança à maioria, revitalizar o povo e devolver a
muitos a esperança num futuro que tem de ser possível.
Hoje, gostaria que um
dos nossos cinzentíssimos dirigentes, um só (não peço muito) reparasse que fazer
diferente é possível, que continuar a colocar números à frente de pessoas a
nada leva, que Portugal merece recuperar o sorriso e a cor com que se deve,
creio eu, pintar o quotidiano.
Se, de repente, um Ministro
Português, um qualquer, viesse a público sorrir, propor medidas de fazer e não
de destruir, sugerir crescimento em vez de empobrecimento, emprego em vez de
miséria, quero crer que Portugal faria eco das palavras de Obama e gritaria:- Sim,
nós podemos!