A cozinha enchia-se de caixas, havia um cheiro intenso no ar, a minha avó vestia um enorme avental e a empregada ficava com os dedos calejados. O chão da cozinha estava escorregadio, nas janelas escorriam lágrimas de chuva. Os dias acinzentavam-se, a noite chegava mais cedo e começava a época da lareira. Começava, também, a minha estação preferida! Eram os marmelos, que caíam dos velhos marmeleiros gordos e pesados, que anunciavam a chegada do Outono da minha infância. A minha mãe orgulhava-se da sua marmelada, bem clarinha, capaz de desenformar logo às 24 horas, e eu adorava comê-la com maçãs de Bravo de Esmolfe. São paladares vividos que nunca esquecerei! Podem roubar-me o ordenado, destruir-me o quotidiano, estilhaçarem-me os sonhos, mas as memórias, essas são o meu património mais rico. São mesmo minhas! E são o que me vale quando os dias doem demais, quando a ternura foge e a solidão se instala.
Ontem, dia de muita chuva a doer por dentro, a marmelada fez-me voltar às memórias.
Foi-me oferecida embrulhada em carinho, num tupperware dos antigos, com recomendações e desculpas.
Ontem, dia de muita chuva a doer por dentro, a marmelada fez-me voltar às memórias.
Foi-me oferecida embrulhada em carinho, num tupperware dos antigos, com recomendações e desculpas.
Era uma gracinha, diziam os olhos brilhantes, os gestos rápidos, a voz despachada da minha aluna Patrícia. Para a professora pôr no seu blog... E eu tirei a marmelada da caixinha, reparei como estava brilhante, e saboreei-a com deleite. A marmelada oferecida adoçou a minha tarde, interrompeu a minha solidão e coloriu o negro que me envolve.
Agora, vou devolver a caixinha e fazer render a marmelada. É que, cada vez mais, a existência (a minha) se faz de muitos amargos sensaborões...
...humm..., que bom! -É com estes textos de "Outono" que eu me delicio ao pequeno almoço...
ResponderEliminarPela cor, a marmelada está no ponto!
Também adoro... Porém, depois fico com um certo remorso pois nunca me fico por uma tosta com um bocadinho, como mostra na fotografia!
ResponderEliminarE no fim do inverno lá estão mais uns centímetros onde não deviam!
É o tempo dela... e dos marmelos, das castanhas, dos dióspiros, das romãs, dos medronhos... os frutos de Outono que enchem de inspiração os poetas e de deleite os apreciadores...
ResponderEliminarAinda bem que gostou professora, para o ano há mais :P Espero que que lhe tenha alegrado a tarde, e sobretudo que enquanto a estivesse a comer se tenha lembrado aqui da sua reguila aluna. Obrigada por me aturar todas as semanas, beijinhos Patricia
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