Mais uma vez, partia em viagem. Fazia-o com frequência, sempre procurando ajudar os países mais pobres, sempre querendo ouvir e dar colo aos mais fracos. Estivera na Índia, no Islão, na Síria, em muitos países africanos e, agora, chegava à América latina. Para ajudar trazia, apenas, a sua competência de médico aliada a uma rede de contactos que lhe permitia, com relativa facilidade, desnudar hipocrisias sociais e políticas. Se tinha medo, perguntavam-lhe muitas vezes. E admitia que sim. Muito medo! Não medo de balas perdidas, de facadas desesperadas, mas medo, medo até físico, de verdades totais e cimentadas em vazios absolutos. Temia aqueles que sempre opinavam, que sempre criticavam, que constantemente apontavam o dedo como se fossem detentores de uma razão desumana e, por antinomia, irracional. Esses, os que sempre viviam julgando e condenando, assustavam-no. Muito! Porque os conhecia de sempre, de antes de ter iniciado a sua peregrinação pelos mais fracos, de quando era casado, tributável e tido como responsável. Um dia, à verdade dos outros, decidira voltar costas e, agora, percebia como o mundo seria mais fácil, mais humano, sem dúvida mais terno, se, em vez de condenação constante, vigorasse a compreensão. Qual é a verdade do faminto que rouba pão? O crime? Qual é a verdade da mulher sozinha que procura protecção masculina? A condenação? Qual é a verdade do homem poderoso que compra filet mignon para alimentar os cães treinados que o protegem? A glória?!
Ao sair do avião sentiu a força do vento quente, a humidade do ar a colar-lhe a camisa`ao corpo. Ia começar uma nova jornada...
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