Era sempre assim. No seu caso, escritor viajante, a verdade popular vingava- o hábito não fazia o monge - e sempre lhe custava dormir em camas de hotel. Dormia fora de casa muitas vezes, se fizesse uma estatística, prática tão em moda, concluiria que, de certeza, seria superior a percentagem de noites passadas em camas estranhas. Mas, ainda assim, nas primeiras noites (que às vezes eram únicas) não conseguia que o sono chegasse retemperador. E ali estava, de novo, ouvindo o mar ao longe, com a janela aberta, esperando o dia e revendo a vida. Lembrava-se das noites dormidas no deserto, da fogueira enorme, do céu luminoso e incrível, do frio que, subitamente, sucedia ao calor do dia. Decerto as noites no deserto eram especiais. Para ele, eram as noites onde agradecia aos deuses a insónia longa.
Hoje, o mar substituia a areia, o céu era outro, os ruídos também. Resistindo ao cigarro, tinha mesmo deixado de fumar, foi até à varanda. Ao longe, lá em baixo, circulavam ainda carros, os últimos da noite, adivinhando-se gargalhadas e boa disposição. Um vento leve, morno, abraçava-o trazendo-lhe lembranças de outros abraços... Mas não queria cair na nostalgia e não ia deixar-se levar por saudades impossíveis. É que, muitas vezes, há saudades impossíveis.
Muito bonito! Gostei mesmo! beijinhos
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