segunda-feira, 28 de abril de 2014

Lugares

Tinham acordado a hora e o local. Seria ali, junto à ribeira, na hora que ela sempre dizia ser o tempo do mundo respirar fundo. Ela chegou primeiro, com calma, numa tranquilidade conseguida pela desistência assumida: - Quem nada quer, nada perde. E ela não queria nada, já. Quisera tudo! Com força, com entrega e exagero. Tinha lutado pela ternura, pela cumplicidade, pela partilha efectiva. Tinha pedido presença, combatendo ausências. Gritara o Tempo que via esgotar-se, mas sem êxito. 
Hoje, olhava a ribeira e pensava que também a vida, a dela, era apenas um reflexo de ilusão no espelho da realidade. Conhecia bem aquele espaço. Era o lugar onde, filhos pequenos, fazia pic-nics divertidos, caminhadas revigorantes, tardes  de lazer com um bom livro por única companhia. Agora, seria o cenário do adeus. Sem mágoa, sem ódio, sem insultos nem arrependimentos. Apenas, pensava, o ponto final numa narrativa nunca escrita a quatro mãos.
Ouviu o carro dele chegar e viu-o caminhar, decidido e elástico, pela escada de pedra. Era tão lindo ainda!

2 comentários:

  1. Se fosses organizando estes pedaços de narrativas, num instante tinhas um novo livro! Eu compro meia dúzia!!
    Lena

    ResponderEliminar
  2. Embora cruzado por tristeza, é um texto fantástico!
    Fernando

    ResponderEliminar