Sei bem, acho que sabemos todos, que a perfeição não existe. É um pouco como a felicidade que, tirando a senhora que vende fruta no Mercado Municipal, só acontece em instantâneos. A perfeição é aquilo que sonhamos, ou talvez nem isso. Ou talvez nem sempre isso, porque eu não sonho com a perfeição. Sonho com a capacidade de compreender, e de aceitar, os incompletos, os erros, a possibilidade de fazer melhor. Se a perfeição acontecesse, acho que iria morrer de tédio. Perderia o direito ao pasmo, a oportunidade de ganhar um novo dia, o privilégio do refazer.
Defino o ser humano como imperfeito e, talvez por isso, surpreende-me a mania que existe de querermos sempre condenar actos alheios, de os avaliar, de os catalogar, de os definir, de lhes sentenciar uma chegada certa ao inferno, como se esperassemos que fossem perfeitos. Como se nós fossemos perfeitos!
Oiço a noite. Há luar, há estrelas, a temperatura desceu e posso abrir a janela. Os cães dormem serenos, olharam-me e voltaram a adormecer sem me condenarem a hora tardia a que abro a janela. Corre vento que provoca o ramalhar indignado da nogueira, lembrando-me que nem a noite é perfeita.
Eu não quero a perfeição, não quero ganhar um lugar num altar, não quero a veneração. Mas, no entanto, quero, ah como quero!, sentir em mim a paz da noite estrelada, o afago forte do vento, a protecção dos ramos cerrados da minha nogueira, o poder de esquecer dos pardais a quem destroem os ninhos.
A perfeição surge sempre que nos sentimos em paz, quando a vida corre doce no nosso viver, quando o afago do vento e de um abraço nos dão serenidade, quando sentimos o entendimento a estreitar relações, quando nos satisfazemos com o crescer sadio de uma criança, quando flutuamos na sensualidade do amor, quando acordamos de mãos dadas e espíritos entendidos, quando sorrimos a mais um dia que nos completa...
ResponderEliminarObrigado por mais este seu pedaço de poesia.
Cumprimentos.
Minha mãe querida,
ResponderEliminarPara mim já és perfeita! Sempre o foste!
Quando dizes: "Sonho com a capacidade de compreender, e de aceitar, os incompletos, os erros, a possibilidade de fazer melhor. " não estarás a aspirar à perfeição? Mas uma perfeição como só tu poderias desejar: em favor dos outros!
Não compreendas, não aceites, não faças nada melhor. Experimenta esta receita e deixa que sejam os outros a fazer um esforço por se tornarem menos imperfeitos!
Adoro-te
Filipa
Às vezes acontece a perfeição. A mim essa noite parece-me perfeita...
ResponderEliminarE este texto também.
Um abraço
Também penso o mesmo: há momentos perfeitos, as pessoas não o são nem serão nunca. Ou, então, por momentos.
ResponderEliminarA Filipa tem razão...
Mas a noite de que falas é linda e eu imagino-a. São as noites na nossa Serra. São as noites de Verão de sempre. Ouço as folhas da tua nogueira.
E vejo os teus cães como tu falas deles.
Como vai o Buda?