sábado, 28 de março de 2020

FINGIR

Será legítimo ser-se conscientemente cobarde? Será admissível ser-se conscientemente avestruz? É assim que me sinto. Não vejo televisão, não quero saber das notícias do Covid-19, não quero saber qual a percentagem de mortes e infectados. Não quero! Como a avestruz, meto a cabeça na areia, ignoro o mundo e faço de conta. Finjo que estou em férias, que são só uns dias diferentes, que, afinal, há muito que precisava de uns dias para parar e descansar. Leio. Leio muito, caminho no quintal e vejo bons filmes. Às vezes, acendo a lareira, gosto do cheiro do fogo, da companhia das chamas. Olho o céu, ignoro a inexistência dos rastos dos aviões e finjo acreditar que, não tarda, os meus netos vão chegar, as gargalhadas vão encher o espaço e eu vou rir de novo.

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