quarta-feira, 24 de setembro de 2014

SVEVA

Sempre que encontro um livro da Sveva Casati Modignani, não resisto a comprá-lo. Depois, não páro enquanto não chego ao fim e, a seguir, fico muito tempo a partilhar serões com as personagens, a reler passagens, lamentando ter terminado o tempo da ficção libertadora.
Lembro-me muito bem de todas as histórias, gosto da escrita correcta, dos diálogos bem construídos, das muitas mensagens não escritas mas claras e ternas. 
Nos livros da Sveva há sempre personagens masculinas perfeitas! São homens completos, lindos, másculos, amigos, compreensivos, misteriosos. São homens presentes, capazes de gestos espantosamente banais e raros, como oferecer uma rosa ou ajudar a vestir um casaco, e cheiram sempre maravilhosamente. No último livro dela, A Família Sogliano, conhecemos um Eduardo tão fascinante que até morre decentemente e sem espectáculo! A este Eduardo perdoamos, nós mulheres, o filho de uma traição... Eu acabei de ler o livro, que comprei há três dias, e não consigo deixar de pensar nesta personagem. Ai, quem me dera ser eu uma personagem das de Sveva!

terça-feira, 23 de setembro de 2014

BLOGUES

Esta coisa dos blogues, da blogosfera,da internet, é estranha. 
De facto, de que serve a gente (neste caso eu) ligar o computador e sacudir a alma? O que interessa ao outro, leitor, o que cada um sente? Objectivamente, nada. Mas, para além da fria objectividade, talvez se teçam lados, talvez se criem identidades.
Quando me gozam, ou ridicularizam, por continuar a alimentar o meu blogue, penso que, se calhar, têm razão. Ou, se calhar, não... Porque esta janela, que se abre silenciosa para o mundo, sabe receber, ouvir e guardar como poucas pessoas. É um espaço que, ainda que público, nos/me oferece alguma privacidade. E, além disso, o hábito de conversar, ou o tempo para se conversar, vai escasseando e o ecrã permite, num bocadinho, despejar a alma... 
Eu hoje preciso mesmo de despejar a alma. Se a dor dilacera, eu estou em pedaços.  Evoco Sophia porque, hoje, não é a minha alma que é feita de maresia, é a minha existência que é sargaço apenas!


A PAZ SEM VENCEDOR E SEM VENCIDOS

Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.

Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Erguei o nosso ser à transparência
Para podermos ler melhor a vida

Para entendermos vosso mandamento
Para que venha a nós o vosso reino
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Fazei Senhor que a paz seja de todos

Dai-nos a paz que nasce da verdade
Dai-nos a paz que nasce da justiça
Dai-nos a paz chamada liberdade
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Sophia de Mello Breyner

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

PORTALEGRE

Sempre que posso, quando o tempo não me persegue em fúria danada, gosto de caminhar pela minha cidade. Apesar de estar abandonada, ainda que não tenha centros comerciais, mesmo sem engarrafamentos, apesar de não permitir o anonimato que alguns desejam, eu adoro a minha cidade. Em cada canto, a cada olhar, há algo que me parece surpreendentemente belo. Hoje, de manhã, fui tomar a bica ao meu lugar de eleição, Sons e Sabores. Depois, vim passeando, passei na Corredoura e fiquei com os olhos pregados na entrada da nossa Câmara Municipal. A alpendrada sempre me comove! Olhei, fotografei e fiquei pensando que, haja o que houver, dê o mundo as reviravoltas que der, esta cidade é o ninho dos meus afectos, é o espaço da minha identidade!

domingo, 14 de setembro de 2014

O CARROSSEL

Quando eu era miúda, as Feiras, em Portalegre, aconteciam no espaço onde hoje está a Segurança Social (por acaso nada Segura e pouco Social...), ali na Praça João Paulo II, bem perto da minha casa. A Feira acontecia duas vezes por ano: - Em Junho, a das Cerejas; em Setembro, a das cebolas. Em Junho ainda havia aulas, era preciso ser hábil na gestão do tempo... Mas, em Setembro, as aulas ainda não tinham começado e, por isso, a partir das cinco ou sei da tarde a Feira era lugar de encontro. O meu Pai fazia-nos prometer que não andávamos de carrinhos de choque nem de aviões (tinha morrido um jovem num avião que se soltara) e eu prometia transgredindo sempre. Os carrinhos de choque não me encantavam, não gostava do cheiro, ainda hoje tenho a mania dos cheiros, mas os aviões deliciavam-me. 
Entrar naquelas maquinetas, rodopiar com os cabelos ao vento, saltar lá dentro era uma experiência única! No entanto, era o Carrossel "uma voltinha uma voltarela para a menina da saia amarela"/"A avozinha não paga, mas também não anda" o que mais me agradava. Adorava a girafa e a roda. Entrava na roda com as amigas, girávamos a alta velocidade e saímos de lá com os cabelos emaranhados, as saias revoltas e as bochechas rosadas.
Depois, um dia, a Feira saiu da cidade e eu cresci. Parecia que já não tinha idade para a roda, menos ainda para a girafa... Como a Feira era longe, esqueci-me de como era bom andar de Carrossel! Este fim-de-semana dei comigo numa Feira de verdade, como as da minha infância, lá no Minho, em Ponte de Lima. Fosse porque o ambiente exigia, fosse porque ninguém me conhecia, fosse mesmo porque a saudade era muita, fosse porque tinha o pretexto da minha neta, peguei nela e voltei ao Carrossel grande. Lá estavam as girafas, as rodas, os cavalos tentadores... Mas eu tive juízo, escolhi o banco e, com a Constança ao colo, subi e desci nas ondas do tempo, nas memórias e nos desejos. É tão bom andar de Carrossel!

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

GOSTOS E (DES)GOSTOS

Não gosto de certezas alheias
Não gosto de ternuras adiadas
Não gosto de sonhos emprestados
Não gosto da solidão por companhia
Não gosto de palavras agudas
Não gosto de ódios protegidos
Não gosto de encontros adiados
Não gosto de presenças ausentes
Não gosto da crítica cortante

MAS

Gosto do abraço quente
Gosto do silêncio ouvinte
Gosto do olhar cúmplice
Gosto de presenças desejadas
Gosto de prioridades afectivas
Gosto de sorrisos reais
Gosto de palavras doces
Gosto de ombros disponíveis
Gosto de dúvidas partilhadas
Gosto de romper impossíveis
Gosto de rasgar horizontes
Gosto de compreender sem palavras
Gosto de olhares leitores
Gosto de bons dias sorridentes
Gosto de boas noites entrelaçadas
Gosto de fugas sem aviso
Gosto de partidas sem adeus
Gosto de colo
Gosto de mimo
Gosto de partilhas de talheres
Gosto de construções de partilha

Afinal,
Tenho muito mais gostos, do que (des)gostos! Tenho de me lembrar disto mais vezes...

terça-feira, 9 de setembro de 2014

GUERRAS INSEGURAS E DE COSTAS

Não sou do PS. Não sou de esquerda, embora ache, às vezes, alguma piada a teorias por essa área apresentadas. No entanto, como sou pessoa, e como tenho o azar de viver em Portugal, tenho esbarrado com as guerras do PS nacional: - Seguro (porventura um dos mais inseguros que tenho visto), contra Costa. A maioria dos socialistas que conheço defende Costa. É um político mais experiente, dizem, e eu fico pensando o que quererá isso dizer... Gostam mais dele, é mais adulto, tem o apoio dos mais velhos, qual na Grécia Antiga os senadores têm peso, é mais consistente. 
Eu até concordo. 
Embora de fora, vejo o Tó Zé como um seminarista em férias, sem consistência e sem norte. Mas tenho pena dele, coitado. O homenzinho até ja perdeu a voz.. E deve ser duro ser maltratado por quase todos, ele que serviu o Partido no momento em que ninguém queria dar a cara. 
O Dr. Costa, que se manteve planando por cima, desceu agora, quando achou que o terreno era seguro e a presa era fácil. Desceu dos céus em voo picado e aí está, sorridente e feliz, cheio de si mesmo, propondo já confrontar-se com Rui Rio. Eu pasmo! O que tem de facto António Costa que justifique tanta confiança e entusiasmo? Olho com surpresa este frenesim em torno do PS e, no silêncio meu, desejo que empatem e que continuem a guerrear-se para que o país continue a ter algo que o faça distrair-se da realidade...

domingo, 7 de setembro de 2014

PERDÃO

Gosto de ir à missa, nos domingos. Gosto do tempo de reflexão, de alguma paz, de luz filtrada. Hoje, falava-se de perdão. Da necessidade de sabermos desculpar, de não julgarmos, de aceitarmos a diferença e a singularidade também. Ouvia, no banco da minha Sé de Portalegre, e pensava no quão longe estou da realização do perdão. Queria ser capaz de perdoar também, de eliminar os pequenos ódios, de aceitar e compreender as diferenças. Mas também queria poder ser perdoada e compreendida. Tenho tanto porque pedir perdão, tenho tanta incompreensão a pedir compreensão!

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O 1º DIA

Bem cedo, no país distante, o meu neto vestiu o uniforme e fez-se à escola. É uma nova fase, determinante, que agora começa e, para mim avó, é cedo demais... O meu neto mais crescido só tem 4 anos, é um quase-bebé, e vai começar a aprender a ler, a conhecer o fascínio de saber e de compreender, a desenvolver as necessárias competências para viver em sociedade. O meu Manuel Bernardo vai deixar o colo da mãe, a quentura do ninho, e vai iniciar o voo que, desejo eu, o levará a altos céus! Hoje, bem cedo, imaginei o meu menino (será sempre o meu menino) a entrar na nova etapa da vida. Sei que crescer dói mas, hoje, desejo que doa mais aos pais e aos avós do que ao meu menino. 
A preparar o meu ano lectivo, sonhando actividades capazes de encantar os meus meninos crescidos, penso ainda no meu neto. Sei que em Inglaterra tudo é diferente, que se valoriza o ensino colaborativo, que se trabalha por objectivos e perfis de desempenho, que há turmas por nível de competência. Aqui, neste Portugal cinzento, ainda se segue o modelo da escola do século XIX embora estejamos no século XXI... Enfim, sorte tem o Manuel Bernardo... 
Hoje, é nele que penso. Estava lindo no seu uniforme escolar, com os caracóis loiros e o olhar escuro carregado de curiosidade!

terça-feira, 2 de setembro de 2014

SETEMBRO

Chegou ao fim o intervalo na realidade. Terminou o tempo longe da rotina, ignorando problemas, olhando estupidamente a aparente calma como se fosse realidade. Por alguma razão se chama a esta época "silly season"...Setembro, apesar de ter chegado quente demais para o meu gosto, lança sempre um balde água gelada (sem direito a donativos) na minha vontade de viver. O meu coração, embora eu o ache enorme, está partido em pedaços e, ao contrário do do Poeta, não foi a criada descuidada que o deixou cair pela escada abaixo. Cada partida de seres importantes levou um pedaço de mim e, agora, só me restou um farrapito para encarar a vida possível. 
Setembro devolveu-me os medos apavorados do amanhã, o susto do futuro negro, a solidão do amanhecer. Agora, com o vento quente a soprar lá fora, com o corpo da cor castanha do bem-estar que já não é, começo a desejar a chegada do Natal...