terça-feira, 31 de maio de 2016

O Senhor Andrade

Foi pela mão deste Amigo que entrei no CDS. Era um Amigo muito especial, rigoroso no carinho que esbanjava, com um sentido de humor único, sempre disponível para ajudar, aconselhar, ralhar se preciso... Um dia, num congresso do CDS, ainda era Presidente o Dr. Manuel Monteiro, levei-o a comer pizzas. Foi uma aventura! Vem um homem de tão longe para comer massa com pasta, dizia, rindo. Outra vez, no carro dele e comigo ao volante, lá fomos os dois a caminho de Leiria. Chovia torrencialmente, trovejava e, no regresso, eu voava baixinho. Ele, aparentemente muito calmo, perguntou-me a dada altura : Vamos assim depressa para, morrendo, entrarmos logo no céu, não é?" Claro que abrandei logo a velocidade...
Depois, os dois fomos ameaçados de expulsão do nosso Partido porque ousamos discordar da liderança. Eu achava divertido ser expulsa. Ele, revoltado, garantia que devíamos pedir a demissão porque nunca ninguém o expulsaria de nenhum lugar. Enviamos os cartões e ficámos, os dois, lamentando estar longe da possibilidade de intervenção. O CDS era, sempre, tema de conversa entre nós e os ideais que nos uniam fizeram-nos cúmplices de muitas vivências.
Hoje, o meu Amigo senhor Andrade entrou, de certeza, no céu. Eu sei que ele se está a rir das minhas memórias e oiço-o dizer, a rir como só ele sabia, que ainda se lembra da sopa de peixe comida na Sertã!
Tenho já muitas saudades do senhor Andrade! E quero que toda a gente saiba que ele era um Homem Excepcional. Um homem que ficava com os olhos brilhantes quando falava de Angola, de Moçâmedes e das caçadas. Era um homem justo, verdadeiro e nobre. O senhor Andrade, que tanto adorava Santo António das Areias, vai continuar vivo na minha memória, no meu gostar muito, nos meus sentires. Obrigada, meu Amigo pelo tempo que passou comigo!

Ele há coisas

Vivemos num mundo estranho. Bom, talvez o mundo seja, apenas, um lugar estranho, independentemente de quem o habite. Estranho na forma de existir, de ser, de morrer até... 
Vivemos a necessitar de outros  e, paradoxalmente, a sofrer por outros, deixando, por vezes, que cada eu se aniquile, se dilua. Se decidimos gostar de nós, preocuparmo-nos com a nossa paz e tranquilidade, logo nos apelidam de egoístas. 
No entanto, acho eu (que gosto muito de achar...) é fundamental que estejamos bem connosco mesmos para podermos aceitar o outro, ou os outros. E fundamental é também, continuo eu a achar, preservarmo-nos das pessoas que nos fazem mal. Porque, nesta confusão que é o ser humano, nesta complexidade tecida de paradoxos, às vezes acontece gostarmos de quem nos fere! Ele há coisas...

sábado, 28 de maio de 2016

BRAGA

Braga é uma cidade curiosa. Um espaço requalificado, cheio de animação, de gente jovem e de muitos monumentos a provar uma história longa e rica. Gosto muito de ir a Braga, de passear nas ruas floridas, de me sentar nas muitas esplanadas que enchem as ruas de pedra. Este fim-de-semana, uma vez mais, andei pela cidade do Minho e, por sorte, mergulhei numa muito rica feira romana. Se as bruxas e as gárgulas assustaram a minha neta Constança, a mim houve uma situação que me apavorou e que, ainda por cima, não se relaciona apenas com reconstruções históricas.
Devo confessar que a minha fé não é tão forte como eu desejaria. No entanto, sempre que vejo uma igreja, gosto de entrar, de me sentar um pouco e de rezar à minha moda, num diálogo talvez excessivamente informal com o Cristo Homem. Ora, passando à porta da Sé de Braga decidi cumprir o meu ritual. Dei a mão à Constança e disse-lhe que íamos entrar um bocadinho na casa do Jesus. Íamos, mas não fomos. Porque, à porta, pediram-me três euros e meio para entrar. Em vão expliquei que não queria fazer uma visita, tão só rezar um pouco com a minha neta. De nada serviram os meus argumentos de católica, ou mesmo de cidadã. Na Sé de Braga só se entra pagando! Fiquei tão indignada, que nem perguntei se para assistir à missa também se tem de pagar.
Jesus Cristo expulsou os vendilhões do Templo, mas não foi suficientemente eficaz! Ou, se calhar, os vendilhões de agora já nem reconhecem um Templo...

terça-feira, 24 de maio de 2016

AS HISTÓRIAS

Levamos, todos, a vida a tecer narrativas. Contamos histórias sobre pequenos factos do quotidiano, fazemos narrativas mais ou menos empolgadas sobre o que enche o nosso tempo e, até sem darmos por isso, construimos personagens pluralmente significativas. Contamos histórias até a nós próprimos, cada vez que, por exemplo, recuperamos uma memória!
No fundo, vivemos desempenhando papéis, desfiando cenários, construindo enredos... Mas, ainda que, às vezes, eu tenha efectiva consciência deste vício narrativo, ainda há histórias que me impressionam.
Impressiona-me, por exemplo, a ligeireza com que, frequentemente, oiço narrativas absurdas para justificar falhas e erros. O gosto de manter o absurdo, em vez da humildade de o corrigir, dá origem a fantásticas histórias que, não sendo de faz de conta, tornam o dito até real...
Coisas que, às vezes, me acontecem. Só a mim, com certeza...

segunda-feira, 23 de maio de 2016

DIA DO CONCELHO

23 de Maio é o dia da cidade. Portalegre veste-se de amarelo e negro, o jardim enche-se de gente e a festa acontece. Este ano, acho eu, a festa tem cumprido os objectivos: - As pessoas saem à rua, há música, há gente bem disposta e o São Pedro nem sequer mandou chuvinha. Claro que discordo da instalação dos carrosséis mesmo em frente da Escola Secundária, mas paciência, o óptimo é inimigo do bom.
Estas festas do concelho implicam, sempre, entrega de medalhas da cidade, homenagens e elogios. E eu acho muito bem! Cada vez mais, acho fundamental que se usem palavras BOAS, que se elogie, em vez de criticar, que se apoie, em vez de se condenar. Os homenageados merecem, todos, os louvores recebidos!
Fui ver as festas e senti-me bem. Não são, com certeza, as Festas de Viseu ou o São João do Porto, mas são festas à nossa medida, com as nossas gentes e as nossas possibilidades. Especial mesmo, e impossível ignorar, foi o momento de Dança Com a Cidade. Se a Escola Silvina Candeias está de parabéns (e está!) pela iniciativa, os corajosos convidados merecem um enorme aplauso. Sem complexos, indiferentes ao rigor dos  passos de dança, despretensiosamente, encheram de alegria o palco da corredoura e deliciaram quem os foi ver. Há muita gente que gosta de dizer mal dos portalegrenses mas, este ano, os lagóias (e os que a cidade adoptou não sendo lagóias) mostraram que são Gente BOA !!

quarta-feira, 18 de maio de 2016

PODER(ES)

A língua portuguesa, cada vez mais a minha verdadeira Pátria, tem mistérios e/ou coincidências que, creio eu, não o são de facto. As palavras poder e podre, por exemplo, escrevem-se com exactamente as mesmas letras.
De facto, a leve metátese numa, define o essencial da outra. E o poder, sobretudo o pequenino poder, traz à nossa existência muitas chatices e inconvenientes. Os pequeninos poderosos, aqueles que nem sequer tiveram de se submeter a um sufrágio, julgam crescer na exacta medida da afirmação do seu poderzinho e, vai daí, destratam e incomodam arbitrariamente.
E eu detesto as ocasiões em que o podre vira poder. Ou será ao contrário?

terça-feira, 17 de maio de 2016

SUCESSO ESCOLAR

Nos últimos dias, ou nos últimos (longos) tempos..., tenho lido, pensado, ouvido, trabalhado muito sobre o sucesso escolar. Talvez, admito, devesse tê-lo feito há já muito tempo, afinal sou professora há 32 anos, mas andava preocupada em ensinar português, em falar de literatura, em ajudar a aprender gramática e a construir pessoas.  Para mim, o sucesso era dar poucas negativas e, confesso, ver os meus miúdos felizes. Agora, o assunto parece-me bem mais complicado!
Afinal, há muitos "sucessos educativos"! Há o que se mede com os exames, o que se retira das pautas, o que se lê na integração no mundo do trabalho, o que decorre da avalição externa das escolas, o que depende da satisfação de cada professor. No fundo, o "sucesso educativo", uma realidade plural, não depende, apenas, de uma só vertente.
Vivemos, sem dúvida, numa sociedade-espectáculo, em que a comunicação é mediada e dominada pelos media, pelas notícias-choque, na qual é fácil manipular números e evidenciar sucessos e dificuldades, mais do que conhecer e compreender esses sucessos e essas dificuldades, o que me parece ser uma condição essencial para os celebrar ou enfrentar.
Não tenho, hoje, qualquer dúvida em afirmar que o sucesso escolar se constrói essencialmente na sala de aula. Que o sucesso é influenciado, claramente, pela prática do professor. 
Eu queria muito que a escola fosse, de verdade, para cada uma das pessoas singulares que mora em cada aluno. E, o que me agrada e assusta (paradoxo preocupante), creio que é possível concretizar este desejo!

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Vencer a guerra

O gosto pela leitura, a promoção do prazer de ler, a educação para a leitura são, entre outros , objectivos a promover pelos professores de português. Eu, que sou assumidamente leitora compulsiva, até leio os rótulos e as bulas dos medicamentos, levo muito a sério estes objectivos. De facto, levo-os bem mais a sério do que o ensino explícito da gramática que acho uma grande sensaboria...
Ora, tentando perseguir o meu objectivo, e aproveitando o facto de, na escola onde trabalho, estar a decorrer uma Feira do Livro, resolvi levar uma turma de 10º ano a "mexer em livros". Achava eu, (ah!ingenuidade), que os alunos iam achar curiosos alguns títulos e, ainda que os não comprassem nem lessem, haveriam de gostar que lhes falasse deles.
Pois. Achava... Mas o que encontrei foi mesmo gente a olhar para o ar, a sentar-se à porta e a dizer piadas sem graça nenhuma. Julgarão que vou desistir?? Nem pensar! Vou passar a , todas as semanas, ler na aula. LER só por ler, sem análise, sem interpretação, sem explicação! Esta guerra eu vou vencer. Até porque, sinceramente, estou muito farta de ser derrotada...

terça-feira, 10 de maio de 2016

IRS

Comecei hoje, depois de alguns dias adiando, a tentar preencher o meu IRS. Liguei o computador, abri a página das finanças, o que sempre faço com o coração em sobressalto, e decidi iniciar a aventura. Tinham-me dito que era muito fácil, que bastava saber ler, que já estava quase tudo preenchido. Mas, como também me dizem que faz sentido pagar uma brutalidade de imposto, que a vida vai melhorar e que o estado é justo, iniciei o IRS com muita angústia e desconfiança. 
Afinal, não é tão fácil como parece. Afinal, não basta saber ler. Afinal, há uma série de quadradinhos, tabelas, indicadores, solicitações, complicações que exigem (no mínimo) que se tenha tempo e paciência... 
Vou tentar concluir esta tarefa imposta, árdua e dolorosa, mas, para já, IRS passa a ser, para mim, Indecente Roubo Sem Sentido!

domingo, 8 de maio de 2016

DOMINGO

Chove muito, e eu gosto da chuva. Acendo a lareira, gozo o cheiro do fogo a sugerir-me lar, e fico trabalhando. Há sempre aulas para preparar, trabalhos para corrigir, portefólios para orientar e, sobretudo, há tempo para me reolhar. Retomo Vergílio Ferreira, perco-me na teia libertadora da escrita e vejo nascer, saltando das teclas do teclado do meu computador, uma multidão de personagens pedindo para serem gente. Salta a infância, pedindo uma formatação original, exigindo que fuja ao salto ao eixo e aos jogos de consola; pula a juventude, impondo a urgência de novidade (ainda que a mesma se faça de repetições de eternos modelos), e surge a idade adulta (a adultês), lembrando a necessidade de encontrar sentidos e lógicas. Ignoro as personagens incómodas, nem deixo que a velhice exija atenção, e tranco as emoções na gaveta mais funda das aparências exigentes do quotidiano. Então, desligo o pc e abro o caderno onde, a gosto, traço o esqueleto das aulas de amanhã. É bom, apesar de tudo, haver amanhãs. É sempre uma forma de iludir o hoje.

sábado, 7 de maio de 2016

31 ANOS

A minha filha pequena, a que será sempre a guardadora das minhas últimas memórias de mãe de filhos pequenos, faz hoje 31 anos. Olho o tempo, tentando resistir às banalidades sobre a rapidez e voracidade do mesmo, e penso que o calendário exige mudança de atitude. Com filhas adultas, netos saudáveis e profissão de que gosto, está chegada a hora (e já vem tarde) de olhar para as oportunidades de ser-eu.
Bom, não me vejo a viver ignorando os laços, nem sequer me imagino a cantar de felicidade por estar sozinha, mas, quero acreditar, chegou a hora de dizer à vida que basta de me chatear, de colocar no meu caminho calhaus impossíveis de remover. Agora, o tempo é de desfiar memórias, de limpar do caruncho tempos em que fui feliz, de não ter receio de ser assim, diferente e estranha.
Olho a fotografia da minha menina, então só com dois meses, e não tenho desejo de recuperar o cabelo sem tinta, o corpo magro, a pele sem rugas. Desejo mesmo, tenho da ternura, do mimo, das histórias contadas tecendo magia...

sexta-feira, 6 de maio de 2016

FLORES

Na minha varanda há umas flores selvagens, cor de rosa forte, que fecham de  noite e, de dia, abrem-se totalmente para a vida. Invejo-lhes o poder... Quem me dera poder, também, fechar-me à escuridão.

IRRITAÇÃO

Olho à minha volta e apetece-me desaparecer. Claro que sei, e defendo, que há opiniões diversas, que não carrego a verdade no bolso, que ouvir e compreender argumentos distintos dos meus me faz até bem. No entanto, há situações que, por mais que tente fazer render a minha capcidade de aceitação, não consigo já tolerar. 
Ultimamente, parece que só mesmo para me chatear e mostrar que uma desgraça nunca vem só, a acrescentar aos meus desânimos (mágoas) familiares, vêm, diariamente, absurdos profissionais. Tenho vivido situações que, se não acontecessem na primeira pessoa, muito me haviam de divertir... Tenho colegas indignados, revoltados, protestando mesmo junto da direcção da escola, por serem convocados para uma apresentação de manuais. Lembre-se que, só por acaso, é necessário escolher manuais para o 11º ano...  Querendo compreender razões, disseram-me que deveria ter feito só um convite. Afinal, concluí, a questão não era pedagógica mas democrática...
Mal refeita da minha indignada surpresa,  esbarrei com o desinteresse (revolta?) de muitos colegas perante o Plano de Promoção do Sucesso... Ora bem, eu não sou socialista. Eu não gosto do Dr. António Costa. Eu não confio no BE. Mas, para além destas razões, há algo que me parece evidente: - A Escola que temos, não serve! Assim, se nos dão a possibilidade de, nós mesmos - que sabemos da "coisa" - podermos reestruturar processos, porque não aproveitar?
Não tenho a mania de ser boazinha. Sou católica, mas não sou santa e, ainda por cima, não tenho vocação para mártir, mas também não tenho pachorra para profetas da desgraça!
Eu hoje estou assim: Desiludida, irritada e chateada com a vida!

domingo, 1 de maio de 2016

GRIPE

Começou de noite. Chegou a tremer, um frio estranho e desajustado. Depois, foi a tosse, o levantar-me procurando mel, o chá de limão às três da manhã... De manhã, sem pedir licença, a febre estava instalada. Recusando dar ouvidos à doença, há coisas a que não se deve dar confiança, atravessei a cidade para chegar à Sé. Um vento gelado, cortante, fez-me companhia.
No regresso, os olhos lacrimejavam sem emoção, porventura o choro mais idiota, e o par de aspirinas pouco resolveu. Agora, enrolada numa manta e bebendo chá, perdendo o olhar na lareira que acendi, penso que esta gripe foi providencial. Não passei sozinha o Dia da Mãe!

DIA DA MÃE

Hoje, é dia da Mãe. Vai haver flores, presentes, almoços de festa. Os Media vão, de certeza, homenagear as Mães. E eu, que sou Mãe e Avó, penso neste dia, agora no quente da noite, lembrando as Mães especiais. Não as Mães de filhos saudáveis e felizes, não as mães de crianças, mas as mães de filhos mortos, de filhos crescidos que partiram, de filhos que, um dia, se afastaram fosse por que motivo fosse. Não imagino pior dor do que ver morrer um filho! Deve ser por isso, por ser uma absurda crueldade, que em nenhuma língua há palavra para definir o estado da mãe que perde o filho! Essas mães, hoje, devem sofrer mais ainda (se isso é possível) e eu penso nelas.
Penso, também, nas mães de filhos crescidos que partiram. Deixaram as memórias, os sorrisos nas fotografias, mas levaram com eles os beijos, os abraços, as presenças. Eu sou mãe assim. Mãe, e avó, com a distância pelo meio e sempre recuperando memórias e tecendo sonhos...
Hoje, Dia da Mãe, lembro também as mães de filhos doentes. Filhos que sofrem, ou que fizeram percursos de vazio.
Porque ser Mãe não é só receber o presente indo que os filhos fizeram na escola, não é só dar colo e insistir para que comam, não é só pensar no que eles vão vestir, não é só ajudar a fazer os trabalhos de casa, não é só limpar as lágrimas depois da queda da bicicleta ou do primeiro desgosto de amor. Infelizmente....
Nunca tive uma relação muito próxima com a minha Mãe, mas lembrarei sempre, enquanto a memória não me trair, o dia em que trouxe da escola, feito por mim (que sou absolutamente inapta manualmente)..., um azulejo pintado onde escrevera "Para a melhor mãe do mundo". Lembrarei sempre o sorriso dela e a garantia, sincera, de que aquela borrada era linda!!