domingo, 31 de maio de 2009

FESTA DA DANÇA

Foi uma tarde cheia. De som, luz, amizade e nervoso miudinho. As crianças sempre me encantam, no ballet como no hip hop, no karaté como nas sevilhanas. Lindas, ágeis, cheias de ritmo e, sobretudo, extravasando energia. Os adultos também, nestes dias. Ficam mais bonitos, talvez reflexo da música que ecoa nos corações soltos. Este ano, saíu-me dançar um cha-cha-cha. Não tem a sensualidade do tango, sequer a imponência da valsa, mas tem muita alegria e isso faz-me bem. Senti-me solta dançando, segura nas mãos firmes do meu par que, baixinho, murmurava confiança.
Claro, com a minha sensibilidade exagerada ia borrando a maquilhagem... É que a Filipa, a minha menina-aluna sempre atrasada com um enorme coração, encheu o palco num solo de ballet que me encantou. Vi a Filipa dançar e na minha cabeça havia Álvaro de Campos, os olhos de Blimunda, a poesia de Camões a fazerem-lhe companhia. A minha Filipa refilona, hoje, rodopiando de azul, lembrou-me a força da juventude, abanou-me os pensares, fez-se um soneto no palco do Centro de Artes do Espectáculo em Portalegre!

terça-feira, 26 de maio de 2009

125 ANOS DE ESCOLA!

Estou na sala 11 da Escola Secundária de S. Lourenço, a minha escola, a mesma escola que assinala 125 anos de existência, os mesmos do Jardim Zoológico. Coincidência, decerto...
À minha frente há 24 cabeças de jovens tentando compreender Camões e "Erros meus, má fortuna, amor ardente". Há olhares compridos para os trabalhos dos colegas, há suspiros de ignorância, e alguns, poucos, sorrisos de competência. Um deles, miúdo com corpo demais para o tamanho da alma, traz uma T-shirt preta que grita:" You have to Destroy the previous generation to invent your own". Indiferente ao apelo violento, o miúdo esforça-se por descobrir o que serão os erros meus, a má fortuna também. Não me apetece ajudá-lo. Ele que cresça, que aprenda, que desvende o mundo imenso que anuncia querer destruir. Incomoda-me a gratuidade, a ligeireza, com que estes miúdos consomem ideias feitas, frases gastas, apelos ocos.Devo estar a ficar velha... Porque me apetece uma juventude original, crítica de facto, criativa e exclusiva.
Perto da janela, o Francisco estica o pescço. Mas a Mariana tem uma letra pequenina e ele desiste. Não consegue mesmo copiar. Suspira. Oh professora, bem podia ter feito um teste mais fácil. Nem respondo. Fácil demais é, por vezes, a Escola. Por isso eles se tornam velhos de quinze anos. Oh professora, o que quer dizer conjuraram? E eu a lembrar-lhes a importância de LER!!
Sol lá fora. Oiço os pássaros, chegou o Verão, riem dois homens que, por conta da Câmara, montam barraquinhas no Jardim para a Festa dos 125 anos da Escola. A tal festa, como no Jardim Zoológico! Onde haverá mais feras? Mais perigosas?

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Anedotas?

Há uma anedota sobre alentejanos, uma das muitas a provar a genialidade do Alentejo, que apresenta um alentejano que, confundido com o facto do seu relógio ser ou não de ouro, responde (sabiamente) tem dias... Hoje, estou como o meu conterrâneo. Acho que a vida se faz de dias, de momentos, de antíteses e paradoxos.
De manhã, fui agredida, juro que é verdade!, pelo egoísmo e inveja instalados na cabeça de dois ou três alunos. Por ironia da humanidade, um deles eleito o melhor companheiro e premiado pelo Rotary Club (???)!! Estes jovens de idade, velhissimos de coração, magoaram-me fundo por quererem o mal dos colegas, por afirmarem, com uma violência emocional que me dilacerou por dentro, que não desejam o sucesso alheio. Fiquei com uma nuvem negra dentro de mim, ficou a doer-me a cabeça, senti-me perdida nesta existência oca que parece não ter fim.
Depois, em casa, aguardava-me uma carta fantástica de um senhor que me sente a falta na escrita. Fez-me bem! Recuperou-me (um pouco) a confiança nos homens.
Ao fim da tarde, quando cheguei exausta e cheia de frio, quem me manda ter vestido saia sem meias?, telefonei à Águeda Sena. E, do lado de lá do fio, veio uma voz alegre e sábia para o lado de cá dos meus sentires. Ri-me. Senti o abraço forte-forte que me mandou e, em silêncio, pedi ao meu Cristo que me ajude a seguir a coragem, a força, a sabedoria, a ternura e a confiança desta Senhora! Agora, já quente e quase a caminho do segredo dos lençóis, vejo a minha existência como a tal anedota: - Tem dias...

sábado, 23 de maio de 2009

A MINHA CIDADE



É feriado hoje, na minha cidade. Portalegre faz anos, quatrocentos e muitos, e por isso está lavadinha, florida, engalanada. Passei bem cedo junto da Câmara Municipal, o impressionante monumento que começou por ser um Colégio Jesuíta, passou por uma Fábrica Real (que o Marquês de Pombal não gostava de frades), esteve ao abandono e foi há quatro anos recuperado para albergar a Casa da Cidade. Está linda, mais ainda!, a minha Câmara hoje, com as bandeiras penduradas das janelas altas, com brilho intenso mostrando que sabe que está de parabéns. Procurando a farmácia de serviço, que afinal estava fechada..., circulei pelo jardim, pelas ruelas de mestres e artesãos, pelas muralhas do protector castelo. Imaginei o início da minha cidade, os mouros, os cristãos, os olhos medrosos, as mãos grossas, os corações imensos.
De repente juro que vi, mesmo ali juntinho ao final da barbacã, uma moura fugitiva das teias da História. Nem lhe toquei a buzina, com medo de assustar o sonho. Mas fiquei, no silêncio da manhã-madrugada, achando que, afinal, ainda que mais de 400 anos depois, a gentes desta cidade não mudaram assim tanto: - Ainda há medos, línguas viperinamente compridas, calçadas difíceis de subir e calhaus a fazer pesar as almas desprevenidas. Então, respirei fundo e certifiquei-me de que, na minha alma, não há (hoje)calhaus. Há, temo, alguma areia de grãos incómodos. Apenas.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

IMPRESSIONANTE!!

Há PESSOAS ÚNICAS, fantásticas, encantadoras, mobilizadoras, intensas, ternas, sabedoras, dinâmicas e impressionantes. A Águeda Sena é assim! Hoje, num dia de calor em Portalegre, a Águeda Sena chegou e ocupou lugar de honra nos meus afectos. Falou de sonho, pôs uma sala inteira a rir, a representar, a partilhar sonhos e a usar o corpo. Sem vergonhas, ou sem muitas vergonhas..., miúdos e graúdos expuseram-se e aprenderam. Eu lavei a minha alma, recuperei confiança na humanidade! A Águeda Sena soltou um dos imensos nós da minha essência. Vi os meus meninos, os meus alunos queridos que participaram, com os olhos a brilhar de confiança e força. A Ana, a minha Ana, cresceu por dentro e eu vi nascerem-lhe estrelinhas no olhar. Vi a LUZ do sonho despertar o real e tive vontade de impedir a noite de chegar. Acredito que é possível tecer cumplicidades efectivas. Assim: num fazer das pequenas grandes coisas que fazem cumprir a realidade! Hoje, senti que fui útil de facto aos meus miúdos, aos jovens a quem desejo a capacidade de construir possíveis de FELICIDADE. Hoje, vou sonhar com o meu projecto de educação integral! Vou sonhar que posso de facto educar os meus alunos e não só ensiná-los... Queria, como queria!!, ser capaz de os fazer crescer por dentro, contestar o estado das coisas e LUTAR por aquilo que defendem. Ah! Como queria ter a força da Grande Senhora que é a Águeda Sena!! Como me toca a força desta GRANDE SENHORA!!!!

terça-feira, 19 de maio de 2009

Ele há coisas...

Felizmente, Há Luar!. É obra obrigatória do programa de 12º ano de Português e, devo confessar, não é das minhas preferidas. Chateia-me a visão simplista dos pobres e ricos, bons e maus, oprimidos e opressores, como se, de verdade, a vida fosse assim tão óbvia... Talvez porque não me apaixona a obra, nem o estilo, sequer o conteúdo ou o autor, esforço-me sempre para manter os meus gostares e sentires à margem e trabalhar o texto, com os meus alunos, da melhor forma possível. Foi por isso que hoje estive a preparar um power-point muito lindinho, com recurso a imagem, texto e som... Ora quando chegou ao som é que, como se diz na minha terra, a porca torceu o rabo. E esta tinha-o bem encaracolado!! Queria inserir imagens do 25 de Abril, com o Zeca Afonso a cantar a Grândola Vila Morena, no meu trabalho lindo e...não sabia como!!! Adepta confessa das cumplicidades, pedi socorro à Ana, uma expert da informática. Com a sinceridade juvenil que a caracteriza, disse-me que, embora fosse possível, era excessivamente complicado para mim! Conformada, mas não rendida, telefonei ao meu querido Eduardo que sabe destas coisas a potes. Esforçou-se por me ensinar mas, como eu TÃO BEM sei, quando o aluno é totalmente desprovido de jeito não há metodologia que resulte. O Eduardo, no entanto, resolveu o meu problema: - A professora traz-me a sua pen e, amanhã, levo-lhe isso a funcionar! - Óptimo! Eficiente!
Eu é que perdi mais de uma hora a ouvir a Grândola e a ver os comunistas... Felizmente, tenho o Eduardo, e a Ana, e o Miguel, e a Filipa, e o Manel, e o João, e a Margarida, e tantos alunos com quem tanto aprendo! Só isso me consola da hora sofrida na tarde de hoje!!!

segunda-feira, 18 de maio de 2009

EXAUSTÃO E TORCICOLO

O cansaço, hoje, é muito. Trabalho, comissões, reuniões, formação, testes, casa, filhas, tudo me pesa de tal forma que arranjei um violento torcicolo. Agora, a juntar à minha convicção política de Direita, acresce a impossibilidade física de olhar para a Esquerda!! Vá lá, ao menos o torcicolo foi sensato...

domingo, 17 de maio de 2009

Os ninhos


As andorinhas fizeram, já no ano passado, este ninho de duas assoalhadas aqui no meu quintal. Este ano, voltaram. Hoje, vi-as a entrar e a sair, numa grande azáfama, talvez acabadas de chegar de viagem e preocupadas em arrumar a casa e fazer limpezas. Apesar de não ser grande adepta de aves, as minhas inimigas penosas..., fiquei a observar o vai-vem e não resisti e fotografar a moradia. Depois, arrependi-me! Porque fiz às andorinhas o que tanto me incomoda que me façam a mim: - invadi a sua privacidade!! Peço desculpa, aqui, às andorinhas.

A VARANDA

Na parede há um painel que garante “o oxigénio do ar é dos melhores medicamentos. Muitos o desprezam por não custar dinheiro” V. Pauchet. Lembro-me de ler aquelas palavras, primeiro com dificuldade, depois procurando um sentido, por fim sabendo-as de cor. São palavras em azulejos pintados, com cor, fazendo moldura para além do sentido ou da actualidade. Para além das palavras, a varanda tem mil outros significados, mesmo sabendo que, por si só, não é sequer um significante. Em miúda, sentava-me ali, sozinha, muitas vezes ao fim do dia, espreitando a cidade que, lá ao fundo, me parecia sempre tranquila. Via a Sé, a igrejinha do Bonfim, a Senhora da Penha, as muralhas do velho castelo. E fantasiava: - Se eu pudesse voar, ainda que não sendo pássaro, partiria do parapeito da varanda, planando, até pousar mesmo na ponta mais bicuda da torre da Sé. Se eu fosse fada, bruxa nunca quis ser, inventaria um feitiço, com asas de morcego e patas de gafanhoto, para cristalizar os momentos em que ali me instalava, fugida da agitação da casa, confessando ao ar as minhas angústias, os meus temores, acho que os meus sonhos também. Foi naquela varanda que, pela primeira vez, vivi intensamente aquela hora mágica em que tudo pára. Era miúda e, depois do banho obrigatório ao fim de um dia de brincadeira, já de camisa de noite e descalça, escapulira-me para ali enquanto o resto da casa, sob as orientações da minha mãe, continuava a preparar-se para o jantar e para o fim do dia. Sozinha, comecei a perceber o silêncio dos cães, as asas quietas dos pardais, a tranquilidade quieta do vento. Ao fundo, mesmo por detrás da serra da Penha, havia riscos vermelhos em torno de uma bola gorda, brilhante, que se preparava para, também ela, ir dormir. Estranhei o silêncio. Lembro-me que me levantei, espreitei os baloiços que ainda há pouco ousavam tocar as nuvens, e me surpreendi com a sua imobilidade total. Fiquei quieta também. Tive algum medo, pensei que o mundo, por um qualquer mistério, tivesse simplesmente deixado de girar. Mas não. Instantes depois, lembrando penitentes de alma lavada, os pardais abandonaram o fio do telefone e os cães retomaram a conversa animada que ligava o canil aos que estavam soltos. Muitos anos, milhares de vezes, vivi este momento e, sempre, me surpreendia a beleza que a minha varanda me oferecia. Era o lugar mais perfeito da serra, achava eu. E, como para me mostrar que, às vezes…, eu tinha razão, os meus pais mostravam sempre a varanda, com algum orgulho mal disfarçado, a quem pela primeira vez nos visitava.
Quando o tempo permitia, e fazia-o muitas vezes, almoçávamos na varanda. O meu pai gostava de jantar ali, conversando, contando da vida e ajudando-nos a crescer. Ali lhe contei os meus maiores desgostos, ali me garantiu, tantas vezes!, a sua cumplicidade eterna. Então, já mais velha, a varanda era para mim um espaço de apaziguamento interior. Ali, sentia-me protegida.
Era, acho eu, a minha fortaleza!
Já adulta, mãe, pegava nos meus bebés ao colo e mostrava-lhes a cidade, as igrejas que conhecia tão bem, os voos dos pardais, a cama do sol, as nuvens de algodão. Muito pequeninas, ao colo, espetavam o dedo e identificavam os lugares que me tinham emoldurado o crescimento. Então, elas começaram a ler as palavras do azulejo e oxigénio saía com dificuldade…
Hoje, estou com saudades da varanda. Os tempos correram, há outras gentes na minha varanda, há outros risos que desconheço, e desejo que haja quem seja capaz de ensinar aos pequeninos os lugares da cidade. Hoje, a minha varanda faz apenas parte do património imenso de recordações que, vale-me esse consolo, nunca ninguém me poderá roubar.
A vida, o tempo, as gentes (pessoas nem todas) têm-me, com demasiada frequência, assaltado as emoções, roubado realidades. Mas o meu património de recordações, ao menos esse!, é inviolável!
Tenho tantas saudades da minha varanda…

sábado, 16 de maio de 2009

Vento



Soprava com força, frio, zangado talvez, o vento na minha Serra. Os meus sentires, eternamente incapazes de paz e indiferença, emaranhavam-se com força no meu passeio, com o Fred e a Ginja, pelo meu quintal. Ali estavam as cerejeiras, carregadas, o Fred a comer cerejas da árvore e a cuspir os caroços, exactamente como eu. A Ginja, fêmea..., mais inquieta, sem querer saber das cerejas, preocupada em descobrir a rã que, rápida e curiosa, parecia provocá-la por entre os nenúfares. Sentei-me ali, casaco velho bem abotoado, cabelos a embaraçarem-se, e fiquei vendo os bichos, a vida, o tempo.
Tenho muitas coisas para pensar, algumas para arrumar na arca de nenhures, outras para resolver, (coloco-as vezes demais nos cantos poeirentos do meu ser), algumas para eliminar (tarefa tão difícil...) e poucas para reciclar. Acho que eu devia ser emotivamente ecológica. Assim como faço (às vezes...) com o lixo e as garrafas, devia fazer com os meus sentires e pensares. Devia ser capaz de os reciclar em novas essências com melhor utilidade. Era, por exemplo, o que devia fazer com as minhas mágoas políticas. Devia ser capaz de converter a minha desilusão, frustração e tristeza, em energia interventiva, construtiva e modificadora. Devia reciclar a minha desesperança, que anda a ganhar forma de comodismo e desinteresse, transformando-a em força de lutar, protestar, participar e mudar. Imagino, por exemplo, os nomes horríveis (ainda que justos e sinceros) que destino à ministra da educação a serem reciclados...
O meu telemóvel, com a melodia brasileira que o distingue "Que tal nós dois, numa banheira de espuma..." (Grande ideia!!!) trouxe-me para a realidade, arrancou-me aos ecopontos dos sonhos. É sempre assim! Sempre que me dá vontade de ser boazinha e correcta, algo me acorda para a realidade!!!

segunda-feira, 11 de maio de 2009

COISAS COM SENTIDO

Sempre me surpreendem, os meus alunos. Jovens com força, com querer e com CRER num futuro diferente e melhor. Foi assim hoje com o entusiasmo da Ana, com o humor inteligente do Miguel, com o sorriso tímido da Filipa, com o olhar curioso do Manel, com muitos olhos e ouvidos atentos às palavras do senhor deputado que nos visitou. Estes miúdos, as minhas crianças como gosto de dizer, mostraram que, às vezes, a Escola faz sentido. Disseram de vivências, teceram críticas, calaram, estou certa, as vozes que os intitulam de geração rasca. Se a Escola fosse sempre assim, feita de aprendizagens activas e participadas, não haveria Joões a defender o regresso à ditadura...
Hoje, numa sala fantástica da minha cidade, a Europa cresceu e fez sentido. Não fez sentido, para mim, a ausência de muitos professores, mas, como diz o povo sábio, as acções ficam com quem as pratica e quem não esteve não fez falta nenhuma. O que fez falta, e sentido, foi a competência dos meus alunos de quem tanto gosto!
Vale a pena ser professor quando as aprendizagens acontecem. Hoje, estou bem no meu papel de professora. Esqueci as enormidades do sistema, ignorei as decisões ocas da equipa do Ministério da Educação e senti que, pelos miúdos, vale a pena continuar a ser professora. Obrigada miúdos muito queridos!! Cresçam, mas, POR FAVOR!!, não deixem de ser quem são. Não percam a vossa essência, não deixem que a sociedade do nada vos formate.

sábado, 9 de maio de 2009

DIA DA EUROPA

9 de Maio, Dia da Europa. Actividades, discursos, apelos a votos, marketing de ideias ocas. Que Europa é esta? Esta que, como há cem anos "Jaz posta nos cotovelos", pendurada da História desprezada, fitando o ocidente com cobiça, vendo o fundo roto aos bolsos e sem hipótese de exterminar a pobreza? Que Europa é esta que bate no fundo, vê crescer a violência, vê morrer no mar os que a procuram, infelizes, escravos de sonhos prisioneiros, fugitivos de uma África explorada? Que Europa é esta que se faz de instituições pomposas, de reuniões e fotografias, de pessoas importantes que parecem viver planando sobre a realidade? Que Europa é esta que tem tantas, e tão diferentes, velocidades? Que Europa é esta que não convence sequer os seus habitantes da importãncia de participarem, de votarem, de opinarem?
Oiço falar em cidadania europeia, e encolho-me. O que é ser-se cidadão de uma realidade inexistente? Como se pode ser cidadão europeu se não se pode, sequer, ser cidadão de qualidade num qualquer estado-membro?
Não confio nesta Europa de mentira, feita de gente sem razão, movida pelos interesses materiais, indiferente face a Valores humanos realmente essenciais. O meu projecto europeu não compreende as injustiças sociais, a miséria, a violência sobre os jovens que vêem hipotecado o seu futuro. Esta Europa de hoje é, para mim, um projecto falhado.
Dia da Europa? Faz-me doer...

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Convite para jantar

Ligou com urgência. Que sim, que queria mesmo vê-la. Que claro, que ia buscá-la. Longe? O que é isso para quem, de facto, dá valor às essências, aos momentos exclusivos, à qualidade e à ternura? E a mesa marcada. Ela a ceder. Uma consciente inconsciência, uma transgressão assumida. E o automóvel veloz, fresco, Diana Krall e Rodrigo Leão por companhia. Palavras sem lógica, tentativas inglórias de vestir de razão a irracionalidade da paixão intensa. Que bom estarmos na UE, não há fronteiras, já viste o tempo que poupamos? Ela a sorrir. Ah, se a Europa fosse assim fácil, emotiva, feita de força e união, de paixão e entrega... E ele a impedir o mundo, os outros, o real, de invadirem o sonho, intrusos da banalidade. Peixe no sal, vinho gelado, crema catalana, café horrível e a tarde, inteira no pôr do sol a chegar, para os inconfessáveis. Inenarráveis também. É bom quando o sonho diz presente!

segunda-feira, 4 de maio de 2009

IGNORÂNCIA

Recebi, das Finanças, um documento onde se lê "Rendimentos Perdiais". Recebi, de uma técnica de secretariado, um mail que terminava enviando-me "comprimentos". No Jornal da minha cidade lê-se "ofertas para oferecer". Na ementa de um restaurante onde ontem almocei, há "garoupa cosida" (Vá lá, não era cherne...).
A minha vontade, logo face aos perdiais, foi responder que, uma vez que os rendimentos estavam perdidos, nada teria de pagar... Mas, depois, lembrando as outras situações, e porque são meros exemplos, achei melhor calar-me e conformar-me. Afinal, nada disto me deve surpreender. É, apenas, a consequência directa da estupidez e ignorância que reinam no meu país! Claro que eu, em vez de comprimentos, desejaria alturas para os saltos que se usam exagerados; gostaria que as ofertas o fossem em si mesmas; saborearia melhor uma garoupa cozida em água fervente do que cosida com linha de alinhavar e dormiria mais descansada se não tivesse de esbarrar com a ignorância chocante deste Portugal de péssima qualidade. Mas, na impossibilidade de ter o que gostaria, vou tomar um ou dois comprimidos Xanax e hei-de dormir na mesma...

domingo, 3 de maio de 2009

DIA DA MÃE

O calendário assinala: - 1º Domingo de Maio, Dia da Mãe. As lojas de flores enchem-se, as promoções anunciam-se, as reservas para almoços e jantares esgotam restaurantes. É a homenagem às Mães. Justa, merecida, imprescindível. A não precisar de dia próprio, a dever acontecer todos os dias...
Lembro-me de fazer o presente de Dia da Mãe na escola. Com a total inaptidão para tarefas manuais que ainda hoje me caracteriza, produzia umas coisas horríveis, esborratadas e mal pintadas, que a minha Mãe punha na cómoda no quarto e agradecia com furor. Furor, para mim, incompreensível. Como era possível que ela gostasse daquelas enormidades horrorosas? Vá lá uma filha compreender uma Mãe...
Depois, mais tarde, esmerava-me nos textos que lhe escrevia. Fugia dos presentes comerciais, aproveitava o Dia para lhe falar do meu ser que, então, mais me confundia e baralhava.
Agora, eu Mãe também, apetecia-me poder oferecer-lhe tempo reciclado para voltar a usar. De modo a que o tempo, dela e meu, não se esgotasse nunca. Mas, feliz ou infelizmente (reviver chatices???), o tempo não é reciclável e, por isso, tenho de me conformar com as rugas incómodas e as memórias imensas.

sábado, 2 de maio de 2009

PESSOA e EU

Sábado de sol, Primavera incipiente, flores e muito vento. Fiquei por casa, cumprindo a existência num fazer de obrigações inadiáveis, procurando dar sentido, e muita qualidade, ao meu ser professora. Divaguei por Saramago, perdi-me em Pessoa e saltei Sttau Monteiro porque, de verdade, a minha consciência política (seja lá isso o que for) anda magoada demais.
Com Pessoa, eternos amigos, conversei de coisas e sentires. Ele, sempre trocista da vulgaridade, falou-me da necessidade de sentir-pensando, condenando o meu vício de pensar-sentindo. Eu falei-lhe de sonhos, de saudades, de filhas, de netos. E ele confrontou-me com a eterna procura do eu-no-outro, com a inevitabilidade do Tempo e com a urgência do momento. Quis falar-lhe de memórias boas, tenho muitas, mas estilhaçaram-se contra a racionalidade inteligente. É isso, ele tem razão: - Foram. não são!!

sexta-feira, 1 de maio de 2009

1º de Maio

Feriado. O sol a acordar intenso, os campos brilhantes da chuva de ontem, os sorrisos descansados no café de sempre que, este ano..., não encerrou. Fecha amanhã, para ligar ao habitual descanso de Domingo num fim-de-semana maior, porque, de verdade, o que interessa é descansar e não lembrar a hipocrisia do Dia do Trabalhador num país de mágoas e desempregados.
Olho com descrédito, desânimo também, este feriado que surge, para mim, associado a democracia e a liberdade, dois Valores que, no meu país, estão gravemente postos em causa.
Dia do Trabalhador num tempo sem direitos, sem respeito, sem dignidade para quem, de verdade, trabalha. Tempo de escuridão, de revolta medrosa, de imposições ilógicas, de injustiças gritantes, de sentires humilhados e estilhaçados. Feriado sem sentido, de luto na minha consciência humana e cívica.