quarta-feira, 31 de março de 2010

O PEC

As televisões não falam de outra coisa, os debates circulam à volta do mesmo. Intercalado com escândalos e vigarices, o PEC está na ordem do dia. Eu, cidadã comum, absolutamente ignorante em questões de economia, oiço, leio e tremo. Só oiço falar em números, em aumento de impostos, em congelamento de salários, em dívidas crescentes, em diminuição do poder de compra.
Ao mesmo tempo, vejo reformas chorudas (46 mil euros???) para ex-banqueiros de 46 anos, ex-administradores, etc. Desejo que tudo seja uma confusão mas, para meu maior pesadelo, diariamente sou confrontada com o impensável: - Ainda caminhamos para pior!!!
Cansada de dizer que o socialismo não serve, rouca de afirmar que não pode fazer sentido uma política que ignora as pessoas para apenas se centrar no dinheiro, apetece-me ignorar, virar costas, fazer como a avestruz!! Mas, porque um azar nunca vem só..., sou obrigada a ver, a ouvir, a ler a realidade do meu país porque pago impostos (demais), trabalho (demais), não vou ter reforma e estou congelada há mais tempo do que uma pescada esquecida no fundo da arca imensa do Modelo.
Será que PEC não quer dizer: - Poucos Escaparão à Condenação????

terça-feira, 30 de março de 2010

Insistência

Chego a casa gelada, o inverno voltou!, abraço-me no casaco velho, azul, cheio de cheiros e lembranças, e fecho os olhos. Dormi mal, pesadelei, fui assaltada por recordações, medos, sustos inexplicáveis e, por isso também, sinto que a invernia da rua entrou, abusivamente, no meu coração. A chuva agride as vidraças, sem melodia, sem poesia alguma, fazendo ecoar em mim a violência que, por vezes, o quotidiano impõe.
Enrosco-me no meu sofá, olho o lume, e chamo para mim as memórias boas, as recordações, as vivências recentes da redescoberta da vida. Insisto no esforço de ser feliz. Porque, para além da chuva e dos pesadelos, tenho em mim a certeza de um presente prenhe de futuro de plenitude.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Final de Período

Chegou o final do período, o momento das avaliações e das malditas, e infindáveis, reuniões de avaliação. Os miúdos perguntam as notas e eu, que discordo completamente do sistema absurdo e das malditas grelhas excel, tenho vontade de lhes dizer que pensem menos na nota e mais em ser gente de verdade. Apetece-me falar-lhes de afectos, contar-lhes do fascínio de se encontrarem sentidos e sentires, da importância do amor! Apetece-me garantir-lhes que aprender implica gostar, aderir, participar, intervir. Apetece-me dizer-lhes que não gosto de ter de os classificar em somas e percentagens, que preferia poder dizer-lhes qual o nível de competência em que se encontram. Mas, infelizmente, no meu país não há lugar para a pessoa que mora em cada aluno! No meu país, há excel, somas, percentagens e absurdas comparações com, claro..., obrigatórias estratégias de recuperação!! Ao mesmo tempo, enquanto preparo as reuniões absurdas, o meu coração vagueia na saudade. Para ele, para o meu coração apaixonado, não há excel nem percentagens. Para mim, finalmente!, há um amor real, pleno, verdadeiro, cúmplice, livre e declarado. Esqueço, então, as malditas reuniões. Recosto-me na cadeira velha, enrosco-me no casaco velho, nesse mesmo que ele deixou, e lembro os momentos bons, as partilhas, as conversas, os toques, as promessas e os planos. É assim a vida: - Misturas estranhas de pensares e sentires!!

domingo, 28 de março de 2010

Despedida

Veio num abraço forte, intenso, daqueles só deles que a faziam ficar com os olhos húmidos de paixão. Com doçura, beijou-lhe as pálpebras sorrindo carinho e futuro antecipado. Partia com o regresso marcado, deixava-a levando-lhe a alma, os sentires, as emoções. Ela, tremendo, estreitou-o sentindo o corpo amado, viril, colar-se ao seu. Baixinho, pediu aos deuses, e a Deus também, que lho devolvesse depressa, que acelerasse o regresso. Adivinhando-lhe a angústia, com os dedos nos cabelos dela, ele prometeu vivências de plenitude. Ela, com a segurança de quem ama, viu-o seguir, num último adeus, certa de que o regresso estava já no início.

sábado, 27 de março de 2010

Saudades


Pode, sim, ter-se saudades por antecipação. Saudades de uma ausência anunciada, certa, obrigatória e imposta pela vida. E sente-se a partida antes de acontecer, e experimentam-se, dolorosas, as saudades antes de o serem.
Muitas vezes, tantas que lhes perdi o conto, trabalhei com os meus alunos as Despedidas de Belém. Falamos, então, das lágrimas dos que ficam, da hesitação dos que partem, dos afectos estilhaçados, dos amores adiados, das presenças ausentes num quotidiano de espera e angústia. Também com os miúdos, falamos de Pessoa e cantamos, com um certo distanciamento que nos permite ausência de dor, que o mar se salga com lágrimas dos portugueses. Mas, agora, sou eu convocada a dizer adeus. Até breve. Sou eu quem fica, Penélope de uma modernidade ingrata, longe do poesia do mar que lágrimas porventura salgaram, perto da mágoa sofrida que a ausência de quem se ama impõe.
É a vida, tento convencer-me. Mas os afectos gritam ausência de sentidos numa vida que se faz de dor e, sofrendo embora, protejo-me da distância, da solidão, embrulhada nas memórias, nas certezas de cumplicidades a acontecer, segura na rapidez do tempo que se faz de idas mas, FELIZMENTE!, de regressos também!

quinta-feira, 25 de março de 2010

Viveres


Cada dia surge lavado de novo, se o traz a chuva. Mas é sempre novo, a estrear, quando, cedinho, abro os olhos e penso/sinto que estou viva.
Por vezes, apetece-me estar dentro da minha concha, ostra por descobrir, e ficar. Outras vezes, pelo contrário, apetece-me atirar-me à vida, agarrá-la energicamente pelas orelhas e obrigá-la a cumprir-se a meu gosto. Então, cheia de esperança, esgoto os segundos em coisas de ser, de sentir e de fazer.
Nestes dias, em que olho o tempo real, observo o mundo em redor de mim, é frequente esbarrar com a hipocrisia, com a falsidade, com as eternidades prometidas que se esgotam em velocidades alucinantes. Mas resisto, luto, e, muitas vezes, quando retorno à protecção da minha cama, rebobino com saudade todos os bons momentos.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Plenitude

Com força, num abraço que os tornava um só, mergulhando os dedos longos nos cabelos dela, garantia a eternidade, a plenitude de um amor adulto, cúmplice, verdadeiro e confiante. Ela aninhava-se nele, sentindo a protecção que só um Amor assim, inteiro, pode assegurar. Para trás deixara águas turvas, mares agitados, furacões de desespero com chuvas de muitas lágrimas. Agora, sentindo a pele dele na dela, deixando-se levar na consciente senda do desejo que tempera o amor real, sorria de novo, confiante, adivinhando o calor de um amor inteiro, íntegro e total, na sua existência. Brincando, falavam de memórias, de sonhos, tecendo, a dois, projectos de um futuro já presente. Sim, garantia ela, a vida pode mesmo fazer sentido!

Navegações e Leituras


Carregada de livros, a biblioteca, moderna e a enquadrar-se no cenário antigo, entra no rio Cam como a proa de um navio. Alta, elegante, corajosa, deixa-se afagar pelas águas calmas, contemplar pelos olhares turísticos, com indiferença e segurança. Feita turista também, desfrutando do puntting balanceado e carregado de histórias ditas pelo Martin, ela olha o edifício que a fascina. São os livros, claro!, mas são, também, as recordações das suas próprias leituras, tantas, as memórias tecidas por muitas páginas de diferentes sentidos, sempre, ou quase, carregados de sentires. Fecha os olhos aproveitando o balancear suave e desfia saudades.
Chega, então, a sua rotina, agora interrompida, o desgostar da leitura de muitos alunos e a mágoa, modernamente apelidada de frustração, de nem sempre ser capaz de os cativar para o ler. No seu país, em eterna crise, fala-se da violência nas escolas, anunciam-se agressões, ódios, desinteresses, apontam-se culpas. E ela, ali, sentindo os olhos a estupidamente inundarem-se, pensa como poderia ser diferente se, nas mesmas escolas, se falasse de alegria, de livros e leituras, de Pessoas e cresceres. Sim, acredita que poderia ser diferente SE. Um SE enorme, prenhe de possibilidades mas exigindo mudança...

sábado, 20 de março de 2010

Presenças ausentes

No Pub cheirava a lenha, a calor real, e a mesa de madeira, bancos de couro, recebeu-nos com conforto. Apetecia um vinho, fresco e com picos, três flûtes de champagne (não francês!) a assinalar a presença, à mesma mesa, de quatro gerações diferentes. De repente, a família a fazer sentido, a sentir-se no sangue aquecido a correr nas veias, nas memórias partilhadas que nos faziam sorrir e, também, humedecer o olhar. Tecem-se assim os tempos, quero crer, com instantâneos de sentidos, com cumplicidades reais, com experiências feitas de mil partilhas. A acompanhar-me, as saudades. De quem não está e que, não estando, sempre está comigo, sempre diz presente! Soube-me bem o chicken breast, estranhei o café, nunca a minha bica forte e saborosa, mas saí do Pub com vontade de fazer as pazes com a humanidade.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Cambridge - Again

Recebeu-me a chuva, o céu choroso, algum frio também. Depois, de repente, chegou o beijo quente e ternurento do meu neto, o abraço forte da minha filha.
A essência do ser, o carinho real, o amor inteiro disseram presente e a chuva deixou de me incomodar. Cambridge a cada regresso mais me encanta, e, parafraseando o piroso do Malato, tipicamente português, não resisto a lembrar que "Já fui muito feliz aqui!". IMENSAMENTE feliz!!!

segunda-feira, 15 de março de 2010

Os Maias

Há mais de 30 anos que, nas escolas portuguesas, se lêem (ou fingem ler) Os Maias. O programa de português, felizmente! , não o impõe, sequer o sugere. Refere, apenas
"um romance de Eça de Queirós" como leitura para o 11º ano. Mas, seja porque Os Maias já estão preparados por todos os professores, seja porque existem milhentos resumos e sebentas sobre a obra, seja porque os livros dos professores já estão bem assinalados, ou seja, apenas, por uma questão de hábito, Os Maias, nas escolas, parecem ser o único romance de Eça de Queirós...
Eu, que por acaso até prefiro a Cidade e as Serras, ou o Crime do Padre Amaro, todos os anos tento ensinar Os Maias sem deixar transparecer o meu enfado. É que estou farta da idiotice do Dâmaso, do gato Bonifácio feito Reverendo pançudo, do Carlos cheio de charme, do Ega refilão, da careca luzidia do velho Afonso, dos bigodes lânguidos do Alencar, dos cabelos negros da Cohen, dos serões da Monforte, das denguices da condessa de Gouvarinho e até da beleza da Maria Eduarda!! Hoje, no entanto, soube-me bem trabalhar Os Maias porque assisti, com os meus alunos, a uma representação da obra, centrada na caricatura das personagens, que me encheu de entusiasmo. No final, os actores contaram que, há DEZ ANOS!!!, aguardam pelo apoio prometido pelo Ministério da Cultura... e eu, por acaso???, dei comigo a, uma vez mais, me surpreender com a actualidade das críticas queirosianas, feitas a um Portugal onde os políticos são, na sua maioria, uns verdadeiros asnos!!

sexta-feira, 12 de março de 2010

Morte e Educação

Suicidou-se um miúdo, 12 anos. Suicidou-se um professor, desesperado. Enchem-se, por isso, parangonas de jornais, aberturas de telejornais, sessões no Parlamento, sob o tema da autoridade. Olho, e oiço, tudo com incredulidade.
Sou professora, conheço os miúdos, os professores, os problemas, sérios e graves, que invadem a escola. Mas, no entanto, não acredito que o problema seja, essenciamente, de falta de autoridade. À Escola Portuguesa falta muito mais do que isso! Falta o ESPAÇO PARA SE OLHAR A PESSOA QUE MORA EM CADA ALUNO, falta o ambiente de conforto onde se tecem afectos, falta o Tempo de qualidade onde se constroem aprendizagens, falta humanismo! Para além dos que se suicidam, em desespero extremo, há os moribundos diários, os que esgotam cada dia sem o viverem, os que cumprem programas, circulares, decretos, despachos, etc. sem sentirem a validade do que fazem! Na Escola Portuguesa, na Escola que integro, falta a certeza de que o processo de ensino e aprendizagem tem dois vectores: Ensinar e Aprender! Falta perceber que não basta servir conteúdos em tempos (excessivamente longos...) fechados numa sala,que é preciso edcar para a cidadania, promover competências, desenvolver sentidos estéticos.
Sim,claro que é importante haver autoridade. Mas não, ela não se atribui por decreto! As mortes, que fizeram incidir (até quando???) os holofotes sobre a realidade da Escola, deveriam servir, também, para provocar a mudança, para fomentar a diferença. A Escola de hoje, organizada tal como no século XIX, não responde às necessidades da sociedade do século XXI.
A morte é trágica, sempre dolorosa, terrível quando, como agora, atinge gente com um futuro para cumprir. Mas não é o pior... Para mim, por vezes, é pior a agonia lenta que leva ao desespero diário milhares de outros jovens e muitos professores...

domingo, 7 de março de 2010

RIR

Faz bem à alma e, garantem, ao espírito, rir. Rir é soltar angústias e cantar, de uma forma livre, a vida. Tenho-me rido, com gosto e verdade, nos últimos tempos. Riso cúmplice, libertador, de estar bem e ter vontade, imagine-se..., de fazer até troça da Vida.
Olho o mundo, desesperado (enlouquecido?) , surpreendo-me, angustio-me mas, como há muitos anos não me acontecia, redescubro a Fé, a esperança, e rio-me com gosto.
Hoje, é bom estar viva.

sábado, 6 de março de 2010

Alice no País das Maravilhas

"Pode dizer-me, por favor, qual o caminho que devo tomar?" - Perguntava Alice. "Isso depende do lugar para onde queres ir!" - Respondia o coelho branco, de colete verde vestido e relógio na mão, sempre cheio de pressa. Muitas vezes este diálogo ecoa em mim.
Será que sabemos (saberei eu?) sempre para onde quero ir? Não farei, por vezes, os percursos que me sugerem sem coragem para escolher?
E a Alice acompanhou-me, acompanha-me ainda, na vida feita de mil coisas e direcções.
Ontem, encontrei a Alice a três dimensões, num lugar cheio de pipocas e gente jovem. Foi uma Alice diferente e, no entanto, de novo me alertou para as dificuldades de realizar um sonho, para a força castradora da normalidade, para os perigos e monstros que se escondem nos caminhos que escolhemos. Esta noite, sonhei com a Alice e desejei, intensamente, ter uma espada oom o poder da que ela encontrou, para, ainda que com menos violência, ser capaz de arrancar a cabeça a todos os monstros que me amedrontam.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Museus e Educação

Seja porque a cada dia mais desacredito no Ministério da Educação, seja porque diariamente me confronto com o vazio pesado que enche as nossas Escolas, seja, apenas, porque acredito que educar é amar, despertar, ousar e provocar, não desisto de dinamizar actividades diferentes para os meus alunos. Desta vez, com o décimo ano que tão mal se porta (às vezes...) e tão pouco trabalha (quase sempre), o destino escolhido foram os Museus da Poesia e o Berardo.
Saímos cedo, ensonados, com frio e olhares ansiosos e curiosos. Afinal, corresse mal, ou corresse bem, seria, com certeza, um dia diferente!
A manhã esgotou-se em Poesia. FANTÁSTICO diseur, o actor Nuno Henriques, a variar de Augusto Gil a Gedeão, de Aleixo a Torga, de Sophia a Florbela, numa relação lógica, intensa, capaz de fazer os meus miúdos sentirem que, de facto, "Nas mais pequenas coisas, a Poesia acontece"! De tarde, o CCB, a modernidade, a Arte Contemporânea que, a meus olhos leigos, tem, frequentemente, mais de contemporânea do que de Arte... Mas a guia, a jovem Teresa, vestiu de sentido o nonsense aparente, desmontou obras, explicou olhares, ousou interpretações. Sim, aquilo era um abrigo para prostitutas. Sim, aquilo era um alerta para a posição da Mulher na sociedade! E os miúdos a crescerem, a aprenderem a ser Pessoas sendo, ontem, gente com essência.
A terminar, afinal a vida faz-se de tudo..., a paragem obrigatória no Fórum Almada e o regresso a casa.
Hoje, estou cansada. Mas, estranhamente??, estou feliz porque a minha actividade fez sentido. Ganhou validade.
Ah!Como eu queria uma Escola assim, com possíveis, com aprendizagens activas e dinâmicas, com partilhas e cumplicidades...