quarta-feira, 28 de outubro de 2015

MORTE

O Poeta disse "Quando eu nasci, ficou tudo como estava". Eu, que não sou Poeta, digo "Quando eu morrer, fica tudo como estava". E, às vezes, apetece-me assustadoramente a paz, o silêncio, o escuro, o adeus eterno da Morte. Sempre tive dificuldade em compreender o suicídio que via, porventura erradamente, como uma forma de desistência, ou mesmo uma violência sobre os outros. Hoje, já não penso assim. 
A Morte pode atrair-nos, pode seduzir-nos até. E esse é o maior risco... Nestes últimos tempos tenho-a sentido perto. 
E, curiosamente, não me assusta. Se devemos fazer o que queremos da vida, talvez possamos, também, fazê-lo com a Morte.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

ESCREVER

Li ontem, não sei já dizer ontem, que  cada pessoa que escreve fá-lo, em primeiro lugar, para si. Eu faço-o quase diariamente. Gosto do meu diário, da minha forma pessoal de estar com a pessoa que mora em mim e que, por vezes, anda tão ocupada em existir (e sobreviver) que se esquece que é inquilina na alma do outro eu-ela. 
Mas gosto, também, de escrever para ninguém, que é um pouco como escrever para toda a gente, deixando divagar, relativamente livres, pensares e sentires. Às vezes, imagino o meu leitor, aquele, ou aquela, que do outro lado me encontra e sorri, ou chora, comigo. Escrever ajuda, a mim pelo menos, a esvaziar um pouco o peso da vida. Ainda por cima, há sempre a hipótese de quem não gosta não ler! Ou seja, a gente despeja a alma sem correr o risco de incomodar ninguém! Que bem isto me faz!

domingo, 25 de outubro de 2015

PRACETA DE OS LUSÍADAS

Quando eu era jovem, miúda mesmo, passava muitas tardes fantásticas na Praceta de Os Lusíadas. Sentada no muro da casa da minha maior amiga, nas festas de garagem, nas motas do grupo de amigos, vivi os melhores momentos da minha juventude. Era a época dos grandes amores, o primeiro!, o tempo dos possíveis, os dias sem ontem nem amanhã. Corria de minha casa para a Praceta sempre que podia... Lá, vigiada apenas pela curiosidade de uma vizinha, descobri o verdadeiro significado da Amizade!
Agora, 40 anos depois, voltei à Praceta. Afinal, Os Lusíadas são uma obra que sempre se relê com gosto...

sábado, 17 de outubro de 2015

O arco-íris

Infelizmente para mim, não sou uma católica exemplar. Tenho dúvidas, erro, procuro corrigir o percurso e, volta que não volta, erro de novo. Não tenho a sorte de ter uma Fé inabalável e, às vezes, chego a interrogar Deus com alguma violência. No entanto, Jesus Cristo, o Homem, é meu confidente e eu acredito, mas acredito mesmo, que ele me compreende e guia...
Apesar da minha Fé cheia de falhas, Fátima é, para mim, um lugar intenso.
Hoje, indiferente ao mau tempo, fui assistir à missa das 12,30h na Capelinha das Aparições. Chovia muito, o vento era forte, os guarda-chuva viravam-se mas, ainda assim, muita gente tentava manter as velas acesas rezando sempre. Rezei também, naquela conversa boa que gosto de ter com Deus...
A dada altura, no momento da comunhão, o vento parou, a chuva deixou de cair e no céu apareceu um imenso arco-íris, perfeito e brilhante. Foi, com certeza, um fenómeno atmosférico, mas eu sinto, sei lá porquê, que foi mais alguma coisa para além de coincidência.
Cheguei a casa ainda era dia, chovendo sempre, e deixei-me ficar, num espaço novo agora, pensando na vida. Um dia, quero crer, haverá também um arco-íris para mim...

domingo, 11 de outubro de 2015

À Moda de António Vieira


Neste domingo de muita chuva, entre fazer doce de tomate e preparar aulas, saíu isto:

SERMÃO da Professora Aos Alunos

Vós sois o jardim da terra. E, tal como os jardins, floridos, dão cor e aroma aos espaços urbanos, tantas vezes cinzentos e carregados de cheiros desagradáveis, vocês, jovens, devem dar à humanidade cor, alegria e perfume. Mas, ou seja que vocês deixaram crescer excessivas ervas daninhas no vosso coração, ou que o mundo está de tal modo negro e empedrado que não tem terra fértil para que floris, a verdade é que vós não conseguis alegrar a existência.

Faltará perfume às flores do vosso jardim? Será que viveis mais preocupados em olhar as ervas daninhas, do que em contemplar a forma harmoniosa como as pétalas se abrem ao sol? Fernando Pessoa, esse grande Poeta português, disse “o melhor do mundo são as crianças”. Saberia, talvez, que essas são tenras ainda, puras, não tentadas a perder tempo com ervas daninhas. Talvez Pessoa devesse ter dito que vós, jovens, sois a mudança concretizada. Reparai que Camões, esse grande Poeta do Classicismo, afirmou que “Todo o mundo é composto de mudança” e, cremos nós, a mudança constrói-se convosco, com a seiva renovada que, enxertada das melhores qualidades, consegue colorir e perfumar a existência humana.

Olhemos, então, a rosa. É bela, carregada de simbologia, capaz de dizer amor, paixão, saudade e até esperança. A rosa vermelha, brilhante, faz sorrir o olhar mais infeliz. Também um sorriso sincero, jovem, alegra a existência dos que sofrem. Mas, cuidado, muitas vezes a rosa perde as pétalas, basta que o vento sopre com força desusada, e ficam só os espinhos, fortes e agressivos, fazendo sangrar e chorar. Os espinhos, esses, rasgam e não acarinham, ferem e não curam. Poderia haver, então, rosas sem espinhos? Reparem no que diz o povo: Seria um jardim sem flores!. Sim, da bela rosa fazem parte os espinhos, como da vossa juventude faz parte a tentação do mal. Mas a rosa, naturalmente, serve-se dos espinhos para se alimentar, para se proteger de  mãos abusadoras e vós, jovens, servis-vos da tentação para, muitas vezes, destruir o perfume e a beleza que vos define. A rosa agride, com os espinhos, aqueles que a colhem. Vocês agridem, e destroem, o vosso próprio eu quando, em vez de pensardes na cor e perfume da vossa condição, vos deixais agarrar pelos espinhos da vossa idade. A rosa tem vida curta. Também vocês, jovens, não a tendes longa. A juventude é um período passageiro, ligeiro como o voo da andorinha, que perde o perfume e deixa cair as pétalas antes de ter tempo de ser admirada.

Pensais que apenas a rosa embeleza o jardim? Não! Oh! Quantas cores, quantos aromas, quanto néctar delicioso encontramos num jardim. No meu jardim, do qual cuido diariamente, há uma cameleira. É uma árvore vestida de verde brilhante, viçosa, carregada de flores brancas e bem trabalhadas. Ao longe, quando chego ao jardim, a cameleira encanta-me. Quanta cor! Quanto viço! Quanta promessa de vida nos botões que a preenchem! Porém, como me ilude a imagem… As camélias têm o pé curto, não podem ornamentar a jarra da minha sala; as pétalas são tão frágeis que, mal lhes toco, caem no chão; os troncos da árvore, parecendo tão perfeitos, são fracos e sem resistência. Perguntais-me porque tenho tal árvore no meu jardim? Porque me enche o olhar, sem me tocar o coração. Porque me ilude na sua aparência de perfeição sendo, afinal, tão imperfeita. Sabeis que a camélia não tem odor? Ah! Quantos de vós sois apenas camélias neste jardim que é a humanidade. Como a camélia, quantos de vós viveis da imagem falseada, da aparência trabalhada para ocultar a essência desleixada! Mas a camélia, essa, não tem opção que não seja render-se à sua condição. Vós, jovens, tendes a possibilidade de inverter a condenação da flor e de, livremente, sobrepor a essência à aparência. Oiço-vos a protestar, o sermão vai longo e aborrece-vos já. Mas tende paciência, lembrai-vos das palavras desse poeta que também era cientista, António Gedeão, quando afirmava que “Cada vez que o homem sonha, o mundo pula e avança”. Não sois vós, também homens e mulheres em embrião? Então, ouvi-me um pouco mais e depois, se assim quiserdes, contrariai Fernando Pessoa que, em sofrimento, afirmava “Querendo, quero o infinito//fazendo nada é verdade”. Vós podeis ser a Verdade. A diferença. A mudança. Não, não olheis para quem vos antecedeu, não olheis para os jardins que desprezais. Não. Olhai sim, e vede, o mundo onde cresceis e os desafios que vos são colocados. Sim, tendes razão, também a rosa precisa regada, também os jardins precisam limpos das ervas daninhas que dão abrigo à destruição e à doença. Mas esse tratamento tende-lo vós, diariamente, na escola, na palavra dos professores, nos autores que ledes, nas aprendizagens que fazeis. Estudais filosofia? É a água fresca que permite que cresça robusto o vosso caule de ser; estudais português? É o fertilizante eficaz para que as vossas folhas e pétalas cresçam viçosas; estudais história? É o ancinho do jardineiro cuidadoso que permite que compreendeis o canteiro onde cresceis; estudais geografia? É o sacho cuidadoso a preparar espaço para que cresçais. Não estudais nada? É a doença da ignorância, a praga da estupidez, a dominar o vosso crescer, a viciar a vossa existência. Julgais, talvez, que a escola de nada serve, que as aulas são a seca que mata a exuberância livre. Como estais enganados! O que aconteceria à beleza da rosa, sem o amor do jardineiro? O que aconteceria ao jardim, sem a atenção terna do que o cuidam? Cuidais, talvez, que vos basta a natureza da vossa condição jovem. Bastará ao jardim o selvagem crescer? Bastará à rosa o natural desenvolvimento? Não! Ao homem cabe enriquecer o belo, desenvolver o Bem. Sim, oiço-vos dizer. Não, ouvi-me gritar. Porque a rosa torna-se mais viçosa, o lírio mais brilhante, a orquídea mais perfeita quando o jardim é cuidado, limpo, enriquecido e regado. Vós sois o jardim da terra. E como esta Terra, cada vez mais feita de alcatrão e cimento, precisa de jardins! Termino agradecendo a António Vieira a grande lição e a vós, alunos jovens, deixo uma missão: - Perfumai de sentido a existência, sede corajosos para que, com o vosso florir renovado, sejais capazes de exterminar as ervas daninhas que, agora, livremente ocupam jardim e florestas… Lembrai-vos que o Tempo, esse jardineiro atento, todos os dias colhe e todos os dias semeia. Fazei parte da sementeira, não querereis ser o lixo que ele sempre recolhe.

Maria Luísa Moreira

Outubro 2015

sábado, 10 de outubro de 2015

Mudam-se os Tempos, mudam-se as Vontades



No século XVI, Camões, num dos muitos fabulosos sonetos que escreveu, garantia que "todo o mundo é composto de mudança". Tenho sentido essa mudança, ao longo da vida, numa vivência de 1ª pessoa nem sempre suave. Já perdi muita coisa, já ganhei muitas outras, mas, sem dúvida, de monotonia não me posso queixar. Hoje, a minha paisagem mudou. Acordei num espaço urbano, com o Outono arrumado em árvores geometricamente colocadas, com o vermelho das folhas gritando no sangue revoltado. Com chuva intensa, fiquei vendo os carreirinhos nas janelas novas e, quero crer, na alma iniciei uma nova arquitectura paisagística.
Para perfumar a coisa, fiz doce de dióspiro. Ficou óptimo, o doce. Eu, nem tanto.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

NÃO QUERO TER RAZÃO

As surpresas, ou aberrações, não param de acontecer na minha vida. A todos os níveis... Hoje, foi no que à Educação diz respeito. Eu ainda não consigo, sequer, encontrar um adjectivo que consiga ilustrar o que sinto. 
O programa de português do ensino secundário foi alterado, as metas curriculares para este ciclo homologadas e, assim, o 10º ano iniciou, este ano, o novo programa. Os professores, alguns, fizeram formação, as planificações foram elaboradas e as aulas iniciaram-se. Ora, foi então que "reparei" que o ensino profissional continuava a trabalhar de acordo com o programa antigo. Fui informar-me, ciente de que haveria uma confusão... ,Perguntei ao Ministério da Educação que me disse, espante-se!, que nada tem a ver com o Ensino Profissional, devendo dirigir-me à ANQUEP. Assim fiz. Hoje, recebi a resposta: - Não há alteração no programa o ensino profissonal. 
Pode parecer indiferente, afinal o importante MESMO é que os alunos saibam ler, falar, interpretar e relacionar..., mas acontece que o ME diz aos alunos do profissional que podem, se quiserem, fazer exame de 12º ano e ingressar no Ensino Superior. Ou seja, se os alunos quiserem mesmo fazer exame, daqui a três anos, devem preparar os conteúdos sozinhos (pagando uma explicação). Parece-me, (como desejo estar enganada), que o Ministério da Educação está a enganar os alunos do Curso Profissional lesando, claramente, os seus interesses. 
Era tão bom que hoje eu não tivesse razão...

terça-feira, 6 de outubro de 2015

ELEIÇÕES

Obviamente, acompanhei com atenção, e preocupação, as eleições. O resultado não foi o que eu desejava, mas, afinal, também não foi tão mau como temia... Agora, lendo e ouvindo os comentários dos entendidos, pasmo de surpresa indignada. Para mim, não há dúvida que a coligação obteve a maioria das preferências dos portugueses. A esquerda afirma que não, que venceu. Como? Havia, e eu não dei por isso, algum partido a sufrágio chamado esquerda? O que eu vi foi uma série de partidos, com propostas diferentes, que recolheram votos dispersos. Agora são só uma força? Se assim é, que diferença faz votar PS, ou BE, ou PC?? Não percebo. Não percebo e indigna-me ouvir afirmar que a Esquerda, a tal que não sei o que é, à qual não reconheço filosofia de base, deve governar. Estes romanos são doidos, dizia o Astérix. E a mim apetece-me dizer que os portugueses, como bons herdeiros dos romanos, seguiram-lhes s passos e mantiveram as características.

domingo, 4 de outubro de 2015

O CASAMENTO

A Joana nasceu em Janeiro. Era um bebé moreno, com muito cabelo e olhar curioso. Depois, a Joana foi crescendo. Lembro a idade em que perguntava tudo, a adolescência e a afirmação, a entrada na Universidade, a Joana Mulher.
Ontem, numa festa linda, a Joana casou. Acho sempre que casar vale a pena, lamento a modernidade das uniões de facto, ou dos companheiros mais ou menos de facto. Ontem, a Joana estava feliz, sentia-se a felicidade emocionada na maquilhagem cuidada, no olhar, nas palavras às vezes tremidas e, acho eu, até na renda do vestido longo. A Joana e o Duarte encheram de sentido o dia de muita gente e, do fundo do coração, eu desejo que a vida os deixe ser felizes. Sobretudo, que saibam perdoar e compreender. Deitei-me tarde, muito tarde para os meus horários habituais, mas acordei com fé renovada na vida.