domingo, 12 de outubro de 2014

CONVERSA PROIBIDA

Buarcos
Olhava-o zangada. Eram só os dois: Ela, envolta no casaco encerado gasto, com o chapéu até aos olhos, e ele imenso, excessivo. O silêncio era total, feito do marulhar do dia de Outono-Inverno. E ela atirava-lhe as palavras que caíam na água revolta. Estava zangada sim! Zangada com aquela imensidão, aquela força ruidosa, aquela presença sempre constante que a atraía inexplicavelmente. As lágrimas misturavam-se com a chuva, com o sal trocista que o mar cuspia com força. Ela falava tremendo. Dizia dos impossíveis, da solidão, dos adiamentos, da dor da ausência que, por absurdo, desejava até. Ele rugia. Feroz e denso, poderoso e mágico. Ele tinha nele o Gama e o Adamastor, tinha a coragem e a ternura. Ela tinha os destroços, o quotidiano imposto. Era uma luta desigual, mas ela insistia. Sentia o corpo gelar, os cabelos emaranharem-se, mas não desistia: Queria dizer-lhe que, no jogo inconsciente de muito querer amar, ele, mar, estava escandalosamente presente. Queria dizer-lhe o indizível, as palavras cheias que os homens não compreendem, as desilusões que todos garantiam serem rotinas. O frio abraçava-a, violento e negro, mas ela recusava fechar-se no conforto do seu automóvel. Às vezes, achava, é preciso sentir a energia da Natureza para poder aceitar a estupidez de alguns homens!

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