segunda-feira, 27 de junho de 2011

Anteu (sem Mito)

Pôs os pés na sua terra, na cidade de muralhas gastas, no empedrado que intercalava preto, branco, e buracos, e sentiu-se viva. Conhecia as conversas silenciosas da Quina das Beatas, descodificava os olhares longos dos velhos, eternamente encostados às paredes, e ria com gosto dos visitantes que esmurravam as modernas pinturas metálicas nas esquinas da sua cidade.
Devia ser a prova que Anteu, o Mito, era mais do que isso. Ou era isso mesmo, o Mito, o tal "que é o nada que é tudo", como o outro, o que "foi por não ser existindo". Mito.
Sentia-se revigorada, como que redescobrindo o equilibrio perdido nas curvas de uma existência que, muitas vezes, o não é de facto, ao pisar a terra a que chamava sua.
Se não tivesse terra, se fosse gente sem chão, se o telurismo não a fizesse pessoa, como poderia (sobre)viver?

1 comentário:

  1. Tal como Anteu todos precisamos da terra, do chão, para viver e sobreviver. A terra dá a vida, a terra cria, a terra guarda.

    Talvez por ser o mais telúrico de todos, Torga é o nosso poeta/escritor mais completo, o mais rico, o mais avassalador.

    Que não surjam Hércules na nossa vida, a matarem-nos ao quererem tirar-nos do nosso chão.

    Cumprimentos.

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