domingo, 20 de maio de 2012

Crescer Dói

Chegou com as bochechas vermelhas, os olhos brilhantes, o cheiro terrível e irresistível a raposinho que carateriza os sete anos e a escola primária. Correu para a mãe, pediu colo, e contou: - "Eu não tive a culpa! Juro, Mãe! eu estava só a apanhar uma joaninha, sabes, daquelas que tu às vezes pões na mão?, mas ela não subia para o meu dedo e, de repente, voou. Eu apanhei um susto, porque não estava à espera, eu não tenho medo das joaninhas, mas os livros cairam e a professora zangou-se. Disse que eu tenho de escrever cem vezes que não se pode brincar com joaninhas na aula. Mas eu não tive culpa, Mãe. Eu posso até jurar-te!" Abraçou-o com força, cheirava mesmo a raposinho!, e secou as lágrimas. A hora era de ternura e a magia da joaninha a subir pelos dedos, a velha cantiga voa voa joaninha que o teu pai está em Lisboa a comer pão com cebola, ela mesma lha ensinara. Para acalmar a tristeza, propôs um gelado depois do banho e uma história longa ao deitar. Mas ele insistia: - E agora Mãe? Vou mesmo ter de escrever cem vezes aquilo da joaninha? Oh Mãe, diz que não..." E ela a sentir que tinha de dizer que sim, que ele teria de escrever cem vezes a frase idiota, mas que podia sempre continuar a brincar com as joaninhas, que podia sempre cantar a lengalenga, que devia sempre ter tempo para reparar nas joaninhas, e nas borboletas, e nas lagartixas que mudavam o rabo, e na ternura do cão que, vendo-o chorar, fora buscar a bola para o distrair. Mas sim, teria de escrever as cem frases estúpidas porque, na vida real, é a estupidez que comanda e é preciso aprender a obedecer à idiotice vigente.
Com imensa raiva abraçou o seu menino.
Crescer dói! Mas ver crescer, dilacera por vezes...

2 comentários:

  1. E, quantas vezes, não era no quadro de ardósia da aula, virado de costas para o resto da aula, que tinha que se escrever, em letra miúda, até o negrume da pedra estar todo escrevinhado: "Não devo falar com o colega de trás, enquanto o Professora está a dar a aula".

    Agora deve ser mais fácil, com estes quadros electrónicos, onde já não se escreve, mas se tecla... é só fazer um "copipaste" o número de vezes que a Professora pede, e já está! E ainda por cima, sentado!

    Claro que estou a brincar e a concordar consigo: de quanta estupidez e de quanta obediência cega não é feita a vida real?

    Cumprimentos.

    ResponderEliminar
  2. reter memórias e recordar..

    ResponderEliminar