terça-feira, 26 de janeiro de 2021

CUCO

 O meu cuco veio da Alemanha. Veio embrulhado por partes, com mil cuidados, e, durante muito tempo, assim permaneceu. Não encontrava um lugar certo, perfeito, para ele. Acontece-me isto muitas vezes, pensar que as coisas fazem sentido no lugar onde pertencem, achando-as deslocadas quando tento realojá-las. Com o cuco, foi assim.

Depois, numa das muitas voltas da minha vida, surgiu uma parede que pedia algo. O cuco, pensei! E lá o coloquei, pêndulo e acessórios, na parede da sala. 

O cuco, talvez zangado por tanto tempo de abandono, não funcionava, e foi o querido Senhor Elói, tantas saudades, que com muito engenho e paciência lhe devolveu a vida. E o  cuco foi-se impondo. Indiferente a alguns protestos, oh mãe o cuco faz imenso barulho de noite, oh avó faz lá o cuco sair, ele foi cumprindo o seu papel. Certinho, fazendo jus às origens alemãs, vinha cá fora anunciar as horas, as meias-horas também.

Eu habituei-me à companhia do cuco. Afinal, já me habituei a coisas bem piores.

Ora, há uns dias, o meu cuco resolveu atrasar o tempo, arrastar as horas, encompridar os minutos. Começa certinho e, aos poucos, vai preguiçando, preguiçando, de tal modo que, ao fim da noite, já ganhou meia hora ao dia! Como, infelizmente, já não posso pedir ajuda ao Senhor Elói, tenho andado a pensar como resolver este atraso do meu cuco. 
Hoje, acordei com uma ideia: - Não vou acertar o cuco, vou aderir a este arrastamento voluntário do tempo, a ver se ganho mais paz e tranquilidade na minha existência de não cuca!

1 comentário:

  1. Aqui vai a história do nosso relógio de cuco:

    https://noareeiroeporai.blogs.sapo.pt/tag/rel%C3%B3gio+de+cuco

    ResponderEliminar