domingo, 11 de agosto de 2013

ESTÓRIAS HERDADAS - 4

A MISSA
Entrada da Igreja do Reguengo
O meu Pai sempre teve alguma dificuldade em cumprir horários. Quando eu era miúda, achava mesmo que ele nunca aprendera a ver as horas porque, para além de nunca respeitar as horas, se tivesse de ir buscar-me às duas e aparecesse ao quarto para as três, dizia que eram duas e pouco... Ora, com a idade, este desrespeito pelas horas acentuou-se e, para ele, a hora certa acontecia sempre por volta de: - Almoçamos por volta da uma; saímos por volta das quatro; etc. Em família habituámos-nos a esta forma de olhar o relógio e já nem estranhávamos. Um dia, dia de Natal, o meu Pai resolveu que iríamos todos (o que significava filhos, cunhados e netos), à missa das dez. Ainda se ouviram alguns protestos, a hora não era convidativa a grandes demonstrações de Fé, mas não houve forma de o demover e ficou, na véspera, marcada a ida familiar à missa. Na manhã seguinte, depois da habitual agitação de muita gente e crianças em casa, com um pequeno-almoço tomado entre gargalhadas e despacha-te, lá nos juntámos para ir à missa. À saída de casa, a minha mãe, olhando o relógio, sugeriu que mudássemos os planos porque era tardíssimo. Nada disso, argumentou o meu Pai, vamos muito a tempo porque, nestas datas, as cerimónias são demoradas. E lá seguimos, quatro automóveis em fila, a caminho da igreja do Reguengo (da minha particular devoção).
Azulejo no exterior da Igreja do Reguengo
Chegados à igreja, impondo ruidosamente silêncio, entramos. Estava toda a comunidade sentada, em silêncio. Algumas pessoas começaram a ajeitar-se nos bancos, para que houvesse espaço para nós todos, e com alguma (muita) agitação, sentámos-nos caladinhos. Então, o senhor padre levantou-se, e disse: -" Ide em paz, e o Senhor vos acompanhe!"
Igreja do Reguengo
A nossa vergonha transformou-se, à porta da Igreja, em protesto vivo junto do meu Pai,  com os miúdos a perguntarem se a missa era sempre só assim. Ele, calmamente, respondeu-nos: - Chegámos muito a tempo! Fomos abençoados que é o que precisamos.


5 comentários:

  1. E, à volta, tinha razão... O principal é ser-se abençoado... e ele sempre foi abençoado! O seu abençoado Pai!

    ResponderEliminar
  2. Luisa, imagino quantas complicações não terá isso dado, mais a mais quando a sua mãe tinha grande parte do seu dia regulado pelo toque de uma campaínha! Mas olhe que "chegar antes de ter de ter partido" como costumo dizer e como acontecia cá em casa (os filhos que o digam) também não é menos "stressante"

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Dalma,
      Acredito! O cumprimento rigoroso de horários também é esgotante!

      Luísa

      Eliminar
  3. Que delícia de Pai...
    Sempre adorei chegar atrasada à missa, quando era mais nova, e me obrigavam a ir. Era o santo sacrifício da saída.
    Agora, quando vou, já procuro chegar a horas...
    Adorei esta passagem da família!

    ResponderEliminar