terça-feira, 20 de abril de 2010

A Fada Sininho

E pronto, foi cancelado o meu voo de amanhã. Tenho já uma longa lista de check ins e de cancelamentos, e continuo em Cambridge, longe da minha rotina, dos meus afazeres, vivendo por inteiro o meu estatuto de avó! Angustia-me, já me preocupa muito!, esta ausência forçada e, para me consolar, a minha filha cita provérbios ingleses there's no use crying over spilt milk... Eu, que não sou grande admiradora da sintética língua inglesa - ah! o francês é a minha língua!!! - prefiro entreter a minha preocupação, desviá-la do vulcão e das cinzas, ocupando-a com ficções de ser feliz. Imagino, por isso, que no silêncio do serão, com o Manel Bernardo dormindo calmamente, vêm as minhas personagens de eleição falar-me de possíveis.
Sinto, levemente, na janela larga, as asas da Sininho que, carregando o eterno saco de ouro, se propõe levar-me, voando sem medo de cinzas, até aos mares do Sul. Alego que não sou já menina, que não tenho mais acesso ao mundo de Peter Pan, e ela, esvoaçando sempre, ri-se como quem bebe champanhe francês alegando que, no mundo dos sonhos, a idade não existe. Rio-me com ela e deixo-a cobrir-me com o pó amarelo saindo, depois, sem frio nenhum, só mesmo de camisa de noite, pelos céus escuros desta Inglaterra que me prende.
Num instante, aparece um céu estrelado, cheiros intensos, ondas largas. Procuro o navio onde, estou certa, vou ser acolhida num abraço quente e forte e, guiada pela Sininho, num instante descubro a ponte certa.
Pouso ao de leve no amor.
Agora, há espuma terna e beijo de saudade intensa. Está quente. Muito mais quente que na Inglaterra encerrada, e fico contente por ter vindo apenas de camisa de noite. Então, espreito as máquinas, os computadores, a noite cerrada e calada lá fora. Aqui, não há lugar para as palavras e o carinho faz-se de toques ousados, de beijos intensos, de mistérios partilhados. Sininho continua rindo, esvoaçando sempre, rasando os mares e quase mergulhando neles. Descalça, desço para o camarote e não preciso de champanhe.
É o Manel Bernardo quem me traz de volta à vida. Lá fora, faz frio e vento. Serão agora dispersas as nuvens vulcânicas??

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