quinta-feira, 1 de abril de 2010

O Lar

É uma casa de piso térreo, no meio do campo, voltada para a cidade,rodeada por um jardim cuidado. As grandes janelas deixam entrar o sol e, não fosse o portão agressivo, poderia até parecer uma Quinta particular. É a Casa de Repouso da Serra da Penha, na minha cidade! Hoje, fui até lá.
Entrei, com o coração encolhido, e encontrei muitas pessoas, senhoras e senhores, idosos, tomando um chá ou, simplesmente, sentados de olhar vazio. Havia muitas cadeiras de rodas, alguns arrastar de pés, vozes tremidas. No entanto, foi o olhar colectivo de abandono e tristeza que me impressionou. Nos Lares, eufemisticamente chamados Casas de Repouso, os idosos esperam apenas a Morte. Estão tristes, infelizes, têm saudades de outras vidas e quase me fazem sentir culpada por poder meter-me no meu automóvel e vir para a minha casa.
Tal como os infantários, para mim os Lares de Idosos (detesto a treta da Terceira Idade), são males necessários. Eu compreendo que é difícil, impossível por vezes, que as famílias mantenham os mais velhos em suas casas. Sei que a vida moderna é exigente, que levamos o tempo a correr, que temos mil ocupações. Compreendo, também, que as mães têm de trabalhar e, por isso, muitas vezes angustiadas, têm de deixar os filhos nos infantários logo aos quatro meses. Eu compreendo isso tudo e não condeno aqueles que se vêem forçados a colocar os seus idosos nos Lares. Eu só não compreendo, por mais que tente, por que razão a sociedade actual se organiza desvalorizando os afectos, as cumplicidades, os valores que, para mim, definem a verdadeira humanidade. Só não compreendo como se organiza uma sociedade que não tem lugar para os velhos. Só não compreendo que mundo maluco é este que tira de casa, isola, aqueles que mais precisam do seu espaço, das suas raízes, da sua família. Alega-se, disseram-me lá, que ali as pessoas estão bem, fazem novos amigos... Não queria acreditar! Alguém faz novos amigos depois dos 80 anos??? "Estar bem" significa ver satisfeitas as necessidades básicas. Mas, e os afectos? As emoções?
É Páscoa. Tempo de fé, de amor, de reflexão também. Será Páscoa para aqueles velhotes que esperam, como me disseram, a eventualidade de, pelo menos no Domingo de Páscoa!!, verem a família??
Hoje, sinto-me péssima por integrar uma sociedade assim. Muitas vezes digo, e escrevo, que temos de mudar de políticas, de modelos sociais. Hoje, sinto que temos de mudar de vida ou, quando dermos por isso, nem humanos seremos!

2 comentários:

  1. Sabe quantos namoros acontecem entre pessoas que vivem em lares de idosos? Sabe que os afectos, os sentimentos, o despertar de emoções podem surgir em qualquer idade? São muitos os idosos que conseguem encontrar a felicidade perdida junto das famílias que não lhes ligam nada.

    Muitas vezes, o problema dos lares apinhados de gente é provocado pelas próprias famílias que não querem os "velhote" em casa. Seja porque trabalham, seja porque as casas são pequenas.
    Mas muitas vezes, também, é por falta de suficiente amor, por ausência dos tais afectos, por nunca ter havido laços verdadeiros de família.
    Fui educado no sentido de manter, sempre, os laços de família. Os meus filhos foram educados nesse sentido e praticam-no.
    Infelizmente a desumanização é, cada vez mais, uma constante.
    Chame-lhe espírito da Páscoa, espírito de Natal, ou espírito de Qualquer Coisa; o importante é mesmo a prática diária das acções que, como humanos, deveríamos sempre praticar.

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  2. Tens razão: os "lares", além de um vergonhoso grande negócio, são um dos maiores crimes do o "progresso" e da sociedade actual!

    É HORRÍVEL!

    Manuel Poppe

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